"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013


O sepultamento da ativista Angélica Bello foi discreto, como ela gostaria. E teria sido mais discreto se no mesmo dia o presidente Santos não o houvesse citado em um ato público: “Angélica, pressionada por sua dor ou por ameaças, não sei por que, não suportou mais. Todo parece indicar que tirou sua vida”.
A defensora de direitos humanos de 45 anos morreu em Codazzi (Cesar) em 16 de fevereiro, às 11:45 da noite.
Naquele sábado, estava em um bar com uma de suas três filhas e um guarda-costas. Conforme uma atendente, ela deixou o local aparentemente abatida por uma discussão com a filha; esta e o guarda-costas a seguiram. Já em casa, a mulher disparou um tiro em sua própria boca, usando a arma de um outro guarda-costas que estava de folga.
Mas a tragédia de Angélica Bello começou muito antes. Em 1996 ela teve que fugir de Saravena (Arauca) com suas três filhas e um filho, em função de ameaças por ser filiada à União Patriótica. Como desabrigada, chegou a Casanare, onde duas de suas filhas foram recrutadas por um grupo das Autodefesas liderado por "Martin Llanos". Bello contava que implorou ajoelhada ao temido chefe paramilitar que lhe devolvesse suas meninas.
Dois dias depois, os "paras" entregaram as jovens mas deram uma hora de prazo para que a família abandonasse o povoado. Fugiu, então, para Villavicencio, onde chegaram sem nada. Seu desespero era tão grande que, como confessou à revista Semana, pensou em acabar com sua vida e a de seus filhos. Finalmente, com o apoio de um padre, se recuperou.
Pouco tempo depois retomou sua vocação política e se converteu em líder das "desplazadas" (mulheres deslocadas de seus locais de origem por conflitos). Em 2003 sofreu um atentado, mas isso não a impediu de, em 2006, criar a Fundação Nacional dos Direitos Humanos da Mulher, para atender vítimas de violência sexual.
As ameaças se intensificaram até 29 de novembro de 2009. Nesse dia, ao sair do Ministério do Interior, em Bogotá, onde foi pedir uma reavaliação do nível de risco que enfrentava, dois homens a sequestraram. "Abusaram sexualmente de mim. Disseram que não iam me matar para não me transformar em mártir. ... Um deles estava tão confiante que se pôs em minha frente e disse: 'olhe esta cara, por que vais te lembrar dela por toda tua vida'".
Suas filhas ficaram sabendo desse episódio pelo jornal El Tiempo, onde ela contou sua história pela primeira vez. Dias depois da publicação, a mais velha contou a ela que os paramilitares a haviam violado.
Mas sua força de vontade era muito grande. Certamente o presidente Santos percebeu isso e, em janeiro, convidou-a para compartilhar a mesa em um comitê criado pelo governo para atender vítimas do conflito.
A última ameaça chegou poucos dias antes de sua morte. Devia abandonar Codazzi antes da sexta-feira passada. Segundo Paula Gaviria, diretora da Unidade de Vítimas, nos próximos dias ela ia ser reinstalada e as medidas de sua segurança seriam reestudadas.
O esforço das autoridades terá que focar-se agora na explicação dos fatos nos quais morreu uma das primeiras mulheres que deram um rosto ao drama do abuso sexual em meio à guerra.
Na sexta-feira, a Corte Constitucional pediu ao governo maiores informações sobre a morte de Angélica Bello e instou a implementação de medidas de segurança para sua família, inclusive nova instalação urgente pela Unidade Nacional de Proteção.
Álex Villalobos, companheiro de Luisa Fernanda, a filha mas velha de Angélica Bello, diz que a perseguição da qual ela foi vítima durante toda sua vida (ameaças e atentados) sempre buscou detê-la e frear sua luta. Por isso “decidimos que a Fundação deve continuar. Por ela, porque sabemos o que significou em sua vida”, afirma. A Fundação Defensora dos Direitos Humanos da Mulher (Fundhefem) nasceu em março de 2006. É uma ONG que se propõe a liderar e promover os direitos das mulheres que, como sua fundadora, foram vítimas de todo tipo de abusos em meio ao conflito armado no país. E conseguiu. Seu trabalho será continuado por suas filhas.

