"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

terça-feira, 10 de julho de 2012

NINGUÉM COMENTA A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA – Texto original de ROSELY SAYÃO

De modo geral, não temos nos preocupado muito com a gravidez indesejada entre adolescentes.
De quando em quando, vemos campanhas que alertam sobre a necessidade dos cuidados para evitar a gestação nessa etapa da vida, mas nada realmente consistente ocorre a esse respeito.
As famílias e as escolas, as maiores implicadas com a formação dos jovens, costumam ignorar o tema. É que é mesmo difícil trabalhar com essa questão. Para os pais, porque a conversa com os filhos a respeito da sexualidade e de suas consequências costuma ser ora constrangedora, ora camarada em demasia. Para as escolas, porque a educação sexual no espaço público exige preparo para ser praticada.
Temos muitos motivos para colocar o assunto em pauta. Desses, cito apenas dois: o início da vida sexual tem sido cada vez mais precoce e a ocorrência da gravidez entre garotas é uma causa importante de tentativa de suicídio. Para falar bem a verdade, com essas duas razões nem precisaríamos de outras, não é verdade? Vamos pensar a respeito delas.
Por que os jovens têm iniciado a vida sexual cada vez mais cedo? Podemos levantar algumas hipóteses.
Primeiramente, porque vivemos em uma sociedade hipersexualizada. O erotismo, inclusive, perdeu lugar porque agora o que vale é o sexo. Músicas, imagens, publicações: tudo transpira sexo.
Junto a essa estimulação exagerada, precisamos lembrar que a infância tem sido cada vez mais curta. Meninas com idade próxima dos 10 anos já têm vidas dignas de mulheres: frequentam festas sem adultos, usam vestimentas provocantes, pensam em namorar. Muitas não pensam, apenas: já aprenderam, pela experiência, a conjugar o verbo namorar.
Nós estamos diante de um fato bem recente: a adolescência antecede a puberdade. Dessa forma, quando o corpo faz a passagem do infantil para o adulto, as experiências de uma vida adulta já são diversas.
Entretanto, essas experiências não são suficientes para precipitar a maturidade.
Por isso, os jovens praticam o sexo adulto de forma infantil: sem compromisso com os resultados que podem advir de seus atos. Não se previnem da gravidez, tampouco das doenças sexualmente transmissíveis. E fica bem claro o motivo: porque eles ainda não desenvolveram o que chamamos de autocuidado. Esse conceito significa a atenção que se exerce sobre si mesmo e que, para ser praticado, exige maturidade.
Pois bem: quando a gravidez acontece, a jovem, em especial, se sente perdida. O que acontecerá com a vida dela estando grávida? Já que são imaturas, a maior preocupação das garotas costuma ser a reação dos pais. E, sem saber como resolver a questão, a ideia suicida surge como a melhor solução, mesmo que a jovem não consiga ter o exato alcance desse ato.
As famílias podem ajudar a evitar que a situação com os filhos atinja esse ponto. Proteger a infância dos filhos é uma medida que costuma ser benéfica, já que a prática sexual adulta não costuma ser atraente para crianças. Além disso, manter o interesse verdadeiro pela vida do filho e manter com ele conversas significativas -conversas, e não sermões- são atitudes que podem ajudar muito.
Por sua vez, as escolas bem que poderiam elaborar projetos de educação sexual para seus alunos. Projeto significa planejamento, preparo, pesquisa de estratégias, metodologia, formação dos docentes, conhecimento dos alunos etc. Nesse assunto, trabalhos espontaneístas não produzem bons efeitos.
Por incrível que pareça, algumas escolas tentam, mas adivinhe, caro leitor: muitos pais se opõem a essa medida. Por que será?
Uma coisa é certa: não é silenciando a respeito da gravidez na adolescência que resolveremos a questão.

sábado, 30 de junho de 2012

EINSTEIN, DAVIES E O DEUS DE SPINOZA

ACREDITO NO DEUS DE SPINOZA: EINSTEIN

Albert Einstein (1879-1955), físico alemão de origem judaica que dispensa apresentações, quando, em 1921, perguntado pelo rabino H. Goldstein, de New York, se acreditava em Deus, respondeu: “Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens” Nesta mesma ocasião, o cardeal O’Connel, de Boston, publicou uma declaração na qual dizia que a teoria da relatividade “encobre com um manto o horrível fantasma do ateísmo, e obscurece especulações, produzindo uma dúvida universal sobre Deus e sua criação”.
Posteriormente, em uma carta escrita em Berlim a um banqueiro do Colorado, datada de 5 de agosto de 1927, Einstein explica:
Não consigo conceber um Deus pessoal que influa diretamente sobre as ações dos indivíduos, ou que julgue, diretamente criaturas por Ele criadas. Não posso fazer isto apesar do fato de que a causalidade mecanicista foi, até certo ponto, posta em dúvida pela ciência moderna. Minha religiosidade consiste em uma humilde admiração pelo espírito infinitamente superior que se revela no pouco que nós, com nossa fraca e transitória compreensão, podemos entender da realidade. A moral é da maior importância - para nós, porém, não para Deus.
No artigo Religião e Ciência, que faz parte do livro Como vejo o mundo, publicado em alemão em 1953, Einstein escreve:
Todos podem atingir a religião em um último grau, raramente acessível em sua pureza total. Dou a isto o nome de religiosidade cósmica e não posso falar dela com facilidade já que se trata de uma noção muito nova, à qual não corresponde conceito algum de um Deus antropomórfico (...). Notam-se exemplos desta religião cósmica nos primeiros momentos da evolução em alguns salmos de Davi ou em alguns profetas. Em grau infinitamente mais elevado, o budismo organiza os dados do cosmos (...). Ora, os gênios religiosos de todos os tempos se distinguiram por esta religiosidade ante o cosmos. Ela não tem dogmas nem Deus concebido à imagem do homem, portanto nenhuma Igreja ensina a religião cósmica. Temos também a impressão de que hereges de todos os tempos da história humana se nutriam com esta forma superior de religião. Contudo, seus contemporâneos muitas vezes os tinham por suspeitos de ateísmo, e às vezes, também, de santidade. Considerados deste ponto de vista, homens como Demócrito, Francisco de Assis e Spinoza se assemelham profundamente”.
E no artigo A religiosidade da pesquisa, no mesmo livro, Einstein defende que “o espírito científico, fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica”. Para ele a religiosidade do sábio
consiste em espantar-se, em extasiar-se diante da harmonia das leis da natureza, revelando uma inteligência tão superior que todos os pensamentos humanos e todo seu engenho não podem desvendar, diante dela, a não ser seu nada irrisório. Este sentimento desenvolve a regra dominante de sua vida, de sua coragem, na medida em que supera a servidão dos desejos egoístas. Indubitavelmente, este sentimento se compara àquele que animou os espíritos criadores religiosos em todos os tempos.

DEVE HAVER UM NÍVEL MAIS PROFUNDO DE EXPLICAÇÃO DO UNIVERSO: PAUL DAVIES

Paul Davies nasceu na Inglaterra em 1946 e doutorou-se em física pelo University College de Londres. Ocupou cargos acadêmicos nas áreas de astronomia e matemática nas Universidades de Cambridge e Londres. Contratado como catedrático de física pela Universidade de Adelaide, Austrália, Paul Davies desenvolve pesquisas no campo da gravitação e da cosmologia, com ênfase no tema dos buracos negros e do big-bang. É autor de muitos livros sobre física, uma dezena dos quais para o público não-especializado, além de apresentar, com frequência, programas científicos no rádio e na televisão.
Em seu livro Deus e a nova física, publicado em inglês em 1983, diz Paul Davies:
A ciência só é possível porque vivemos num universo ordenado, que se conforma com leis matemáticas simples. A tarefa dos cientistas é estudar, catalogar e relatar a ordenação da natureza, não indagar a sua origem. Mas os teólogos têm argumentado, desde há muito, que a ordem do mundo físico é uma prova da existência de Deus. Se isso assim for, então a ciência e a religião adquirem um objetivo comum que é revelar a obra de Deus. Na realidade tem-se afirmado que o aparecimento da cultura científica ocidental foi efetivamente estimulada pela tradição judaico-cristã, com sua ênfase na organização intencional do cosmos por Deus - uma organização que poderia ser discernida pelo uso da pesquisa científica racional.
Aliás, nesta direção parece caminhar Einstein quando diz que a ciência
[...]só pode ser criada por quem esteja plenamente imbuído da aspiração à verdade e ao entendimento. A fonte desse sentimento, no entanto, brota na esfera da religião. A esta se liga também a fé na possibilidade de que as regulações válidas para o mundo da existência sejam racionais, isto é, compreensíveis à razão. Não posso conceber um autêntico cientista sem essa fé profunda. A situação pode ser expressa por uma imagem: a ciência sem religião é aleijada, a religião sem ciência é cega.
Paul Davies, ainda sobre a relação entre ciência e religião, se pergunta se a ciência teria florescido na Europa medieval e renascentista não fosse a teologia ocidental. E exemplifica com a China, que produziu inovações tecnológicas antes da Europa, mas que não as levou avante porque aos chineses faltava o conceito de um ser divino que formulara leis da natureza que os homens podiam compreender e utilizar.
Por sinal, é nesta mesma obra, A mente de Deus, escrita nove anos após Deus e a nova física, que Paul Davies nos lembra terem surgido muitas ideias sobre física fundamental nestes anos, tais como a teoria das supercordas, os novos desenvolvimentos na cosmologia quântica, a pesquisa de Stephen Hawking sobre o “tempo imaginário”, a teoria do caos e tantas outras, e acrescenta:
Tais acontecimentos assumiram duas formas diferentes. Primeiro, um diálogo muito mais intenso entre cientistas, filósofos e teólogos sobre o conceito de criação e temas conexos. Segundo, uma intensificação da moda do pensamento místico e da filosofia oriental, que alguns comentadores afirmaram estar em contato profundo e significativo com a física fundamental.
Paul Davies nos diz que, após a publicação de Deus e a nova física, ficou assombrado com a postura religiosa dos cientistas, que podem ser classificados em dois grupos: os religiosos e os não-religiosos; entre os religiosos, muitos praticam uma religião tradicional e em alguns casos mantêm os dois aspectos de sua vida, o científico e o religioso, separados, de tal modo que são governados pela ciência durante seis dias da semana e pela religião no domingo. Entretanto, um pequeno grupo de cientistas se esforça para dialogar com a religião, mesmo que o resultado seja uma visão bastante liberal da religião e uma atribuição incomum de significado aos fenômenos físicos. E mesmo entre os não-religiosos existe
[...] uma vaga sensação de que há algo além da realidade superficial da experiência cotidiana, algum sentido por trás da existência. Mesmo ateus mais empedernidos frequentemente têm o que foi chamado de sentimento de reverência pela natureza, fascínio e respeito por sua profundidade, beleza e sutileza, algo muito semelhante à veneração religiosa.
Paul Davies procura deixar claro sua própria posição: “Como cientista profissional, confio plenamente no método científico de investigação do mundo”. A ciência, para ele, demonstra a todo momento ser poderosa para explicar o mundo em que vivemos, mas o que existe de mais atraente no método científico é “sua intransigente honestidade”, pois, antes de ser aceita, cada nova descoberta tem que passar por rigorosos testes aplicados pela comunidade científica, o que possibilita a eliminação das trapaças de cientistas inescrupulosos”.
Acrescenta o físico que prefere não acreditar em fenômenos sobrenaturais, pois parte do princípio de que as leis da natureza são sempre obedecidas. Mas, mesmo assim, pensa que a ciência pode não conseguir explicar tudo no universo físico, já que “resta o velho problema do término do raciocínio explicativo”. Pois se as leis da física são tomadas como algo válido em princípio é preciso perguntar de onde vêm essas leis. Assim
[...] mais cedo ou mais tarde todos temos de aceitar algo como dado, seja Deus, ou a lógica, ou um conjunto de leis ou algum outro fundamento para a existência. Assim, as perguntas terminais sempre estarão fora do alcance da ciência empírica, na sua definição corrente (...) Provavelmente sempre deverá restar algum “mistério no fim do universo”.
Completando a definição de sua postura, Paul Davies diz que pertence àquele grupo de cientistas que não pratica uma religião tradicional, mas que nega ser o universo apenas um acidente sem objetivo.
Meu trabalho científico levou-me a acreditar, cada vez mais intensamente, que a constituição do universo físico atesta um engenho tão assombroso que não posso aceitá-lo apenas como fato bruto. Parece-me que deve haver um nível mais profundo de explicação. Querer chamar esse nível mais profundo de “Deus” é uma questão de gosto e definição.
Fontes
CALDER, N., O universo de Einstein, Brasília, Editora da UnB, 1988.
CAPRA, F., O Tao da física. Um paralelo entre a física moderna e o misticismo oriental, São Paulo, Cultrix, 1984 (original inglês: 1975).
DAVIES, P., A mente de Deus. A ciência e a busca do sentido último, Rio de Janeiro, Ediouro.
______. Deus e a nova física, Lisboa, Edições 70, 2000.
DUKAS, H. e HOFFMANN, B. (org.), Albert Einstein: o lado humano. Rápidas visões colhidas em seus arquivos, Brasília, Editora da UnB, 1984.
EINSTEIN, A., Escritos da maturidade, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994.
______. Como vejo o mundo, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981.
GOLGHER, I., O universo físico e humano de Albert Einstein, Belo Horizonte, Oficina de Livros, 1991.
HAWKING, Stephen Buracos negros, universos-bebês e outros ensaios, Rio de Janeiro, Rocco, 1995
______. O Universo numa Casca de Noz, ARX, São Paulo, 2002.
______. Uma breve história do tempo. Do big bang aos buracos negros, Rio de Janeiro, Rocco, 1988 [reedição:2002]
PAIS, A., Sutil é o Senhor: a ciência e a vida de Albert Einstein, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1995.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

