"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

domingo, 16 de outubro de 2011

Multiculturalismo

A discussão sobre o denominado multiculturalismo abrange um amplo leque de temas candentes da atualidade. Todos importantes e de conteúdos variados. Político, institucional, cultural e ideológico. Portanto, não deve ser subestimado como algo superficial, diletante ou simplesmente uma supérflua tese de alguns acadêmicos. O multiculturalismo, como fato histórico, existe desde sempre. De certa forma, ele é a própria história. O que está em debate não é especificamente o pluralismo cultural ou a noção de diversidade. Estas, não são falsas nem contestáveis O mundo natural, o físico e o cultural são caracterizados pela diversidade, e esta significa, seja em que sentido se apresente, um avanço da humanidade em relação à uniformidade das coisas. O fenômeno acontece com pessoas de espaços culturais diversos que são muitas vezes obrigadas a relacionar-se e a conviver entre si. Na época de Roma, devido às invasões e ao desejo de viver sob a Pax Romana, e na atualidade devido à imigração, era como é possível numa região a existência de diversos núcleos culturais e ainda grupos sociais que por diversas razões se sentem marginalizados. Perante a existência de diferentes culturas, as pessoas podem assumir atitudes como o etnocentrismo, o relativismo cultural e o interculturalismo. Roma, numa visão diferenciada para a época, procurou, aos moldes do Império persa de Dario e Xerxes, adotar uma política de tolerância com os costumes alheios. Mas, vejam bem: tolerância e conciliação não são a mesma coisa. Quando se concilia, quer-se que várias características, muitas delas díspares, convivam umas com as outras. Isso é muito perigoso, e com o tempo passa a indicar fraqueza dos dominadores. O Brasil, apesar de sua formação multigenética, pratica o preconceito, ainda que velado, contra o negro, o pobre, o nordestino, numa postura etnocêntrica, que deriva para posturas negativas como a xenofobia, o racismo e o chauvinismo. Devemos combater esta postura. Devemos gritar contra teorias como de Gobineau, contra posturas como de Euclides da Cunha e de tantos outros teóricos derrotados pela realidade brasileira. Assim, podemos afirmar que o multiculturalsimo avança na medida em que recuam o ímpeto, a coragem e a necessidade imperiosa de enfrentarmos os nossos graves e seculares problemas econômicos, de soberania e a criminosa exclusão social. Devemos buscar o caminho brasileiro de desenvolvimento, através das nossas vocações e particularidades, inclusive naturais. Sabermos utilizar como alavanca de auto-estima e mobilização, uma das culturas mais ricas e diversificadas do planeta. Não impedir, através da imitação barata de outras formações antropológicas, que o potencial de um povo extraordinário, o povo brasileiro, se desenvolva com plena capacidade e inventividade criadora. O problema do brasileiro é que parte de suas elites é aculturada, colonizada e incapaz de pensar um projeto singular, real e factível – harmonioso com as peculiaridades e riquezas do país. O povo, o povo mesmo, é uno em sua diversidade, inclusive individual. Não há que fragmentá-lo, fracioná-lo em grupos e subgrupos, como uma esquizofrenia imposta à força, para melhor dominá-lo de dentro e fora, imobilizá-lo. Devemos receber de braços abertos as boas coisas que a humanidade produz, criticamente, incorporando-as ao nosso patrimônio em geral. Para isto estamos abertos e sempre estivemos. Somos meios antropofágicos, inteligentemente antropofágicos. Sabemos assim, as mazelas de que o brasileiro padece. Cabe a quem desejar, ou estiver disposto, incorporar-se à aventura árida, sofrida, às vezes sangrenta tarefa da libertação das potencialidades da população brasileira. Uma ampla arquitetura da construção de um país generoso, sem vocação imperial. Do trabalhador anônimo, da balconista sorridente, do operário inventivo, do empresário desenvolvimentista, da juventude impulsionada em sua vitalidade e movimento, da intelectualidade acreditando, do agricultor fazendo plantações de dar gosto. De uma cultura incentivada a ser feita nas suas permanências e renovações. É nesta pluralidade e na diversidade dos brasileiros que se pode construir o presente e perseguir o sonho da utopia do futuro possível.

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