Nestes dias em que os políticos do Partido dos Trabalhadores passaram a lamber uns aos outros,em comemoração pelos dez anos no poder, é o caso de perguntar: além da farra com dinheiro público, além do fim da corrupção como crime para se converter em ato de esperteza, o que mais eles estão festejando?
Nesses dez anos eles conseguiram praticamente quebrar a Petrobrás, que era uma das empresas mais sólidas do mundo; reduzir o desenvolvimento do País a níveis inferiores aos do Paraguai e da Bolívia; fazer crescer a inflação, que fora zerada por Fernando Henrique Cardoso; e aumentar a carga tributária a praticamente 40% do produto interno bruto (PIB).
Em nenhum outro país do mundo a venda de remédios sofre carga de impostos tão alta como no nosso. Os bens duráveis de consumo, afetados pela mesma carga tributária, custam muito mais do que nos outros países. E os preços são tão absurdos que os brasileiros ficaram viciados em viagens ao exterior apenas para comprar.
Bilhões de dólares de brasileiros engordam a economia americana todos os anos porque os produtos lá vendidos custam muito menos do que aqui, no Brasil. Isso ocorre exatamente no momento em que os petistas aparecem rindo nas fotos. Rindo de quê? Com certeza eles estão rindo de nós e da farra que fizeram nesses dez anos.
Quando Tancredo Neves, com sua habilidade e seu maneirismo, conseguiu eleger-se presidente, arrebatar a Bandeira brasileira das mãos dos militares e devolvê-la a todos nós, ficou a impressão de que o País teria mais sorte e melhor rumo.Mas com o seu trágico falecimento e a posse do biônico José Sarney na Presidência da República, ficou desmentida a ideia enganosa de que Deus é brasileiro. É nada, deve ser suíço.
O lado pior e mais trágico que surgiu nos últimos dez anos foi deixar transparente que é possível cometer na vida pública os mais graves crimes e nada acontecerá. Corrupção, peculato, formação de quadrilha e outros hediondos crimes contra a administração pública foram praticados em grande escala e até agora não se viu um único infrator sendo levado para detrás das grades.
Algumas semanas atrás o mundo teve conhecimento do exemplo invejável da Justiça inglesa, que condenou e determinou a imediata prisão de um figurão da política que cometera infração de trânsito, mas para não ter a imagem afetada publicamente fez sua mulher assumir a responsabilidade pela transgressão. Isso foi descoberto somente dez anos depois, mas, mesmo assim, a Justiça inglesa não perdoou e ele foi direitinho para atrás das grades.
Qualquer pessoa que tenha sentimento de justiça logo perceberá como nós estamos a milhares de anos-luz dessa exemplar conduta.
A ausência de punição tem sido característica marcante em nosso país. Nos últimos tempos, porém, a impunidade assumiu feição muito mais grave, porque os delitos praticados por altos figurões da República continuam à espera de execução da pena. Realmente, ainda que tenham sido condenados pelo Supremo Tribunal Federal, a condenação permanece destituída de eficácia e isso propaga a ideia de que poderosos nunca vão para a cadeia.
Dá para imaginar o que a Justiça inglesa teria feito com José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e outros aos quais o linguajar policial atribui terem a "mão cabeluda"? Por incrível que pareça, eles talvez apareçam perante boa parte da população brasileira como pessoas dotadas de invejável esperteza, porque, afinal, a despeito da "mão cabeluda", continuam por aí, sempre aparecendo e rindo nas fotos. Julgados e condenados, são verdadeiros exemplos da ineficácia do nosso sistema jurisdicional.
A Justiça brasileira, infelizmente prisioneira de entraves processuais que herdamos dos romanos, ainda não conseguiu a eficácia e a praticidade da de ingleses e norte-americanos. Estes sabem de sobra que o exemplo da punição influi na redução da criminalidade muito mais do que qualquer repressão policial.
Os políticos do Partido dos Trabalhadores que comemoram os dez anos de governo com certeza não farão nenhuma referência ao fato de o Brasil figurar nos índices internacionais de desenvolvimento humano em 84º lugar e que continuamos a ser um dos campeões mundiais de analfabetismo, além de nossa mortalidade infantil persistir como problema a ser resolvido.
Com a entrada em vigor do Plano Real, em 1994, praticamente zerada a inflação, o dinheiro passou a valer mais e isso beneficiou, sobretudo, as pessoas mais pobres, que foram gradativamente inseridas no processo capitalista de consumo.Essa melhora, contudo, não foi suficiente para tirar da pobreza alguns milhões de brasileiros, que continuam na linha da miserabilidade e, portanto, é mesmo necessário que recebam atendimento do governo, com a distribuição de recursos.
Essa doação de dinheiro público, todavia, não poderia ter a feição lamentavelmente adquirida de subterfúgio político destinado a angariar votos e prestígio eleitoral. Quem doa dinheiro público deveria ter no próprio gesto de doar a recompensa, e não a esperada resposta de apoio e votos.
O poeta de origem árabe Khalil Gibran, com lirismo e profundidade, ensinou: "Há aqueles que doam e não sentem dor ao doar, nem buscam alegria, nem doam pensando em virtude.Eles doam como no longínquo vale o mirto exala sua fragrância no espaço. É através dessas mãos que Deus fala, e é por detrás de seus olhos que Deus sorri sobre a Terra".
Seria um invejável gesto de grandeza a distribuição de recursos públicos aos mais sofridos se tal conduta não estivesse marcada por interesses pessoais, por isso mesmo mesquinhos, de feição eleitoral. Quem doa buscando o reconhecimento talvez não perceba que essas dádivas se tornam corruptas.