A Lenta Agonia da Liberdade

O mundo ocidental passa por um processo cada vez mais patente de restrição das liberdades. Países da União Europeia, e das Américas estão sendo cada vez mais dominados pela ditadura do politicamente correto que nada mais é do que um emaranhado de ideologias que, em nome de garantir as liberdades, cada vez mais calam e silenciam desde o cidadão comum até conglomerados da mídia.
Nem mesmo os Estados Unidos estão imune a este mal. Lá, como cá, as pessoas estão cada vez mais direcionadas a pensar da maneira como se quer que elas pensem e não de acordo com suas experiências e formação familiar.
Nas últimas quatro décadas pelo menos, idéias-força vêm sendo criadas com o objetivo de imprimir na mente da população, verdades universais que se tornam inquestionáveis e imunes a qualquer tipo de crítica ou questionamento. Exemplos não faltam. Para ilustrar, basta que alguém questione o aquecimento global antropogênico, seja contra a homossexualidade ou aos diversos tipos de cotas que imediatamente uma multidão de censores bradará contra seu posicionamento. Afinal, o homem é responsável pelo aquecimento global, a homossexualidade é linda e maravilhosa e as cotas são o supra-sumo da justiça. Qualquer opinião contrária a estes verdadeiros princípios fundamentais da humanidade deve ser censurada e criminalizada.
Sob os argumentos como "os gays precisam ser protegidos, o meio ambiente preservado, e os excluídos amparados", progressivamente são aprovadas leis que criminalizam toda a opinião divergente do determinado pelo politicamente correto. A lei anti-homofobia é o exemplo mais claro. Não obstante, toda a sorte de estudos científicos, estatísticos e históricos que questionem estes e outros princípios (feminismo, sustentabilidade, etc) é imediatamente relegado às trevas. Para estes estudos, não há financiamento público nem incentivo estatal. Muito pelo contrário. A campanha é justamente a da falsidade peremptória, onde tudo aquilo que vá de encontro aos postulados determinados é automaticamente considerado falso, não interessando se os métodos de pesquisa e os dados estejam rigorosamente corretos.
Para aqueles que pensam estar na escola a solução para esta padronização de idéias, atenção. É justamente nela que elas são replicadas e difundidas nas cabeças de nossos estudantes. Com o Estado tendo o monopólio do currículo educacional, nossos futuros pensadores serão apenas difusores das idéias-força determinadas pela elite esquerdista já estabelecida em todos os setores da política, educação e meios de comunicação.
O grande truque para o sucesso de tal lavagem cerebral é a difusão sistemática de que, para garantir a liberdade de todos é preciso proteger as assim chamadas minorias. Com este argumento romanticamente defendido e diabolicamente planejado, as pessoas começam a aceitar progressivas retaliações nas suas atitudes e opiniões. Não conseguem perceber que caminham lentamente para o controle estatal completo de seus pensamentos e atitudes em virtude se viverem iludidos em uma névoa de novas leis morais e comportamentais determinados pela "opinião pública" e "pela maioria", dois conceitos suficientemente abstratos para serem manipulados de forma a constituírem-se em expressão verdadeira da vontade geral, quando na verdade não passam de ferramentas utilizadas para a homogeneização do pensamento.
Com o controle dos mecanismos formadores de opinião e da educação fica extremamente fácil falsificar os dados: basta que se publiquem pesquisas de opinião em institutos "independentes" para que se transmutem na expressão inequívoca da verdade. Assim, a opinião publicada passa a ser a opinião pública, formadora e padronizadora de idéias.
Nenhum exemplo é mais ilustrativo para compreendermos como funciona este mecanismo como a famigerada lei anti-homofobia. Nesta lei a opinião contrária à prática homossexual é criminalizada. Vejam bem, a opinião! A desculpa: para garantirmos a liberdade dos gays que vivem num malvado país homofóbico. A proibição do fumo em bares e restaurantes segue na mesma linha: o proprietário do estabelecimento não pode permitir o acesso de fumantes em seu estabelecimentos. A desculpa: para preservar a saúde dos demais frequentadores. Vejam que de uma só tacada foram retiradas três liberdades: a do dono do restaurante de permitir fumantes, a dos fumantes de ir a bares e restaurantes e a dos que não fumam de escolherem se querem frequentar um ambiente com ou sem fumantes. A lei da palmada, sob a justificativa de proteger as crianças, retiram dos pais a liberdade de educar seus filhos como eles próprios foram educados o que, na maioria das vezes, requer uma palmada ou outra, além de impedir que as crianças recebam uma formação familiar, moral e religiosa sólida.
Estes foram apenas alguns exemplos de inúmeras leis que retiram liberdades individuais com a promessa de preservar estas mesmas liberdades. Sem percebermos, estamos tendo cada vez mais tolhida a nossa autonomia para expressarmos nossos posicionamentos morais, religiosos e culturais. Não bastasse a morte lenta desta liberdade, criam-se pequenos grupos imunes a qualquer tipo de crítica e dúvida, verdadeiros deuses da virtude. A desculpa para isto, é a mesma ladainha de sempre: preservar a liberdade.
Sob este argumento, a sociedade vai ficando cada vez mais segmentada e polarizada. Com a sucessiva concessão de privilégios legais às minorias e restrições à maioria, cria-se um ambiente de crise mais acentuado, propício ao surgimento de grupos radicais dos dois lados. Para contar os ânimos que vão se exaltando a sociedade como um todo passa a aceitar, inclusive a incentivar, um poder estatal ainda mais forte, a fim de conter as animosidades e colocar "ordem na casa". E adivinhem quais as medidas que são adotadas? Cerceamento de liberdades. O partido, que criou o problema, passa a ser vista como sua solução.
É a lenta agonia da liberdade que passa a abrir espaço para um verdadeiro totalitarismo. Tudo sob os aplausos calorosos de nossos intelectuais e estudantes devidamente fardados com a face negra de Che Guevara.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Curiosidades na História

Abraham Lincoln foi eleito para o Congresso em 1846.
John F. Kennedy foi eleito para o Congresso em 1946 .

Abraham Lincoln foi eleito Presidente em 1860.
John F. Kennedy foi eleito Presidente em 1960.

Ambos estiveram muito empenhados em melhorar os direitos civis.
As esposas de ambos perderam filhos enquanto estavam na Casa Branca.

Ambos os Presidentes foram assassinados numa quinta-feira.

Ambos foram alvejados na cabeça.

A secretária de Lincoln tinha de apelido Kennedy,
E a secretária de Kennedy tinha de apelido Lincoln.

Ambos foram assassinados por homens do sul dos E.U.A. e ambos substituídos por homens do sul com o mesmo apelido: Johnson .

- Andrew Johnson, que substituiu Lincoln, nasceu em 1808.
- Lyndon Johnson, que substituiu Kennedy, nasceu em 1908

John Wilkes Booth, que assassinou Lincoln, nasceu em 1839.
Lee Harvey Oswald, que assassinou Kennedy, nasceu em 1939.

Ambos usavam e eram conhecidos pelos seus 3 nomes, algo não muito praticado na cultura norte-americana.

A soma das letras dos nomes de ambos, dá o mesmo número: 15.

E agora, agarra-te à cadeira ! ! !

Lincoln foi assassinado dentro de um teatro de nome "Ford"
Kennedy foi assassinado num carro Ford, modelo Lincoln.

Tanto Booth como Oswald foram assassinados antes de serem apresentados a julgamento.

E, para tornar tudo ainda mais misterioso,

Uma semana antes do seu assassinato, Lincoln esteve em Monroe, Maryland
e uma semana antes do seu assassinato, Kennedy esteve com Marilyn Monroe.

domingo, 10 de junho de 2012

Direito penal politicamente correto

Código Penal para acadêmicos: rígido com o abandono de cães, não com o aborto. Homicídio prescreve; racismo não. Drogas? Caso de saúde. Bullying? Polícia.