sábado, 23 de fevereiro de 2013


Do Povo (é nóis, é nosso imposto), Para o Povo (é elis i nóis, nóis é Povo), na boca da Democracia, dus Dereito dus Mano e na manchete de DC de ontem, 5ª feira: R$ 2,34 por dia e "A Miséria Acabou".
Russa, fantasiada com o Paletózinho (Camisona ? Batinha ?) Vermelho e Presidenta da Escola de Samba Unidos do Mensalão, botou o bloco na rua em plena Quaresma, pra apresentar sua mais recente marquetagem, "A Miséria Acabou". Acredite ou vai em cana.
Tome umas e outras pra acreditar; não esqueça de uma talagada das boas para o Santo, se não o milagre mela; você sabe quem é o Santo que aprecia gordas talagadas.
Ao som de "A Miséria Acabou", o Santo lançou Russa candidata a Presidenta da Unidos do Mensalão por mais 4 anos, numa festança na quadra deles, sob emoção, choro e aplausos de todas as alas. O Santo falô e disse.
Com umas e mais outras, você entra em Alpha e acredita piamente que a miséria acabou, que o Pac desempacou, que a Fome Zero zerou e em qualquer outra patranha vinda do palanque de 2014, armado e habitado pela Russa e pelo Criador de Todas as Coisas, inclusive da mais santa corrupção de todos os tempos.
Não quero encrenca com essa turma – veja o sucedido que sucedeu com Toninho de Campinas e Celso Daniel – conte comigo fora dessa.
A Russa canta e nos espanta: "A Miséria Acabou" porque "ela agora dá" R$ 2,34 por dia para os mais miseráveis de todos os miseráveis da nossa Pátria Amada Salve Salve.
Do jeito que fala parece que a grana milionária sai da humilde bolsinha Vuiton dela, do ordenadinho dela.Presidenta ganha uma merreca, menos que Dirceu O Inocente Injustiçado e do que o João Paulo Cinquenta Contos Cunha.
Não misture a Russa Presidenta da Unidos do Mensalão com a Russa Verdadeira, da comunidade da Unidos de Vila Isabel, que é a campeã deste ano. Essa sim, mulher do povo, Russa Verdadeira porque comunista sincera que nunca precisou de verba oficial para apoiar quem quer que fosse.
Torço sempre pela Beija-Flor, propriedade do Corretor Zoológico inocente das acusações dos inimigos invejosos, brimo Aniz Abrahão e posso elogiar quem me dá na telha, então elogio a Russa Verdadeira.
A outra Russa nunca será Verdadeira por ser uma lenda urbana e não uma personagem real, da pura, da legítima, da mineira e de vez em quando também da gaúcha.
Russa Verdadeira apoiou Martinho da Vila, com quem teve a Martinália, na trilha do sucesso como cantora. Vai ter que carregar esse nome, imposto quando era um bebê indefeso e não tinha como protestar.
Protestava chorando e em vez de lhe trocarem o nome, trocavam a fralda ou davam mais uma mamadeira, reafirmando o velho brocardo: "Quem não chora não mama", mesmo que esteja com dor de barriga e não queira mamar. Uzômi chora i mama pra caramba nas tetas da Viúva.
Estou fantasiado de Miserável, fantasia que grudou em mim como cascão e não sai nem com Omo  Entro na Fila da Miserabilidade pra receber meus milionários R$ 2,34 e torrá-los comprando meia média com meio pão sem manteiga ou uma talagada da purinha de cabeça de alambique. Com a fortuna de R$ 2,34 todos os dias, estou feito – dia sim, uma talagada; dia não, meia média e meio pão sem manteiga. "País feliz é país sem miséria".
Depois a grana evapora, não dá pra nada, mas dá pra falar em tudo quanto é jornal, rádio e tv que "A Miséria Acabou". Se a Globo deu, aconteceu; se a Globo deu que "A Miséria Acabou", a miséria acabô.
O Brasil virou uma imensa Bahia com alegria permanente, praia, carnaval, Trios Elétricos com combustível caro ou barato todo santo dia, com chuva ou sem chuva, com Yvete Sangalo e a Outra Baiana, que é a própria Sangalo com outro nome. Uma e Outra são a mesma pessoa.
Felizes todo santo dia, quem sabe recebam incentivos culturais da Petrobras, o verdadeiro Ministério da Cultura que dá grana pra Escola de Samba cumpanhera, filme político cumpanhero, biografia cumpanhera do cumpanhero Lula, peças cumpenheras, times de futebol cumpanheros.
Como Cultura não dá dinheiro, a Petrobras desde o tempo do cumpanhero Gabrielli tá pra lá de Marrakesh de tão quebrada, quebrando junto a cambada de otários pequenos acionistas: eu, você, ele; nós, vós, eles.
O lulo-petismo celebra 10 anos de pudê com um festão festejando a corrupção do bem, a que é praticada para a inclusão e o bem de todos nós. Eles dão risada de nós há 10 longos anos.
Os festejos são abrilhantados pelos mais que mais festejados Lula, a Russa do Paletozinho Vermelho e os Mensaleiros Heróis do Povo, condenados e sentenciados pelo STF. Nos usos e costumes deles, condenação é condecoração. Se foi condenado e sentenciado, palmas pra ele.
Umas duas semanas depois que o carnaval acabou, o carnaval vai continuáááá no país da felicidade eterna, nunca antes vista “neçepaíz”, que canta "Tudo vai bem no melhor dos mundos", de autoria do Dr. Pangloss.
Gaste com moderação os R$ 2,34 por dia da Bolsa "A Miséria Acabou".

Há temas que, por sua magnitude e transversalidade, perpassam diversos outros, que aparentemente lhe são estranhos. É o caso da renúncia do papa Bento 16.
À parte as numerosas teorias da conspiração que a mídia mundial quis lhe atribuir, indiferente às explicações que ele próprio deu, constata-se que o entendimento do tema está contaminado por um despropósito: o conflito ideológico direita x esquerda, modernidade x ortodoxia. É intolerável que assim o seja - mas é.
Tal reducionismo, que chegou ao interior da Santa Sé, há muito inferniza a vida política e econômica dos países e se faz fortemente presente na América do Sul e, em especial, no Brasil.
Se já é uma distorção em relação aos países, impensável é que se tente estendê-la à religião.
Não existe religião progressista. Esse termo, altamente questionável na sua essência, não se aplica a uma instituição que tem por missão exatamente conservar um legado que se pretende eterno.
É, pois, uma contradição em termos classificar um religioso de moderno ou reacionário. São categorias estranhas ao tema.
No Ocidente cristão, ninguém é obrigado a ter uma religião. Se a tem, deve aceitar seus pressupostos; se não a tem, não faz sentido pretender moldá-los, menos ainda a partir de paradigmas que lhe são inteiramente alheios.
A terminologia direita-esquerda surgiu na Revolução Francesa, no fim do século 18, quando a Assembleia Nacional ganhou assento na Sala do Trono. O representante da aristocracia sentava-se à direita do rei; o da Assembleia, à esquerda.
Marx valeu-se desse simbolismo para atribuir à esquerda as questões de interesse popular e à direita os da elite dominante.
Quem dera fosse tão simples. Discutir temas como economia, ambiente e até valores morais a partir desses pressupostos conspira contra o bom-senso e a eficiência.
Por que, por exemplo, a economia de mercado seria de interesse apenas da elite se é ela, comprovadamente, a que gera riquezas e, por extensão, empregos a todos os segmentos sociais?
Não há um só país que, ao adotar o socialismo, tenha erradicado a pobreza ou melhorado a vida do povo.
Países que embarcaram nesse equívoco - e a Rússia é o exemplo mais evidente - saíram ainda mais pobres. Não obstante, a esquerda fez de temas como justiça social, direitos humanos e até defesa do ambiente sua reserva de mercado.
A história registra algo em torno de 100 mil cubanos mortos na sequência da Revolução Socialista, num país que, à época, tinha aproximadamente 8 milhões de habitantes. Foram cerca de 17 mil fuzilamentos e mais 80 mil assassinados em tentativas de fuga.
A ditadura chilena de Augusto Pinochet contabiliza cerca de 40 mil opositores tombados -menos da metade dos cubanos - e as estatísticas oficiais falam em cerca de 3.200 mortos e desaparecidos. No entanto, Pinochet é um monstro (e não discordo disso), enquanto Fidel Castro é, na visão de alguns, um herói. O que os diferencia? Um é de "direita" e o outro de "esquerda". Os dois são detestáveis.
Na questão do ambiente, a contradição é ainda mais berrante. Conspira-se contra o produtor rural, em meio a uma demanda mundial por aumento na produção de alimentos.
A ONU (Organização das Nações Unidas) avisa que, se a produção não aumentar 20% nos próximos dez anos, haverá escassez. E o Brasil é peça-chave nesse processo.
Mas a esquerda -sobretudo a ambientalista - insiste em demonizar o produtor rural. Arvora-se como única e legítima defensora dos direitos do povo, mas defende inocentemente a fome... do povo.
Esquerda e direita são, na verdade, um outro nome para extremismo e radicalismo irracionais, que já causaram muito desastre e muita dor à humanidade. Devem ser motivo de horror, e não de orgulho para quem quer que seja.
Como supor, no cristianismo, um sacerdote ou um pastor esquerdista se no Apocalipse de são João está dito que os justos sentarão à direita do Pai e os condenados à esquerda? Por aí se vê o despropósito dessa terminologia, sobretudo no âmbito religioso.