Penalistas sempre denunciaram o fato de o legislador criar crimes para atender o clamor público. Mas várias das propostas para um novo Código Penal vêm para atender aos reclamos da intelectualidade.

Por um lado, a comissão diminui a pena daquele que realiza um aborto na gestante e alarga consideravelmente as hipóteses em que se torna lícita tal prática. Por outro, a mesma comissão propõe pena de um a quatro anos para quem abandona um cachorro na rua.

Isso sendo que, atualmente, o abandono de incapaz está sujeito a uma pena de seis meses a três anos.

Não é raro, no ambiente acadêmico, encontrar pessoas que defendem o aborto como política de saúde pública e, ao mesmo tempo, entendem ser crime grave usar ratos como cobaias de laboratório. É uma inversão de valores intrigante.

A questão da discriminação é outro exemplo. Alarga-se significativamente a incidência do direito penal nessa seara, quando, com todo o respeito, ações afirmativas seriam muito mais eficazes.

Nesse sentido, cumpre destacar que já não há qualquer proporcionalidade no fato de o racismo ser imprescritível enquanto o homicídio prescreve. E todos aceitam tal situação como normal...

Foi aplaudida também a proposta de criminalização do Bullying e do tal stalking (perseguição obsessiva), pois é inadmissível alguém ser humilhado.

Os juristas se esquecem de que um pouco de agressividade faz parte do processo de amadurecimento -e que ensinar a criança e o adolescente a respeitarem o outro é papel da família e dos professores, não da justiça penal.

Ademais, os atos de violência que resultam em morte ou lesão grave já são crimes onde quer que ocorram, inclusive na escola.

Criminalizar o Bullying retirará dos pais e dos professores a sua responsabilidade. Para que dialogar? Por que tentar integrar? Basta chamar a polícia.

A esse respeito, é curioso constatar que o mesmo grupo que defende que as drogas são uma questão de saúde traz propostas que implicam dizer que falta de educação é um problema policial.

Paulatinamente, abrimos mão de nossos poderes e deveres em prol de um Estado interventor, que nos dita como ser, pensar e falar. É o império da padronização.

Também é surpreendente a notícia de que a comissão preverá o acordo como solução célere do processo, principalmente pelo fato de, ao ser anunciada a medida, ter sido comemorado o rompimento com o devido processo legal, uma das maiores conquistas democráticas.

Quem conhece a realidade forense sabe que não existe qualquer paridade entre as partes. Como na transação penal, os acordos serão impostos -com a conivência de muitos defensores.

Mesmo que decidamos adotar o instituto da barganha -que, aliás, tem natureza também processual- é necessário, primeiro, um maior amadurecimento.

Por mais que a legislação atual seja falha, não pode ser reformulada a toque de caixa. São Tomás de Aquino já ensinava que só é justificável mudar a lei quando os bônus são maiores que os ônus.

Não é o que se anuncia. Não podemos transformar a lei penal, braço mais forte do Estado, em uma sucessão de bandeiras do politicamente correto. Há medidas menos invasivas e mais efetivas para a concretização de uma sociedade mais solidária.

sábado, 2 de junho de 2012

Paulo Freire é o Patrono da Educação Brasileira... Quem??????

Vocês conhecem alguém que tenha sido alfabetizado pelo método Paulo Freire? Alguma dessas raras criaturas, se é que existem, chegou a demonstrar competência em qualquer área de atividade técnica, científica, artística ou humanística? Nem precisam responder. Todo mundo já sabe que, pelo critério de “pelos frutos os conhecereis”, o célebre Paulo Freire é um ilustre desconhecido. As técnicas que ele inventou foram aplicadas no Brasil, no Chile, na Guiné-Bissau, em Porto Rico e outros lugares. Não produziram nenhuma redução das taxas de analfabetismo em parte alguma. Produziram, no entanto, um florescimento espetacular de louvores em todos os partidos e movimentos comunistas do mundo. O homem foi celebrado como gênio, santo e profeta. Isso foi no começo. A passagem das décadas trouxe, a despeito de todos os amortecedores publicitários, corporativos e partidários, o choque de realidade.
Eis algumas das conclusões a que chegaram, por experiência, os colaboradores e admiradores do sr. Freire: “Não há originalidade no que ele diz, é a mesma conversa de sempre. Sua alternativa à perspectiva global é retórica bolorenta. Ele é um teórico político e ideológico, não um educador.” (John Egerton, “Searching for Freire”, Saturday Review of Education, Abril de 1973.) “Ele deixa questões básicas sem resposta. Não poderia a ‘conscientização’ ser um outro modo de anestesiar e manipular as massas? Que novos controles sociais, fora os simples verbalismos, serão usados para implementar sua política social? Como Freire concilia a sua ideologia humanista e libertadora com a conclusão lógica da sua pedagogia, a violência da mudança revolucionária?” (David M. Fetterman, “Review of The Politics of Education”, American Anthropologist, Março 1986.)
“[No livro de Freire] não chegamos nem perto dos tais oprimidos. Quem são eles? A definição de Freire parece ser ‘qualquer um que não seja um opressor’. Vagueza, redundâncias, tautologias, repetições sem fim provocam o tédio, não a ação.” (Rozanne Knudson, Resenha da Pedagogy of the Oppressed; Library Journal, Abril, 1971.) “A ‘conscientização’ é um projeto de indivíduos de classe alta dirigido à população de classe baixa. Somada a essa arrogância vem a irritação recorrente com ‘aquelas pessoas’ que teimosamente recusam a salvação tão benevolentemente oferecida: ‘Como podem ser tão cegas?’” (Peter L. Berger, Pyramids of Sacrifice, Basic Books, 1974.) “Alguns vêem a ‘conscientização’ quase como uma nova religião e Paulo Freire como o seu sumo sacerdote. Outros a vêem como puro vazio e Paulo Freire como o principal saco de vento.” (David Millwood, “Conscientization and What It's All About”, New Internationalist, Junho de 1974.) “A Pedagogia do Oprimido não ajuda a entender nem as revoluções nem a educação em geral.” (Wayne J. Urban, “Comments on Paulo Freire”, comunicação apresentada à American Educational Studies Associationem Chicago, 23 de Fevereiro de 1972.) “Sua aparente inabilidade de dar um passo atrás e deixar o estudante vivenciar a intuição crítica nos seus próprios termos reduziu Freire ao papel de um guru ideológico flutuando acima da prática.” (Rolland G. Paulston, “Ways of Seeing Education and Social Change in Latin America”, Latin American Research Review. Vol. 27, No. 3, 1992.) 
“Algumas pessoas que trabalharam com Freire estão começando a compreender que os métodos dele tornam possível ser crítico a respeito de tudo, menos desses métodos mesmos.” (Bruce O. Boston, “Paulo Freire”, em Stanley Grabowski, ed., Paulo Freire, Syracuse University Publications in Continuing Education, 1972.) Outros julgamentos do mesmo teor encontram-se na página de John Ohliger, um dos muitos devotos desiludidos (http://www.bmartin.cc/dissent/documents/Facundo/Ohliger1.html#I). Não há ali uma única crítica assinada por direitista ou por pessoa alheia às práticas de Freire. Só julgamentos de quem concedeu anos de vida a seguir os ensinamentos da criatura, e viu com seus próprios olhos que a pedagogia do oprimido não passava, no fim das contas, de uma opressão da pedagogia.
Não digo isso para criticar a nomeação póstuma desse personagem como “Patrono da Educação Nacional”.
Ao contrário: aprovo e aplaudo calorosamente a medida. Ninguém melhor que Paulo Freire pode representar o espírito da educação petista, que deu aos nossos estudantes os últimos lugares nos testes internacionais, tirou nossas universidades da lista das melhores do mundo e reduziu para um tiquinho de nada o número de citações de trabalhos acadêmicos brasileiros em revistas científicas internacionais. Quem poderia ser contra uma decisão tão coerente com as tradições pedagógicas do partido que nos governa? Sugiro até que a cerimônia de homenagem seja presidida pelo ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, aquele que escrevia “cabeçário” em vez de “cabeçalho”, e tenha como mestre de cerimônias o principal teórico do Partido dos Trabalhadores, dr. Emir Sader, que escreve “Getúlio” com LH. A não ser que prefiram chamar logo, para alguma dessas funções, a própria presidenta Dilma Roussef, aquela que não conseguia lembrar o título do livro que tanto a havia impressionado na semana anterior, ou o ex-presidente Lula, que não lia livros porque lhe davam dor de cabeça.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Criaturas do Sol

O Sol exerce uma espécie de efeito alquímico, transformando o humor das pessoas, que vão passar os próximos quatro meses no frio, no sul do Brasil. Ao mesmo tempo, ouvimos relatos de tempestades solares que jogam bilhões de toneladas de plasma no espaço e, volta e meia, sobre a Terra.
Essas ejeções de massa coronal (ou seja, vindas da coroa, a "atmosfera" do Sol) tendem a aumentar em frequência em torno do período chamado de máximo solar, que ocorre a cada 11 anos, aproximadamente. Estamos entrando num desses períodos de intensificação das tempestades solares neste ano.A imagem do Sol como uma plácida bola de fogo no céu não tem nada a ver com a coisa real.
Imagens próximas revelam um verdadeiro inferno, no qual a temperatura na superfície chega a 6.000 graus Celsius, um incessante borbulhar de matéria e campos magnéticos de enorme intensidade.
Tempestades solares nos lembram que não devemos supor que o Sol continuará fazendo o seu trabalho todos os dias, sempre do mesmo jeito, mesmo que tenha sido assim por bilhões de anos.
O Sol irradia por segundo cerca de 400 trilhões de trilhões de watts, isto é, 1 seguido de 26 zeros, equivalente a 100 bilhões de bombas nucleares de um megaton cada. Essa potência toda vem de reações de fusão nuclear que ocorrem no centro do Sol, onde o hidrogênio se transforma em hélio. O Sol, agora em sua meia-idade, está passando por uma fase relativamente estável. Ninguém precisa começar a ter pesadelos achando que será frito amanhã.
Nos seus 4,5 bilhões de anos de vida, o Sol converteu apenas cerca de 5% de sua massa total em hélio.
Com o passar do tempo, mais hidrogênio vai sendo convertido, e a luminosidade solar, isto é, a energia total emitida pelo Sol, também aumenta. Em 1,1 bilhão de anos, a luminosidade será 10% maior e, em 3,4 bilhões de anos, 40% maior. Esse aumento de energia terá sérias consequências para o clima terrestre. Primeiro causando um "efeito estufa úmido", depois um efeito estufa descontrolado. A vida, ao menos como a conhecemos no momento, será impossível aqui.
Dado que a vida era impossível durante o primeiro bilhão de anos de existência da Terra -devido ao incessante bombardeio de cometas e asteroides- vemos que ela só é viável aqui por um período relativamente curto da existência do Sol, correspondendo a só 5 bilhões dos seus 10 bilhões de anos. Cada espécie que viveu e viverá na Terra é um fenômeno passageiro, parte do ciclo de vida e morte do Sol.
Sendo um otimista, tendo a acreditar que, ao vencermos nossos desafios climáticos mais imediatos (ligados aos combustíveis fósseis) e aprendermos com eles, conseguiremos encontrar uma outra casa para os seres vivos da Terra, ao menos para os que sobreviverem ao que andamos fazendo por aqui.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Do Cálculo Renal à Epifania (Obrigado Janer Cristaldo)

Nada se cria, tudo se copia, dizem as gentes. Se existe um campo onde este axioma impera, este campo é o das religiões. A começar pelo judaísmo. Não existe Bíblia sem o Egito, dizia Thomas Römer, especialista em história bíblica. O monoteísmo judaico já está em Akenathon. Com a diferença de que Akenathon teve existência atestada na história. E de Moisés, o patriarca dos judeus, não temos sequer um sinal de sua passagem no tempo. A autoria da Tanak – Pentateuco, para os cristãos – não procede, pois no último dos cinco livros Moisés narra sua própria morte no Deuteronômio. Nem Cristo ousou tanto, deixou este relato para os evangelistas. Freud, em Moisés e a religião monoteísta, faz de Moisés um discípulo de Akenathon que teria se associado aos judeus para ensinar-lhes a religião monoteísta.
Quanto aos cristãos, tiveram ainda mais religião de quem copiar. O Novo Testamento é uma apropriação indébita – para não dizer roubo – do livro dos judeus, acrescido de mitos gregos e do paganismo. A História está repleta de deuses nascidos de virgens e mortos no solstício de inverno. A vasta proliferação de denominações cristãs era tendência já embutida no próprio cristianismo. No Brasil contemporâneo, elas brotam como cogumelos após a chuva e fazem feroz concorrência aos católicos..
Não há religião hoje que não seja uma sopa de religiões antigas. Os tais de neopentescostais, que infestam as cadeias de televisão no mundo todo, são outros que se apossam do Livro a seu modo. O mesmo fizeram os espíritas. Hippolyte Léon Denizard Rivail, mais conhecido como Allan Kardec, misturou evangelhos com a teoria do magnetismo animal do austríaco Franz Anton Mesmer e construiu sua ficção. Mesmer era médico, estudava teologia e retomou a antiga picaretagem da imposição das mãos. Curiosamente, Kardec, que é francês e está sepultado no Père Lachaise, em Paris, é praticamente desconhecido em seu país. Sua tumba está sempre cheia de flores, colocadas geralmente por brasileiros.
Há algum tempo, recebi notícias de uma amiga que há décadas não via. Para minha surpresa, revelou-se espírita e umbandista. Profundo mistério. Sempre entendi o espiritismo como uma religião de origem francesa, inspirada nas teorias de Mesmer, e a umbanda como um culto animista de origem africana. Não via como alguém podia assumir coisas tão díspares. Saí então a pesquisar. E descobri coisas que, como a jaboticaba, só ocorrem no Brasil. Segundo J. Alves Oliveira, em Umbanda Cristã e Brasileira, no dia 15 de novembro de 1908, o Caboclo das Sete Encruzilhadas se manifestou numa sessão espírita kardecista em Neves, São Gonçalo, município fluminense próximo ao Rio, então capital federal. “Foi um escândalo" – escreve Matinas Suzuki, na Folha de São Paulo -. “Embora haja indícios de incorporações de espíritos de índios e de escravos negros nas diversas formas de macumba que existiam no Rio de Janeiro do século 19, os kardecistas não os admitiam por considerá-los espíritos marginais e pouco evoluídos. Quem recebeu o caboclo indesejado, e logo em seguida o preto-velho Pai Antônio, foi Zélio Fernandino de Moraes, um rapaz de 17 anos que se preparava para entrar para a Escola Naval”.
O achado do Zélio Fernandino parece ter vindo de encontro a alguma inconsciente aspiração brasílica e fez escola. Assim como os católicos se apossaram do livro judaico, os umbandistas reivindicaram para si o mediunismo, trouvaille de Allan Kardec. Segundo Alves Oliveira, o caboclo teria assim se revelado: "Se julgam atrasados esses espíritos dos pretos e dos índios [caboclos], devo dizer que amanhã estarei em casa deste aparelho [o médium Zélio de Moraes] para dar início a um culto em que esses pretos e esses índios poderão dar a sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou".
O espiritismo então abrasileirou-se, para desalento de seus mentores europeus. Contei então a história do Zélio Fernandino à minha amiga. Que a desconhecia totalmente. Ou seja, nem sabia como se havia operado a fusão de duas religiões em seu cerebrinho. A lambança é tal que já há centros orixás da umbanda, santos católicos e retratos de pregadores do Santo Daime posicionados em lugares estratégicos dos terreiros. E já existe inclusive o umbandaime, que promove a mistura entre a doutrina do daime com a religião afro-brasileira.O Santo Daime desbundou. É um culto sem pé nem cabeça, criado por um seringueiro da Amazônia, cujas cerimônias consistem na ingestão da ayahuasca, beberagem feita de um cipó, que produz vômitos e diarréias, as chamadas “peias”. A nova empulhação cultua o Cristo, a Virgem... e a floresta amazônica, ecologia oblige. Pelo jeito, as tais de peias não eram muito convincentes a ponto de por si só arrebanhar acólitos. O Santo Daime então adaptou-se. Assumiu elementos de hinduísmo, umbanda e hare krishna. Deus para todos os gostos. Aqui pertinho de São Paulo, em Nazaré Paulista, a escola espiritual tem dois gurus, um tal de Sri Prem Baba, o mestre da cerimônia, que pelo jeito é tupiniquim com nome indiano para melhor enganar. Mais o guru Sri Hans Raj Maharaji, que vive na Índia, mas já apita no Santo Daime. Mais o sedizente mestre Raimundo Irineu Serra, seringueiro brasileiro neto de escravos, que morreu em 1971, e teria sido o fundador da doutrina do chá de cipó.
São Paulo, com a maior clientela de crentes potenciais do país, é um semental de novas fés. Outro dia, zapeando na internet, descobri uma nova igreja, a bereana. E porque bereana? Porque em Atos está escrito: “E logo, durante a noite, os irmãos enviaram Paulo e Silas para Beréia; ali chegados, dirigiram-se à sinagoga dos judeus. Ora, estes de Beréia eram mais nobres que os de Tessalônica; pois receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram, de fato, assim”. A palavrinha se repete só mais duas vezes e já deu origem a uma igreja. Afinal os judeus de Beréia era mais nobres que os de Tessalônica. E mais nada sabemos de Beréia. Mas quando descobri a nova crença – há coisa de uma semana – as igrejas já eram três: temos a Igreja Evangélica Bereana, a Batista Missionária Bereana e a Adventista Bereana. Com tantos pastores proclamando a independência, a igreja deve ser das mais lucrativas..
E as religiões continuam saltando como pipocas na panela. Em 11 de novembro do ano passado foi criada a Igreja Templária de Cristo na Terra. Seus adeptos seriam nada menos que a reencarnação dos Cavaleiros Templários, braço militar da Igreja Católica formado por monges com voto de pobreza que aceitaram a tarefa de proteger os cristãos dos muçulmanos. De novembro para cá, são apenas seis meses. E a novel igreja já tem um primeiro-ministro, quatro bispos, 20 ministros e 560 mestres, cada qual encarregado de cuidar de 70 fiéis. Walter Sandro Pereira da Silva, o apóstolo fundador, vive “uma vida simples”, em uma casa em São Bernardo do Campo (o “solo sagrado”), com nove dos ministros, sua mãe e cerca de 80 cães e gatos – a igreja tem como tarefa tirar animais da rua.
Quem nos conta é Willian Vieira, repórter da CartaCapital. Com 70 fiéis para 560 mestres, temos 39.200 seguidores. Tudo isso em seis meses, o que dá mais de 6.500 adeptos por mês. O que dá mais de 1.600 conversões por semana. Mais de 230 por dia. Mesmo sentado à mão direita do Pai, o Cristo – que, após três anos de pregação, mal teve um gato pingado para acompanhá-lo ao monte Calvário – deve estar se roendo de inveja.
Walter Sandro, pernambucano pobre de Gravatá, descobriu cedo sua missão. Tinha 2 anos e meio e procurava desesperado a chupeta perdida, quando o Arcanjo Miguel veio em seu auxílio pela primeira vez. “Foi quando apareceu este ser dizendo que ela estava debaixo da cama e que eu devia procurar o Salmo 91.” Quando os pais encontraram o pequeno, ele tinha a chupeta na boca e a Bíblia na mão: milagre. “Nenhum mal te sucederá, nem praga alguma chegará à tua tenda. Porque aos seus anjos dará ordem a teu respeito, para te guardarem em todos os teus caminhos”, dizia o premonitório texto bíblico.
Walter Sandro veio para São Paulo bebê e só voltou a falar com o arcanjo aos 13 anos, quando foi visitar sua cidade natal. Miguel disse-lhe que deveria pregar. Virou evangélico. Anos depois, quando começou a vender seguros, descobriu o dom da retórica e passou a dar palestras motivacionais: deixe de fumar, emagreça, conquiste o amor.
A epifania mesmo só ocorreu em novembro passado, quando Walter Sandro estava prestes a entrar no ar pelo canal UHF 58. Um novo milagre se deu. “O Arcanjo Miguel materializou-se e disse para eu abrir a igreja. Foi tão forte que tive uma crise de cálculo renal. Fui ao banheiro e ele veio e disse pra botar a mão na urina. Eu pus. E saiu uma pedra do tamanho de meio grão de feijão.” À meia-noite o programa foi ao ar já com o nome de Igreja Templária. As reuniões começaram como uma espécie de maçonaria, que aos poucos incorporou doses de Reiki, ioga e passe espírita. Uma pitada de Oriente, outra de espiritismo. Jogue tudo num caldo de cristianismo, misture e agite bem. Está criada uma nova religião.
Com apenas seis meses de existência, além do prédio na Rua Leais Paulistanos, a igreja tem sedes no Rio de Janeiro, no Espírito Santo e em Minas Gerais. É mantida pelo “Carnê da Gratidão”, um boleto com depósito de 33 reais em uma conta do Banco do Brasil. “A pessoa não paga. Ela doa.” E ganha, de quebra, o número do celular de um dos mestres para ligar quando quiser, todo dia até as 2 da manhã. “Qual seu problema? Bem, às vezes Deus não cura agora para testar sua fé”. Vinte pessoas se revezam em três turnos para atender 3 mil ligações por dia no telemarketing. Se tudo der certo e o arcanjo ajudar, em breve a igreja terá seu canal UHF (que custou 120 mil reais) para levar, “em cadeia nacional”, a mensagem do fim do preconceito. “Nós não temos nenhum.” Você está desempregado e o mercado não está para peixe? Crie uma religião. É aposta segura. Nenhum outro ramo do trabalho lhe proporcionará tais retornos em apenas meio ano.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Paradoxos