É difícil detectar como surgiram alguns achados brasileiros:
1.    O Chorinho. Não a música, mas a dose extra que nos é servida na maioria dos bares e restaurantes. Quando começou? Peça um uísque. O garçom trará a garrafa, para você conferir a procedência, exigência de uma economia que convive há séculos com contrabando e pirataria, servirá a dose numa pequena cuia de alumínio de 15 a 60 ml chamada dosador, ou medidor, passará o maltado para o copo com ou sem gelo, e em seguida banhará da própria garrafa as pedras que flutuam. É lançado o sorriso cúmplice, vem a piscada: "Só pra você, que é exclusivo".
Se você é da casa, sabe para que time o garçom torce e até o apelido dele, a dose extra é "no capricho", outra expressão brasileira dúbia, pois indica que há doses e porções que não vêm caprichadas, já que existem aquelas especiais para clientes preferenciais.
Com um chorinho, o cliente se sente mimado, qualificado. O estabelecimento aparenta ofertar mais do que o usual, fugir à regra, tratar você com devoção, sem mesquinharia, sem se importar com os lucros, pois foi com a sua cara, gostou do seu jeito,você é um cara bacana, que merece a quebra de protocolos. Ambas as partes ficam satisfeitas. Pode-se dizer que, como em Casablanca, é o começo e a prova de uma longa amizade.
No entanto, é evidente que a dose extra já está embutida no preço, que os R$ 20 em média que você paga por uma dose de um bom escocês envelhecido é exorbitante, já que a garrafa de um litro custa perto de R$ 100, dependendo do fornecedor - se não atravessou o Rio Paraná numa balsa improvisada, proveniente das destilarias do Chaco -, garrafa em que vem muito mais do que quatro ou cinco doses, talvez 30, talvez 40, ou 66,6 doses, se utilizado o medidor de 15 ml, cuja matemática tira do coma alcoólico o mais dedicado dos boêmios: está-se pagando R$ 1.320 por garrafa, 13,2 vezes mais. Portanto, o chorinho não é um favor,é um truque ilusório que entorpece e ilude o brasileiro.
Outro exemplo: o milk-shake que vem acompanhado pela sobra. O garçom deposita o copo de vidro e o de alumínio em que o sorvete foi batido.
Em lanchonetes, a sobra dá outra dose.
E tem aquela que a sobra é maior do que a dose original, como o prato "que dá pra dividir", outra invenção brasileira.
É verdade que é difícil dosar a quantidade de cada cliente. O que um surfista adolescente bebe ou come é diferente daquilo que uma modelo que fará teste para o próximo desfile deixa no prato, ou moças com colesterol alto e rapazes com glicemia alta evitam.
Mas se você se encanta com a generosidade de quem serve, relaxa. Está tudo embutido no preço.
2. Sertanejo Universitário. Universitário por quê? Tem pensamento pré-socrático, semiótica, behaviorismo, sociobiologia, antropologia e darwinismo social, niilismo e hipóteses do pensamento ocidental debatidas nas letras? Algum indício das contradições do pensamento marxista? Marx aparece como historiador ou economista? A dialética é retratada num rasta pé ou bate-coxa com diploma? Mimesis, de Auerbach, dá para ser anunciado. Rola a letra "Auerbach é das mais significativas referências, nos estudos de cunho hermenêutico, eu, eu, eu, de exegese literária, ai, ai, ai, fez uma abordagem original da questão da representação, sai do chão!"? Nada disso. Sertanejo universitário retrata o pensamento que rola fora das salas de aula nas baladas estudantis.
Como o forró universitário, que nasceu no Remelexo, casa de Pinheiros frequentada pela juventude dourada da USP, que queria em São Paulo aquilo que dançava nas férias de Trancoso, Itaúnas e Canoa Quebrada, o sertanejo universitário se apresenta como uma releitura distanciada do modelo anterior. É influenciado pelo sertanejo de raiz, de Tonico & Tinoco, Alvarenga & Ranchinho, e pelo sertanejo mullets, de Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo, mas com um conteúdo que recupera a futilidade do novo pagode e detalha os efeitos macroeconômicos da expensão da fronteira agrícola e do lulismo - como exaltação do consumo, facilidade do crédito e mudanças na pirâmide social.
O Camaro, símbolo das pistas de corrida Nascar do Meio-Oeste americano, é retratado como uma arma para a vingança na batalha da luta de classes da sedução amorosa no sucesso de Munhoz & Mariano, Camaro Amarelo: "Agora eu fiquei doce igual caramelo, tô tirando onda de Camaro amarelo, e agora você diz "vem cá que eu te quero", quando eu passo no Camaro amarelo. Quando eu passava por você na minha CG, você nem me olhava. Fazia de tudo pra me ver, pra me perceber, mas nem me olhava. Aí veio a herança do meu véio, e resolveu os meus problemas, minha situação."
O antigo motoqueiro de uma humilde,mas eficiente CG 125 cilindrada, modelo da Honda de motor 4 tempos monocilíndrico arrefecido a ar, cuja potência máxima é de 11,6 cavalos e custa em torno de R$ 5,5mil, ficou doce e rancoroso ao adquirir um carro da Chevrolet, que custa a partir de R$ 200 mil, V8 de 406 cavalos, com câmera de estacionamento com visualização através de uma tela de LCD de sete polegadas.
"Do dia pra noite fiquei rico, tô na grife, tô bonito, tô andando igual patrão. E agora você vem, né? Agora você quer. Só que agora vou escolher, tá sobrando mulher", finaliza o novo-rico.
Já a dupla Ronny & Rangel, do sucesso Puxa, Agarra e Chupa, que virou obrigatório em formaturas universitárias, deu um troco mais ambicioso no projeto da dupla anterior. Camaro?
"Todo mundo fala de carrinho, mas meu negócio é outro, comprei jatinho, a playboyzada sai de caminhonete, meu avião lotado só de piriguete. Estoura uma champanhe pra gente comemorar, o clima tá gostoso, o bicho vai pegar. Vai se acostumando que ninguém é de ninguém. Ai meu Deus do céu, ram, hoje tem!"
Se Puxa, Agarra e Chupa era o reflexo de um evidente caso de transferência do desejo pela mãe, que impedia o autor de tomar atitudes, expor suas vontades ao viver encolhido num espectro de castração ("com as palavras eu me perco, eu não sei falar direito, e quando eu tô a fim, timidez é meu defeito"), Festa no Jatinho acredita no sonho sem limites, no projeto de redistribuição de renda, proveniente de um novo sertão rural irrigado, terra do agronegócio, de oportunidades que proporcionam inversão da pirâmide social aliada ao Prouni e sistema de cotas que oferece chances antes remotas de ascensão.
E pensar que Menino da Porteira e Chico Mineiro, compostos pela universidade da vida, deram em ganância e esnobismo "universitários".