Tem duas coisas que não batem com a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies. Uma é o altruísmo, que desmente a tese de que a seleção natural se faz pela competição entre genes egoístas. Outra é o veneno, que desmente a tese de que os bichos desenvolvem seus mecanismos de ataque e defesa na luta pela sobrevivência, já que o bicho venenoso é venenoso desde os seus primeiros ancestrais e portanto já nasce pronto para a guerra química.
As formigas e as abelhas são os exemplos mais conhecidos de bichos sociais com um comportamento altruísta. Nascem com sua função e seu destino já programados e estes podem incluir o sacrifício do indivíduo pelo grupo. O próprio Darwin reconheceu o paradoxo do altruísmo, que intrigou a ciência durante muito tempo – tanto tempo que só na metade do século 20 começaram a estudar o fenômeno a sério.
Se, segundo Darwin, você, eu e a minhoca estamos no mundo para obedecer o nosso gene egoísta e sobreviver para poder transmiti-lo a nossa prole, como se explica o comportamento altruísta de espécies inteiras?
Uma explicação fascinante que surgiu é assim: nossa missão na vida é transportar o DNA que recebemos dos nossos pais, que receberam dos nossos avós e assim por diante, desde as primeiras amebas da família.
Tudo o que somos e o que fazemos, nossa biografia, nossos amores e vexames, nossos sonhos e brotoejas – nada disso interessa ao DNA. Ele só está nos usando como transporte. Quer segurança e quer ser passado adiante com eficiência, e o mínimo que espera de nós é que sejamos bons reprodutores para ele não perder a viagem.
E em comunidades endógamas como as das formigas e das abelhas, onde todo o mundo é irmão ou no máximo primo, os DNAs se parecem. Existe até o que poderia ser chamado de um DNA coletivo. Assim, os altruístas não estão renunciando à sua missão. Estão assegurando que o DNA do grupo será passado adiante, com seu sacrifício. É o determinismo darwiniano funcionando por outros meios.
A teoria do DNA coletivo não é universalmente aceita entre os biólogos, mas, que eu saiba, não apareceu outra tão razoável. Formigueiros e colmeias são exemplos inspiradores de altruísmo e divisão de tarefas, muito citados como modelos para a humanidade, mas é bom não esquecer que se trata de monarquias não-parlamentares e escravocratas – e ainda por cima matriarcados!
Quanto aos bichos venenosos, nada os explica. Só uma teoria da maldade intrínseca, de um mau caráter nato e entranhado. É inimaginável que sua espécie tenha desenvolvido seu poder peçonhento como outros animais desenvolveram carapaças ou disfarces para se proteger de predadores ou enganar presas.
Os venenosos não produzem seu veneno num processo de tentativa e erro, o que os enquadraria no grande drama da competição em que os bichos, através dos séculos, vão aperfeiçoando as suas armas para a sobrevivência.
Nunca precisaram testar o produto da sua alquimia interna – este veneno mata em segundos, este só paralisa, etc - antes de usá-lo. Já nascem sabendo o que podem. O que explica aquela empáfia da primeira serpente da Terra, na sua representação bíblica. Ela se sabia o Mal irresistível, e conhecia todos os seus próprios venenos. Que viesse a seleção natural do Darwin – ela estava pronta

sábado, 5 de maio de 2012

Estaria o Sexo Liberado na Fundação Casa - A Antiga Febem?


A partir de abril deste ano, os adolescentes infratores internados nas unidades da Fundação Casa terão direito à visita íntima, desde que comprovem ter uma união estável.
A nova Lei Federal (nº 12.594) regula as visitas íntimas para os adolescentes.
Para ter o benefício, o infrator deve comprovar à Justiça que tem uma união estável (namoro ou casamento).
Em entrevista concedida pela presidente da Fundação Casa, Berenice Giannella, disse que a liberação da visita íntima para o adolescente é parte do processo de ressocialização.
“Antes não era permitido nem visitas dos parceiros ao menor, hoje já é. A visita íntima contribui com o retorno social, com o vínculo familiar que deve ser mantido dentro da Fundação. É preciso que essa medida não seja vista de forma vulgarizada e sim como uma medida socioeducativa”, declara a presidente.
Ainda, segundo Berenice, o Estado e a Fundação estudam projetos sobre como será aplicada a lei. “Estamos avaliando questão de salas, como informar melhor ao interno, a aplicação da lei em si e os métodos de prevenção e educação sexual que devem ser ainda mais reforçados”.
Alguns ditos especialistas avaliaram a medida como positiva para a reeducação do menor infrator, estreitando seus laços familiares.
O que avaliamos é que de fato o estado passa a fazer uma concessão absurda aos menores infratores, não apenas por permitir que internos da Fundação Casa obtenham o direito impensável, bem como se cria mais um enorme problema para o Estado, possibilitando não apenas “um lazer” descabido, como o que é muito mais grave, a concepção de bebês sem qualquer estrutura familiar.
Não nos parece razoável o Estado patrocinar relações sexuais entre jovens sem qualquer estrutura socioeconômica e estimular a formação de mais famílias desestruturadas.
Ressocialização não se faz através de medidas de liberdade “mal” assistida, saídas provisórias (dia das mães, natal, etc.), abrindo às portas de nossos presídios e instituições, permitindo à saída às ruas de pessoas de extrema periculosidade.
O estreitamento dos vínculos familiares não deve ser confundido com as necessidades fisiológicas dos jovens internos.
Seria muito mais eficaz, se nossas instituições fizessem um trabalho efetivo com as famílias dos internos, objetivando a melhora dessas relações, ao invés de patrocinar a gravidez entre jovens adolescentes.
Além disto, a pretensão do legislador e “especialistas” de tratar o menor como adulto para efeitos de suas necessidades fisiológicas deveria ser estendido para a responsabilização do menor por seus crimes (atos infracionais).
Algumas questões que o legislador e toda a sociedade devem capitular:
- Por que nosso legislador insiste em usar dois pesos e duas medidas?
- Por que o menor deve ser tratado como criança quando estamos falando de crimes graves cometidos e como adulto para poder ter encontros amorosos?
- É razoável o que dizem os “especialistas” e legisladores quando entendem ser uma relação estável, um jovem de 14 anos que tenha uma namorada?
- Será que os pais de uma jovem, menor de idade, que vá a Fundação Casa para um encontro sexual estão de acordo com isto?
A legislação determina que, para um menor de idade casar, faz-se necessário que seja emancipado.
Então perguntamos, não seria o caso deste menor, que para poder fazer sexo, se diz casado ou em união estável ser emancipado e, portanto responder criminalmente como maior de idade? Ou ele apenas será tratado como maior para efeitos sexuais?

domingo, 1 de abril de 2012

ANTES DO BIG BANG

Como escreveu Milan Kundera, "as únicas perguntas sérias são aquelas que até uma criança pode fazer". Dentro desse espírito, hoje olharemos para algumas dessas perguntas sobre o Universo.
O modelo do Big Bang usa observações para concluir que o Universo originou-se há 13,7 bilhões de anos e que vem se expandindo e esfriando desde então. Essa afirmação não é uma crença. Ela se baseia em evidências concretas. O princípio da ciência é "ver para crer" e não vice-versa.
Sabemos que o Universo está em expansão pois, ao medirmos a luz de galáxias distantes, vemos que ela é desviada em direção a maiores comprimentos de onda, como prevê o efeito Doppler. Imaginando a luz como uma onda (ou o fole de um acordeão), a expansão implica na maior separação entre os picos, causando mudanças na luz que é medida na Terra.
Essa expansão é uma dilatação do próprio espaço. Galáxias não são como os detritos de uma bomba que explodiu. Caso fossem, o Universo teria um centro onde tudo começou. Pelo contrário, todos os pontos no Cosmo são importantes, como na superfície de uma bola.
Imaginando as galáxias como moedas coladas à bola, quando ela infla, um observador em uma galáxia verá todas as outras afastando-se dele. Mas outros observadores em outras galáxias verão a mesma coisa: nenhum é mais central que os outros. Nosso Universo é assim, mas em três dimensões (a superfície da bola tem duas dimensões).
Mas se o Universo está se expandindo, o que há do lado de fora?
A confusão vem de vermos a expansão cósmica como uma bola imersa no espaço à sua volta. Vendo a superfície da bola como um Universo em duas dimensões, tudo o que existe é a superfície e nada mais: a bola infla e crescem as distâncias entre as moedas (as galáxias). Nada existe, ou precisa existir, do "lado de fora". O espaço nasce e cresce com a expansão.
A coisa é mais sutil pois, devido à velocidade da luz, só podemos ver até uma certa distância. Nosso "horizonte" chega a uns 42 bilhões de anos-luz, distância percorrida pela luz em 13,7 bilhões de anos. (Seriam 13,7 bilhões de anos-luz se o Universo não estivesse em expansão, mas a luz pega carona com a dilatação do espaço e viaja três vezes mais longe.) Portanto, pode haver bastante espaço "lá fora", além do horizonte, também em expansão.
Porém, ao voltarmos no tempo, a "bola" fica menor e as galáxias se apertam. O calor aumenta e a matéria se dissocia em seus constituintes básicos: de moléculas a átomos e, depois, outras partículas. Rapidamente, chegamos a uma época em que as energias estão além do que podemos testar em laboratório.
O que ocorreu no começo? Há duas escolas: uma afirma que o Universo, como uma bolha em uma sopa fervendo, surgiu de uma flutuação submicroscópica, e que só então, quando a energia dessa bolha espacial transformou-se em matéria, o tempo começou. Não existia um "antes" pois não existia mudança alguma para ser quantificada.
Outra diz que o Universo é parte de um multiverso eterno, entidade em que todos os universos possíveis coexistem. O fascinante é que essa hipótese pode até ser verdadeira. Mas não sabemos como testá-la.

domingo, 11 de março de 2012

DENTRO DE CASA - J. R. GUZZO ( REVISTA VEJA )

Uma das melhores decisões que o atual governo tomou na área da educação, on talvez em qualquer área, foi a criação, no ano passado, de um programa de bolsas de estudo em universidades estrangeiras para estudantes interessados em aperfeiçoar seus conhecimentos depois de formados no Brasil. Não se trata de mandar gente para Cuba, Moçambique ou coisa parecida; as bolsas se destinam a cursos em universidades dos Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, França e Itália, nas quais se oferece hoje, de modo geral, o ensino superior mais avançado do mundo. Também não servem para quem queira estudar movimentos sociais, direção de cinema ou gastronomia sustentável. As bolsas, aqui, são reservadas exclusivamente para coisas que têm a ver com a vida real da produção matemática, física, biologia, química e, num segundo momento, áreas como tecnologia mineral, petróleo, gás natural e outras disciplinas científicas. O Brasil, no momento, tem uma necessidade desesperada de profissionais com alta qualificação em tudo isso, Um vasto leque de atividades essenciais para uma economia moderna depende diretamente deles -sem a sua presença nas empresas, sejam elas privadas ou esfaz imaginar, o número de alunos diplomados ao fim dos cursos está diminuindo, ao invés de aumentar. Tudo bem, portanto, até aí; mas só até aí. Esta mos no Brasil o no Brasil, é bom lembrar, o governo consegue errar mesmo quando acerta. No caso, está deixando uma parte de sua máquina desmanchar o que outra faz de bom: ao mesmo tempo em que paga para jovens brasileiros aprimorarem seus conhecimentos científicos e tecnológicos nas melhores universidades estrangeiras, empenha-se ao máximo para dificultar, depois que voltam ao Brasil, o reconhecimento dos títulos que obtiveram no exterior. Não é isso que o governo, no seu comando supremo, quer. Mas é o que acontece. Como o jornal O Estado de S. Paulo relatou em artigo recente, as autoridades educacionais encarregadas de validar os diplomas dos bolsistas dedicam-se, na prática, a um trabalho de sabotagem permanente contra eles e, naturalmente, contra o público que está pagando a conta. Há exigência da mesma carga horária que teriam nas universidades brasileiras, "das mesmas disciplinas e currículos, do mesmo esquema de avaliação de teses, de traduções juramentadas e de documentos expedi dos por consulados". A Universidade de Brasília, uma das encarregadas de fazer o reconhecimento de títulos, só examina, em cada setor de estudo, seis casos por semestre. E comum o bolsista esperar um ano ou mais pela validação. Se fez seus estudos numa universidade americana, as coisas podem ficar ainda piores. Em todo o sistema o que prevalece é a hostilidade ao mérito individual, a ditadura do carimbo, a ideologia boçal que separa o conhecimento científico entre o nacional, bom e popular, e o estrangeiro, ruim e elitista.
Essa história das bolsas é mais uma demonstração , brasileiras ou multinacionais que operam no país, simplesmente não é possível executar uma infinidade de novos projetos na indústria, infraestrutura, agricultura, exploração de recursos naturais e virtualmente qualquer área do universo produtivo. Investimentos ficam bloqueados. Perde-se espaço para os competidores estrangeiros. Sofrem a criação de empregos, a melhoria de renda e a arrecadação de impostos. A iniciativa é um belo exemplo de como utilizar com respeito, inteligência e eficácia o dinheiro público, que pagará diretamente 75% de todas as despesas do programa; é investimento certo, com retorno certo e na hora certa. Serviria, quem sabe, como um contrapeso para as informações desanimadoras que acabam de sair das universidades brasileiras -ao contrário do que a propaganda oficial demonstração, entre tantas, do abismo que separa, dentro do governo brasileiro, as intenções dos resultados e mais uma prova da impotência generalizada dos que mandam em relação aos que executam. Decidir bem, como todo mundo sabe, já é uma luta. Tudo fica muito mais complicado, obviamente, se os encarregados de executar as decisões não se interessam em cumpri-las. E o que vive acontecendo. Executam mal, ou executam devagar, ou simplesmente não executam -mesmo porque, muitas vezes, devem seguir regras que não lhes permitem praticar as ordens que recebem. O que se tem, ao fim da linha, é simples: quanto mais a alta autoridade manda, tanto menos a baixa autoridade obedece. O verdadeiro inimigo a vencer está dentro de casa.

sábado, 10 de março de 2012

FUNDAMENTOS DO ATEÍSMO

Já que duas personalidades, Ives Gandra Martins e Daniel Sottomaior, se engalfinharam em polêmica acerca de um suposto fundamentalismo ateu, aproveito para meter o bedelho nessa intrigante questão.
Não se pode chamar de fundamentalista quem exige provas antes de crer. Aqui, o alcance do ceticismo é dado de antemão: a dúvida vai até o surgimento de evidências fortes, as quais, em 2.000 anos de cristianismo, ainda não apareceram.
Ao contrário, dogmas vão contra tudo o que sabemos sobre o mundo. Virgens não costumam dar à luz e pessoas não saem por aí ressuscitando. Em contextos normais, um homem que veste saias e proclama transformar vinho em sangue seria internado. Quando se trata de religião, porém, aceitamos violações à física e à lógica. Por quê?
Ou Deus existe e espera de nós atitudes exóticas -e inconsistentes de uma fé para outra-, ou o problema está em nós, mais especificamente em nossos cérebros, que fazem coisas esquisitas no modo religioso.
Fico com a segunda hipótese. Corrobora-a um número crescente de cientistas que descrevem a religiosidade ou sua ausência como estilos cognitivos diversos. Ateus privilegiam a ciência e a lógica, ao passo que crentes dão mais ênfase a suas intuições, que estão sempre a buscar padrões e a criar agentes.
Posta nesses termos, fé e ceticismo se tornam um amálgama de influências genéticas e culturais difícil de destrinchar - e de modificar.
Como bom agnóstico liberal, aplaudo avanços no secularismo, já que contrabalançam o lado exclusivista das religiões, que não raro degenera em violência e obscurantismo. Mas, ao contrário de colegas ateus mais veementes, acho que a religião, a exemplo do que se dá com filatelia, literatura e sexo, pode, se bem usada, ser fonte legítima de bem-estar e prazer.

quarta-feira, 7 de março de 2012

OBJETOS DE ARTE: TABAQUEIRA COM CAMAFEU (C.1780/1810)

O uso do tabaco, assim como aconteceu com outros hábitos adotados pelo homem, levou a várias manifestações nas artes plásticas. Em pintura, em escultura, em fotografia, no cinema, etc.
A criatividade e a beleza se uniram ao lado prático. Os que mascavam as folhas de tabaco puderam contar com lindas facas para picar o fumo, potes para guardar as folhas, caixas e bolsas de incrível beleza.
O uso do rapé possibilitou a criação, na China, de pequenas garrafas para guardar o tabaco seco e moído, enquanto que no Ocidente davam preferência às caixas de rapé, ou tabaqueiras. Porém nos dois lados do mundo artesãos e ourives se esmeraram na criação de lindos objetos, cuja beleza intrínseca ou história de uma época ou momento, hoje encantam os visitantes dos museus.
A beleza não era o único elemento a atrair o comprador desses objetos. Era necessário que fossem fáceis de carregar e de manusear. Como era hábito caro ao qual só os ricos tinham acesso, era natural que fossem feitas em materiais nobres e que a decoração fosse importante.
Mas o fator principal era que a tabaqueira fosse à prova de vazamentos e que mantivesse o rapé em boas condições.
A caixa que mostramos hoje é um dos mais perfeitos exemplos: une beleza à eficiência, pois fica hermeticamente fechada, o que podia conservar o fumo seco e perfumado. É criação de Neuber (1736/1808), um ourives que aprendeu seu ofício com o sogro, Heinrich Taddel, famoso ourives saxão.


Neuber se especializou em criar objetos onde misturava pequenos pedaços de pedras duras, ou semipreciosas, como mármore, jade, ágata, ônix, alabastro, e outras, cortados e lapidados com muita criatividade, e inseridos no ouro, o que formava lindos mosaicos que mais pareciam pinturas. O desenho podia variar, mas o comum eram formas geométricas que aproveitavam a beleza das inúmeras cores dessas pedras. A técnica, italiana, data de 1500 e atingiu seu auge em Florença
No início do século XIX surgiu a moda de exibir nas tampas das tabaqueiras miniaturas ou camafeus. A caixa em ouro e pedras duras feita por Neuber em c.1780, apresenta um detalhe curioso: por volta de 1810 recebeu um camafeu, obra do gravador romano Nicolò Morelli (1771/1838.
O camafeu, em marfim, representa a cabeça de Minerva. Ao que parece, o dono da caixa queria estar na moda, mas não queira se desfazer de um objeto cuja eficácia já comprovara.
Acervo Museu Britânico.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Dia Internacional da Mulher

Existem pessoas frágeis, mas sexo frágil, esqueça. As mulheres nunca estiveram tão fortes, decididas, abusadas até. O que é saudável: quem não busca corajosamente sua independência acaba sobrando e vivendo de queixas. Uma sociedade de homens e mulheres que prezam sua liberdade e atingem seus objetivos é um lugar mais saudável para se viver. Realização provoca alegria.
O que não impede que prestemos atenção no que essa metamorfose pode ter de prejudicial. As mulheres se masculinizaram, é fato. Não por fora, mas por dentro. As qualidades que lhes são atribuídas hoje, e as decorrentes conquistas dessa nova maneira de estar no mundo, eram atributos considerados apenas dos homens. Agora ninguém mais tem monopólio de atributo algum: nem os homens de seu perfil batalhador, nem as mulheres da sua afetividade. Geração bivolt. Homens e mulheres funcionando em dupla voltagem, com todos os atributos em comum. Mas seguimos, sim, precisando uns dos outros – como nunca.
Não são poucas as mulheres potentes que parecem conseguir tocar o barco sozinhas, sem alguém que as ajude com os remos. Mas é só impressão. Talvez não precisem de quem reme com elas, mas há em todas elas uma necessidade ancestral de confirmar a fêmea que invariavelmente são.
E isso se dá através da maternidade, do amor e do sexo. Se não for possível ter tudo (ou não quiser), ao menos alguma dessas práticas é preciso exercer na vida íntima, caso contrário, virarão uns tratores. Muito competentes, mas com a identidade incompleta.
A virilização da mulherr é interessante em muitos pontos, mas se tornará brutal se chegarem ao exagero de declarar guerra aos seus instintos.
Ok, ser mãe não é obrigatório, ter um grande amor é sorte, e muitas mulheres fazem sexo apenas para disfarçar o desespero da solidão, mas seja qual for o contexto em que se encontrarem é importante seguir buscando algo que as conecte com o que lhes restou de terno, aquela doçura que cada mulher sabe que ainda traz em si e que deve preservar, porque não se trata de uma fragilidade paralisante, e sim de uma característica intrínseca ao gênero, a parte delas que se reconhece vulnerável e que não precisa se envergonhar disso. Se é igualdade que a mulher quer, extra, extra: homens também são vulneráveis.
“Cuida bem de mim”, dizia o refrão de uma antiga música do Dalto, e que Nando Reis regravou recentemente. Cafona? Ora, se a mulher não se desfizer da prepotência e não se permitir um tantinho de insegurança e delicadeza, a construção desta “nova mulher” terá se desviado para uma caricatura. A intenção não era a mulher se transformar no estereótipo de um homem, era?
Cuide-se bem, e permita que os outros lhe cuidem também. Viva o dia internacional dessa porção mulher que anda resguardada demais, mas que não deveria ficar assim tão escondida: não a desmerece em nada.