terça-feira, 10 de julho de 2012

NINGUÉM COMENTA A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA – Texto original de ROSELY SAYÃO

De modo geral, não temos nos preocupado muito com a gravidez indesejada entre adolescentes.
De quando em quando, vemos campanhas que alertam sobre a necessidade dos cuidados para evitar a gestação nessa etapa da vida, mas nada realmente consistente ocorre a esse respeito.
As famílias e as escolas, as maiores implicadas com a formação dos jovens, costumam ignorar o tema. É que é mesmo difícil trabalhar com essa questão. Para os pais, porque a conversa com os filhos a respeito da sexualidade e de suas consequências costuma ser ora constrangedora, ora camarada em demasia. Para as escolas, porque a educação sexual no espaço público exige preparo para ser praticada.
Temos muitos motivos para colocar o assunto em pauta. Desses, cito apenas dois: o início da vida sexual tem sido cada vez mais precoce e a ocorrência da gravidez entre garotas é uma causa importante de tentativa de suicídio. Para falar bem a verdade, com essas duas razões nem precisaríamos de outras, não é verdade? Vamos pensar a respeito delas.
Por que os jovens têm iniciado a vida sexual cada vez mais cedo? Podemos levantar algumas hipóteses.
Primeiramente, porque vivemos em uma sociedade hipersexualizada. O erotismo, inclusive, perdeu lugar porque agora o que vale é o sexo. Músicas, imagens, publicações: tudo transpira sexo.
Junto a essa estimulação exagerada, precisamos lembrar que a infância tem sido cada vez mais curta. Meninas com idade próxima dos 10 anos já têm vidas dignas de mulheres: frequentam festas sem adultos, usam vestimentas provocantes, pensam em namorar. Muitas não pensam, apenas: já aprenderam, pela experiência, a conjugar o verbo namorar.
Nós estamos diante de um fato bem recente: a adolescência antecede a puberdade. Dessa forma, quando o corpo faz a passagem do infantil para o adulto, as experiências de uma vida adulta já são diversas.
Entretanto, essas experiências não são suficientes para precipitar a maturidade.
Por isso, os jovens praticam o sexo adulto de forma infantil: sem compromisso com os resultados que podem advir de seus atos. Não se previnem da gravidez, tampouco das doenças sexualmente transmissíveis. E fica bem claro o motivo: porque eles ainda não desenvolveram o que chamamos de autocuidado. Esse conceito significa a atenção que se exerce sobre si mesmo e que, para ser praticado, exige maturidade.
Pois bem: quando a gravidez acontece, a jovem, em especial, se sente perdida. O que acontecerá com a vida dela estando grávida? Já que são imaturas, a maior preocupação das garotas costuma ser a reação dos pais. E, sem saber como resolver a questão, a ideia suicida surge como a melhor solução, mesmo que a jovem não consiga ter o exato alcance desse ato.
As famílias podem ajudar a evitar que a situação com os filhos atinja esse ponto. Proteger a infância dos filhos é uma medida que costuma ser benéfica, já que a prática sexual adulta não costuma ser atraente para crianças. Além disso, manter o interesse verdadeiro pela vida do filho e manter com ele conversas significativas -conversas, e não sermões- são atitudes que podem ajudar muito.
Por sua vez, as escolas bem que poderiam elaborar projetos de educação sexual para seus alunos. Projeto significa planejamento, preparo, pesquisa de estratégias, metodologia, formação dos docentes, conhecimento dos alunos etc. Nesse assunto, trabalhos espontaneístas não produzem bons efeitos.
Por incrível que pareça, algumas escolas tentam, mas adivinhe, caro leitor: muitos pais se opõem a essa medida. Por que será?
Uma coisa é certa: não é silenciando a respeito da gravidez na adolescência que resolveremos a questão.

sábado, 30 de junho de 2012

EINSTEIN, DAVIES E O DEUS DE SPINOZA

ACREDITO NO DEUS DE SPINOZA: EINSTEIN

Albert Einstein (1879-1955), físico alemão de origem judaica que dispensa apresentações, quando, em 1921, perguntado pelo rabino H. Goldstein, de New York, se acreditava em Deus, respondeu: “Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens” Nesta mesma ocasião, o cardeal O’Connel, de Boston, publicou uma declaração na qual dizia que a teoria da relatividade “encobre com um manto o horrível fantasma do ateísmo, e obscurece especulações, produzindo uma dúvida universal sobre Deus e sua criação”.
Posteriormente, em uma carta escrita em Berlim a um banqueiro do Colorado, datada de 5 de agosto de 1927, Einstein explica:
Não consigo conceber um Deus pessoal que influa diretamente sobre as ações dos indivíduos, ou que julgue, diretamente criaturas por Ele criadas. Não posso fazer isto apesar do fato de que a causalidade mecanicista foi, até certo ponto, posta em dúvida pela ciência moderna. Minha religiosidade consiste em uma humilde admiração pelo espírito infinitamente superior que se revela no pouco que nós, com nossa fraca e transitória compreensão, podemos entender da realidade. A moral é da maior importância - para nós, porém, não para Deus.
No artigo Religião e Ciência, que faz parte do livro Como vejo o mundo, publicado em alemão em 1953, Einstein escreve:
Todos podem atingir a religião em um último grau, raramente acessível em sua pureza total. Dou a isto o nome de religiosidade cósmica e não posso falar dela com facilidade já que se trata de uma noção muito nova, à qual não corresponde conceito algum de um Deus antropomórfico (...). Notam-se exemplos desta religião cósmica nos primeiros momentos da evolução em alguns salmos de Davi ou em alguns profetas. Em grau infinitamente mais elevado, o budismo organiza os dados do cosmos (...). Ora, os gênios religiosos de todos os tempos se distinguiram por esta religiosidade ante o cosmos. Ela não tem dogmas nem Deus concebido à imagem do homem, portanto nenhuma Igreja ensina a religião cósmica. Temos também a impressão de que hereges de todos os tempos da história humana se nutriam com esta forma superior de religião. Contudo, seus contemporâneos muitas vezes os tinham por suspeitos de ateísmo, e às vezes, também, de santidade. Considerados deste ponto de vista, homens como Demócrito, Francisco de Assis e Spinoza se assemelham profundamente”.
E no artigo A religiosidade da pesquisa, no mesmo livro, Einstein defende que “o espírito científico, fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica”. Para ele a religiosidade do sábio
consiste em espantar-se, em extasiar-se diante da harmonia das leis da natureza, revelando uma inteligência tão superior que todos os pensamentos humanos e todo seu engenho não podem desvendar, diante dela, a não ser seu nada irrisório. Este sentimento desenvolve a regra dominante de sua vida, de sua coragem, na medida em que supera a servidão dos desejos egoístas. Indubitavelmente, este sentimento se compara àquele que animou os espíritos criadores religiosos em todos os tempos.