O Amor

Não me venha Vinicius com essa história de amor infinito enquanto dure... se é infinito é também eterno.
Não me venha Drummond com essa história de o primeiro amor passou... se passou não era amor.
Não me venha Rachel de Queiroz dizer que o amor começa a morrer no dia que nasce, o amor não é apenas uma célula (ou, como diria Deleuze, são organismos que morrem, não a vida).
Não me venha Gautier dizer que só a arte é eterna, nenhuma arte se constrói fora do amor.
Não me venham tantos outros falar do amor verdadeiro, amor falso não é amor.
O que o meu coração se lembra todas as manhãs são as palavras do mais sábio de todos os homens, Salomão, que escreveu: "As muitas águas não podem apagar este amor, nem os rios afogá-lo; ainda que alguém desse todos os bens de sua casa pelo amor, certamente o desprezariam."
O que meus poros exalam em todos os momentos são os versos de Becquer:

Podrá nublarse el sol eternamente;
Podrá secarse en un instante el mar;
Podrá romperse el eje de la tierra
Como un débil cristal.
¡todo sucederá! Podrá la muerte
Cubrirme con su fúnebre crespón;
Pero jamás en mí podrá apagarse
La llama de tu amor.

E todos os dias seu amor, enche a minha mente de poesia, mas o que é poesia mesmo??

¿Qué es poesía?, dices mientras clavas
en mi pupila tu pupila azul.
¿Qué es poesía? ¿Y tú me lo preguntas?
Poesía... eres tú.

Obrigado por me dar essa certeza o tempo todo.

sexta-feira, 2 de março de 2012

O BIG BANG É UM MAL-ENTENDIDO

 

Site Geografia Hoje – Publicado na Revista Superinteressante



Hubert Reeves, um dos mais instigantes astrofísicos da atualidade, diz que a ciência não sabe como o Universo surgiu: `Ela nem sabe se o Universo teve uma origem^. Para ele, a Grande Explosão é só uma metáfora sobre o estado de Cosmo há cerca de 15 bilhões de anos.
O lançamento de um telescópio espacial e a construção de um anel subterrâneo para o choque de partículas subatômicas têm mais em comum do que a vista alcança: astrônomos, de um lado, e físicos, de outro, todos querem à sua maneira enxergar o Universo como era há uns 15 bilhões de anos, quando surgiu de uma explosão cósmica. Surgiu? Explosão? De repente, o Big Bang, uma das idéias científicas mais elegantes do século XX, sucesso de público e de crítica, começa a ser duramente questionado. Nada prova que o Universo tenha surgido, dizem os novos céticos. E, se surgiu, nada prova que tenha sido de uma explosão.
Nesse fascinante debate, uma voz ocupa cada vez mais o centro das atenções. Trata-se do astrofísico franco-canadense Hubert Reeves, 67 anos, doutor em Física pela Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, ex-conselheiro científico da NASA e diretor de pesquisa do renomado Centro Nacional de Investigações Científicas (CNRS), em Paris. De aparência frágil, embora seu esporte preferido seja esquiar, e temperamento afável, embora não se recuse à polemica. Reeves cultiva uma barba bíblica e uma louvável atitude de humildade cientifica. Conhecido divulgador de obras de ciência, dedicou "a todas as pessoas maravilhadas com o mundo" um de seus livros editados no Brasil, Um pouco mais de azul (1986). O outro é A hora do deslumbramento (1988). 

- Hoje em dia, não é só aos homens de fé, mas, sobretudo aos homens de ciência, que se pergunta a respeito das grandes questões existenciais. Principalmente àqueles, como o senhor, que buscam encontrar nossas origens nas estrelas. Será que a Astrofísica quer se impor como uma nova metafísica?
 - Nem seria preciso. Se desde alguns anos os astrofísicos tornaram-se freqüentemente ouvidos sobre questões religiosas, se tanto as pessoas se perguntam qual o lugar do homem no Universo, talvez seja simplesmente porque tomamos consciência da nossa fragilidade e da do nosso planeta. Mas não se deve esquecer que ciência e religião percorrem campos muito diferentes: a primeira se pergunta como o mundo é feito: a segunda, como viver nossa vida de homens. Elas podem se esclarecer mutuamente, mas desde que cada uma permaneça em seu território. De rosto, sempre que a Igreja tentou impor sua explicação do mundo resultou um conflito. Lembrando-nos de Galileu e de Darwin.
- Não obstante, a religião católica parece aceitar bem atualmente as proposições da Astrofísica, a famosa teoria do Big Bang, por exemplo.
- Sim. Talvez porque se fez do Big Bang uma nova mitologia, identificando-o à criação bíblica do mundo, o Fiat Lux (Faça-se a luz).
- Mas como não fazer a aproximação? No princípio era o Big Bang, uma formidável explosão de luz, a 15 bilhões de anos, dando origem no Universo. Não é o que dizem os astrofísicos?
- Não. Não podemos afirmar que o Big Bang seja a origem do Universo.
- Mas é o que os senhores vêm repetindo há anos.
- Eu sei. Provavelmente nós nos exprimimos mal e fomos também mal compreendidos. Hoje a ciência de modo algum pode afirmar que conhece a origem do Universo. Ela nem sequer sabe se o Universo teve uma origem. Falar de um começo implica obrigatoriamente a idéia de que antes desse acontecimento não havia nada. Ora, isso não sabemos.
- Se assim é, se o Big Bang não é a Origem, o que quer dizer afinal essa expressão?
- Ela designa o estado em que se encontrava o Universo há 15 bilhões de anos, eis tudo. Ou seja, a época mais longínqua que nossos meios atuais permitem alcançar. Somos como exploradores diante de um oceano: não sabemos se existe algo além do horizonte. Com efeito, o Big Bang não representa os limites do mundo, mas unicamente os limites dos nossos conhecimentos. Tudo o que sabemos é que há 15 bilhões de anos o Universo era muito diferente do atual: era extremamente quente — bilhões cie graus —, muito denso e desorganizado. Evidentemente, nada de vida, nada de estrelas, nada de galáxias. Nada de moléculas, nada de átomos, nada mesmo de núcleos atômicos. Apenas uma sopa gigantesca, um purê de partículas elementares: elétrons, fótons (ou seja, pequenos grãos de luz) e também quarks e neutrinos, os futuros constituintes dos átomos. Numa palavra, o caos.


- Como se sabe disso?


- Graças às descobertas da Física e da Cosmologia. Um primeiro grande princípio foi enunciado por Galileu. Antes dele, acreditava-se que existiam dois mundos: o nosso, cambiante e perecível: e o outro mundo, situado além da -Lua, imutável e eterno. -Não obstante, a Lua tem montanhas como a Terra'', constatou Galileu. O que sugere que ambas são astros que fazem parte de um mundo único e que este é regido pelas mesmas leis. É uma descoberta fundamental aquela que Newton enunciará por sua vez: as leis da Física se aplicam tanto à Terra quanto ao Universo inteiro. Graças a esse principio, desde o século XVIII foi possível, por exemplo, estudar o espectro atômico das estrelas e hoje simular as forças do Universo nos grandes aceleradores de partículas. Agora, existem provas de que as constantes universais, como a velocidade da luz ou a massa de um elétron, não variam há bilhões de anos.


- Que provas são essas?


- Ao contrario dos historiadores que jamais poderão contemplar Roma Antiga, os astrofísicos podem verdadeiramente ver o passado. Na escala do Universo, a luz não viaja tão depressa assim. Um telescópio é uma maquina de voltar atrás no tempo: permite observar astros muito longínquos como os quasares, cuja luz levou 12 bilhões de anos para nos alcançar, astros que não existem mais hoje.


- Quer dizer que os astros que vemos essas miríades de estrelas, todas essas galáxias não passam de uma ilusão, uma imagem do passado?


- Mas, tudo o que vemos é assim. Não se vê jamais o presente. Quando eu olho, para você, eu a vejo no estado em que estava há um centésimo de microssegundo, o tempo que a luz levou para chegar até mim. Um centésimo de microssegundo é muito tempo na escala atômica. Felizmente, os seres humanos não desaparecem nesse lapso de tempo e eu posso formular sem risco a hipótese de que você está sempre aí. O mesmo vale para o Sol: durante os oito minutos que sua luz leva para chegar à Terra, ele não muda fundamentalmente. Mas, para os astros distantes, é diferente. Quando se fixa um quasar, se recebe uma luz velha, emitida há 12 bilhões de anos. Ora, sabemos que a luz - outra importante descoberta da Física - é na verdade um fluxo de minúsculas partículas a que chamamos fótons. No nosso olho, ou na objetiva do telescópio, recebemos, portanto fótons muito velhos, que viajaram durante 12 bilhões de anos. Em laboratório podemos perfeitamente estudá-los e analisar, por exemplo, sua freqüência ou sua energia. Além disso, sabemos fabricar simplesmente um novo fóton, ao criar um lampejo de luz. Comparando as duas partículas, a muito velha e a nova em folha, encontramos as mesmas constantes físicas. As leis não mudaram passados bilhões de anos.


- Ainda assim, o Universo mudou.


- Sim, é de resto a grande descoberta do nosso século: o Universo evolui, tem uma historia, não é nem imóvel nem eterno, assim como Galileu, Newton e mesmo Einstein o pensaram.


Dispõe-se até de provas visíveis: a escuridão do céu por exemplo.


- Por que isso seria uma prova da evolução do Universo?


- Se o Universo fosse eterno, as estrelas teriam emitido luz desde sempre e o céu estaria repleto de claridade. Se é negro, é porque as estrelas nem sempre existiram. E porque, de resto, o espaço entre elas aumenta sem cessar. Disso estamos hoje convencidos: o Universo está em expansão. Foi um astrônomo americano, Edwin Hubble, chie por volta de 1930 constatou que as galáxias se distanciavam umas das outras, tanto mais rapidamente quanto is distantes fossem. Algo como um pudim de passas que se leva ao forno: á medida que ele cresce as passas se distanciam umas das outras. Esse movimento conjunto foi confirmado depois por numerosas experiências e hoje se admite que o Universo infla e esfria há cerca de 15 bilhões de anos.


- Por que se chegou a 15 bilhões?


- Basta passar o filme ao contrário. Quanto mais se volta atrás no tempo, mais as galáxias se aproximam: o Universo é cada vez mais denso, logo cada vez mais quente e cada vez mais luminoso. Chega-se assim a 15 bilhões de anos. Nesse instante a densidade da matéria é infinita, assim como a temperatura do Universo. Tudo isso está confirmado por fósseis descobertos recentemente.


- Fósseis?