DEVE HAVER UM NÍVEL MAIS PROFUNDO DE EXPLICAÇÃO DO UNIVERSO: PAUL DAVIES

Paul Davies nasceu na Inglaterra em 1946 e doutorou-se em física pelo University College de Londres. Ocupou cargos acadêmicos nas áreas de astronomia e matemática nas Universidades de Cambridge e Londres. Contratado como catedrático de física pela Universidade de Adelaide, Austrália, Paul Davies desenvolve pesquisas no campo da gravitação e da cosmologia, com ênfase no tema dos buracos negros e do big-bang. É autor de muitos livros sobre física, uma dezena dos quais para o público não-especializado, além de apresentar, com frequência, programas científicos no rádio e na televisão.
Em seu livro Deus e a nova física, publicado em inglês em 1983, diz Paul Davies:
A ciência só é possível porque vivemos num universo ordenado, que se conforma com leis matemáticas simples. A tarefa dos cientistas é estudar, catalogar e relatar a ordenação da natureza, não indagar a sua origem. Mas os teólogos têm argumentado, desde há muito, que a ordem do mundo físico é uma prova da existência de Deus. Se isso assim for, então a ciência e a religião adquirem um objetivo comum que é revelar a obra de Deus. Na realidade tem-se afirmado que o aparecimento da cultura científica ocidental foi efetivamente estimulada pela tradição judaico-cristã, com sua ênfase na organização intencional do cosmos por Deus - uma organização que poderia ser discernida pelo uso da pesquisa científica racional.
Aliás, nesta direção parece caminhar Einstein quando diz que a ciência
[...]só pode ser criada por quem esteja plenamente imbuído da aspiração à verdade e ao entendimento. A fonte desse sentimento, no entanto, brota na esfera da religião. A esta se liga também a fé na possibilidade de que as regulações válidas para o mundo da existência sejam racionais, isto é, compreensíveis à razão. Não posso conceber um autêntico cientista sem essa fé profunda. A situação pode ser expressa por uma imagem: a ciência sem religião é aleijada, a religião sem ciência é cega.
Paul Davies, ainda sobre a relação entre ciência e religião, se pergunta se a ciência teria florescido na Europa medieval e renascentista não fosse a teologia ocidental. E exemplifica com a China, que produziu inovações tecnológicas antes da Europa, mas que não as levou avante porque aos chineses faltava o conceito de um ser divino que formulara leis da natureza que os homens podiam compreender e utilizar.
Por sinal, é nesta mesma obra, A mente de Deus, escrita nove anos após Deus e a nova física, que Paul Davies nos lembra terem surgido muitas ideias sobre física fundamental nestes anos, tais como a teoria das supercordas, os novos desenvolvimentos na cosmologia quântica, a pesquisa de Stephen Hawking sobre o “tempo imaginário”, a teoria do caos e tantas outras, e acrescenta:
Tais acontecimentos assumiram duas formas diferentes. Primeiro, um diálogo muito mais intenso entre cientistas, filósofos e teólogos sobre o conceito de criação e temas conexos. Segundo, uma intensificação da moda do pensamento místico e da filosofia oriental, que alguns comentadores afirmaram estar em contato profundo e significativo com a física fundamental.
Paul Davies nos diz que, após a publicação de Deus e a nova física, ficou assombrado com a postura religiosa dos cientistas, que podem ser classificados em dois grupos: os religiosos e os não-religiosos; entre os religiosos, muitos praticam uma religião tradicional e em alguns casos mantêm os dois aspectos de sua vida, o científico e o religioso, separados, de tal modo que são governados pela ciência durante seis dias da semana e pela religião no domingo. Entretanto, um pequeno grupo de cientistas se esforça para dialogar com a religião, mesmo que o resultado seja uma visão bastante liberal da religião e uma atribuição incomum de significado aos fenômenos físicos. E mesmo entre os não-religiosos existe
[...] uma vaga sensação de que há algo além da realidade superficial da experiência cotidiana, algum sentido por trás da existência. Mesmo ateus mais empedernidos frequentemente têm o que foi chamado de sentimento de reverência pela natureza, fascínio e respeito por sua profundidade, beleza e sutileza, algo muito semelhante à veneração religiosa.
Paul Davies procura deixar claro sua própria posição: “Como cientista profissional, confio plenamente no método científico de investigação do mundo”. A ciência, para ele, demonstra a todo momento ser poderosa para explicar o mundo em que vivemos, mas o que existe de mais atraente no método científico é “sua intransigente honestidade”, pois, antes de ser aceita, cada nova descoberta tem que passar por rigorosos testes aplicados pela comunidade científica, o que possibilita a eliminação das trapaças de cientistas inescrupulosos”.
Acrescenta o físico que prefere não acreditar em fenômenos sobrenaturais, pois parte do princípio de que as leis da natureza são sempre obedecidas. Mas, mesmo assim, pensa que a ciência pode não conseguir explicar tudo no universo físico, já que “resta o velho problema do término do raciocínio explicativo”. Pois se as leis da física são tomadas como algo válido em princípio é preciso perguntar de onde vêm essas leis. Assim
[...] mais cedo ou mais tarde todos temos de aceitar algo como dado, seja Deus, ou a lógica, ou um conjunto de leis ou algum outro fundamento para a existência. Assim, as perguntas terminais sempre estarão fora do alcance da ciência empírica, na sua definição corrente (...) Provavelmente sempre deverá restar algum “mistério no fim do universo”.
Completando a definição de sua postura, Paul Davies diz que pertence àquele grupo de cientistas que não pratica uma religião tradicional, mas que nega ser o universo apenas um acidente sem objetivo.
Meu trabalho científico levou-me a acreditar, cada vez mais intensamente, que a constituição do universo físico atesta um engenho tão assombroso que não posso aceitá-lo apenas como fato bruto. Parece-me que deve haver um nível mais profundo de explicação. Querer chamar esse nível mais profundo de “Deus” é uma questão de gosto e definição.
Fontes
CALDER, N., O universo de Einstein, Brasília, Editora da UnB, 1988.
CAPRA, F., O Tao da física. Um paralelo entre a física moderna e o misticismo oriental, São Paulo, Cultrix, 1984 (original inglês: 1975).
DAVIES, P., A mente de Deus. A ciência e a busca do sentido último, Rio de Janeiro, Ediouro.
______. Deus e a nova física, Lisboa, Edições 70, 2000.
DUKAS, H. e HOFFMANN, B. (org.), Albert Einstein: o lado humano. Rápidas visões colhidas em seus arquivos, Brasília, Editora da UnB, 1984.
EINSTEIN, A., Escritos da maturidade, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994.
______. Como vejo o mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981.
GOLGHER, I., O universo físico e humano de Albert Einstein, Belo Horizonte, Oficina de Livros, 1991.
HAWKING, Stephen Buracos negros, universos-bebês e outros ensaios, Rio de Janeiro, Rocco, 1995
______. O Universo numa Casca de Noz, ARX, São Paulo, 2002.
______. Uma breve história do tempo. Do big bang aos buracos negros, Rio de Janeiro, Rocco, 1988 [reedição:2002]
PAIS, A., Sutil é o Senhor: a ciência e a vida de Albert Einstein, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1995.