- Fósseis cosmológicos são, com efeito, os dados de observação que permitem reconstituir o passado. Algo como os pré-historiadores fazem com fragmentos de ossos. Assim descobrimos uma "radiação fóssil" que permitiu calcular que há 15 bilhões de anos o Universo tinha uma temperatura de pelo menos 3 mil graus. Outros elementos recentes, as medidas da relativa abundância de hidrogênio e de hélio, mostram que cerca de 1 milhão de anos antes o calor alcançava 10 bilhões de graus. E mesmo somente alguns minutos antes, vários bilhões de graus.


- Eis então nosso Big Bang. Voltamos à idéia de um começo. Se retornamos no tempo, o seu Universo-pudim é apenas uma bola, com todas as passas agrupadas.


- Não. Nossos modelos matemáticos sugerem que, nesse instante, mesmo que a matéria estivesse num estado de densidade muito grande, o Universo era já infinito. Ou, se você preferir, um purê de dimensões infinitas.


- Nada de explosão inicial então?


- Podemos reter a imagem da explosão se admitirmos que aquilo explodia em toda parte, em cada ponto do espaço.


- Por que o nome Big Bang?


- Foi por desprezo que um pesquisador, Fred Hoyle, assim designou, ridicularizando essa teoria de que ele não gostava. Hoje é aceita por todos os cientistas, mas o Big Bang para nós é apenas uma metáfora, pois, em relação àquele momento, nossas noções tradicionais de tempo e espaço não fazem mais sentido.


- Por quê?


- Porque, nessas altíssimas temperaturas, nossas teorias não se aplicam mais. Toda a Física afunda. Atualmente dispomos de duas grandes teorias: a Física Quântica, que explica muito bem o funcionamento dos átomos e de suas interações, desde que estes não sejam expostos a uma forte gravidade: e a Teoria da Relatividade, que descreve bem o comportamento da matéria sob forte gravidade desde que não se a considere como um conjunto de átomos. Portanto, nenhuma se permite estudar as partículas submetidas a uma forte gravidade, como, foi o caso há 15 bilhões de anos. E o problema fundamental da Cosmologia contemporânea: não conseguimos conciliar essas duas teorias. Muitos pesquisadores, entre os quais Stephen Hawking, trabalham nessa direção. Eles inventam modelos físicos muito complexos, como a "supersimetria", as "supercordas", a "supergravidadc" ou ainda os "miniuniversos". Mas até o presente com pouco sucesso.


- Nem se pode dizer se houve ou não um “antes”?


- Justamente, não. No passado, quando alguém perguntava o que fazia Deus antes de criar o mundo, havia o costume de responder: “Ele preparava o inferno para os que fizessem essa pergunta”. Santo Agostinho, de seu lado, respondeu: "Perguntar isso supòe que o tempo existisse antes da criação do mundos, Ora, também o tempo foi criado”. Hoje em dia os astrofísicos estão um pouco na mesma situação.


Nas condições do Big Bang já não podemos aplicar nossas teorias, o espaço-tempo não é mais definido, não sabemos mais o que significa a palavra “antes”. Eis por que a questão da origem nos deixa, a nós, astrofísicos, mudos e desamparados.


- De onde pode vir a solução? Da teoria ou da observação do céu?


- Das duas. É necessário que encontremos uma teoria mais global do Universo. Mas estou pronto a apostar que a observação e a descoberta a precederão. Os seres humanos, com efeito, não tem muita imaginação. Poderemos talvez progredir graças ao telescópio espacial, por exemplo, que nos permitirá enxergar mais longe, sem sermos atrapalhados pelo véu da atmosfera terrestre, portanto voltar atrás bastante no tempo durante o milhão de anos que se seguiu ao Big Bang.


- E talvez até a este?


- Não o “veremos” realmente, pois, quanto mais nos aproximamos, mais o Universo fica opaco, velado pela luz emitida durante o milhão de anos seguinte. Mas, com outros instrumentos, como o telescópio de neutrinos, ainda num futuro longínquo, poderíamos obter uma espécie de radioscopia do Universo, o equivalente ao que se vê do corpo ao observar as imagens de raios X ou dos scanners. Por volta do ano 2000, o telescópio de gravitons, uma espécie de sismógrafo do espaço, permitirá receber não a luz dos astros como um telescópio clássico, mas suas ondas gravitacionais.


- Já se conhece bem, agora, o enredo que se desenrolou depois do Big Bang?


- Sim, algumas etapas. Ao esfriar, o Universo vai se estruturar conforme o jogo das quatro forças fundamentais que se diferenciaram pouco após o Big Bang: a gravidade (que nos mantém no chão e governa os astros), a força eletromagnética (que une os átomos, por exemplo, o oxigênio e o hidrogênio na molécula de água), a força nuclear forte (que sol- da os núcleos dos átomos) e a força fraca (que governa os neutrinos). Alguns milionésimos de segundos após o Big Bang, as partículas de matéria, os quarks, começam a se organizar em prótons e nêutrons. Estes, por sua vez, vão formar os primeiros núcleos dos átomos simples, como o do hélio. Este último é muito estável – até demais, pois vai frear essa evolução durante um milhão de anos, tempo em que o Universo continua a esfriar e se presta a novas combinações.


- Portanto, a evolução não continuou?


- Não, houve soluços, períodos de aceleração. E fases parecidas com as da água, que , ao esfriar, passa do estado de vapor ao de liquido, depois ao de gelo. O Universo passou inicialmente do estado de radiação ao de matéria. Desde então, a gravidade começa a agir: a sopa de partículas forma coágulos, a matéria se concentra em grandes massas: as galáxias, depois as estrelas. Estas vão servir de cadinho aos prótons e aos nêutrons que ai se instalam em núcleos de átomos. Alguns milhões de anos mais tarde, certas estrelas, por falta de combustível, sucumbem e morrem, expulsando sua matéria. Dessa vez, graças à força eletromagnética, os núcleos ejetados se associam enfim em átomos e em moléculas: o hidrogênio, o oxigênio, o gás carbônico e também grãos de poeira, os primeiros sólidos, que irão se agregar para formar os planetas. O nosso nasceu há 5 bilhões de anos. No oceano primitivo, as moléculas cada vez mais complexas se combinam de modo a formar as primeiras células, os primeiros seres vivos. A evolução biológica segue se curso, o homem aparece... Pode-se dizer que os bilhões de bilhões de partículas que constituem os átomos do nosso corpo já existiam há 15 bilhões de anos. A diferença é que hoje elas não estão mais no caos, mas agrupadas na estruturas extremamente complexas que permitem o pensamento.


- Quer dizer que a história do Universo é a história da complexidade?


- Ela pode ser lida como tal. O Universo sempre evolui d simples para o complexo. Mas atenção: isso só diz respeito a uma porção muito pequena do espaço. A maior parte está ainda muito desorganizada. As nuvens de gás que existem entre as estrelas se parecem com aquilo que eram no momento do Big Bang. Podemos observar uma espécie de pirâmide da evolução cósmica. Quanto mais organizada e complexas as estruturas, menos elas são numerosas. É de certo modo como na Terra: os grandes predadores são menos numerosos que suas presas.


- Em suma, o senhor estendeu ao Universo inteiro a idéia darwiniana da evolução e fala como se o Universo tivesse obedecido a uma espécie de lógica. Diria o senhor que o apartamento dos planetas e da vida era inevitável?


- Eu tenderia a dizer que sim. Mas é uma opinião pessoal, da qual alguns dos meus colegas não partilham. As leis físicas são ajustadas para produzir a complexidade. Assim, de duas uma: ou elas mesmas decorrem de um principio mais geral, de uma espécie de teoria última do Universo o crente dirá que um ser supremo as fez férteis ou, como dirá ateu, elas decorrem do acaso. Mas nesse ponto se sai da ciência. O que parece assentado é que a complexidade estava inscrita desde o Big Bang. Todavia ela só pôde se expandir em razão do desequilíbrio do Universo.


- Como assim?


- Se o Universo tivesse esfriado muito lentamente, a matéria teria alcançado depressa um equilíbrio, ela se teria condensado em ferro, o elemento mais estável, e não teria evoluído. Não se conhecem elementos complexos construídos somente a partir de átomos de ferro. Felizmente, graças a seu esfriamento rápido, o Universo pôde produzir em quantidades importantes os outros átomos, corno o carbono, que se presta a muitíssimas combinações, até formar a extrema complexidade do cérebro humano, estrutura distante da estabilidade. De certo modo o equilíbrio é a morte. Um cadáver, por sinal, assume esse estado: as moléculas das quais é formado se desintegram em moléculas rnais simples.


- Será que o Universo vai recuperar um dia um equilíbrio, será que ele também morrerá ou vai inchar e esfriar indefinidamente?


- Pensa-se que ele continua a esfriar, mas cada vez menos depressa. Nosso Sol vai morrer em 5 bilhões de anos, depois de ter gasto seu combustível. Em mil bilhões de anos todas as estrelas do Universo estarão consumidas e se pensa que não haverá novos astros em formação. Restarão os buracos negros, que requerem mais tempo para se evaporar. E depois? Não se sabe. Mas é muito possível que não tenhamos arrolado todas as forças da natureza, que exista uma quinta, uma sexta força... No começo do século, só se conheciam duas. Ora, toda nova força é suscetível de prolongar a vida do Universo. De acordo corn outro enredo, a temperatura do Universo tornará a subir nesse caso seria necessário retomar filme de trás para diante. Num certo momento teria havido tanta luz que o céu se tornaria branco. A Terra se vaporizaria, a matéria se dissociaria. Nada de vida, nada de organização. As partículas dissociadas recuperariam um estado de equilíbrio. Mas esse enredo é pouco compatível com as observações e não se crê muito nele.


- Será que aparecimento do homem modifica essa longa marcha da complexidade?


- O homem já intervém na evolução, inventa inteligência artificial. Os cérebros humanos continuam a produzir complexidade. Nós apenas damos continuidade à tarefa da natureza.


- Pondo-a em perigo.


- Sim. Se nos damos conta de tudo que foi necessário para se chegar aonde estamos, à primeira margarida e a esses seres que agora podem tomar consciência do Universo e discutir suas origens, isso deveria incitar-nos a uma avaliação do nosso comportamento presente.


- O Universo começou sem o homem e terminará sem ele”, disse o antropólogo Lévi-Strauss. O senhor está de acordo com ele?


- O homem, talvez, mas não necessariamente a inteligência. Se o ser humano desaparecer, poderia haver outras espécies inteligentes que talvez alcançassem níveis de complexidade ainda mais elevados. Todo o Universo é construído de maneira homogênea. Para onde quer que se olhe se percebe que as primeiras etapas da complexidade já foram superadas: existem estrelas e galáxias que se parecem bastante às nossas e se pode postular ali a própria presença de carbono. Se uma molécula possui mais de quatro átomos, existe carbono! Pode-se assim supor que as etapas seguintes da complexidade tenham sido franqueadas em outros planetas. A inteligência e a consciência me parecem produtos mais ou menos inevitáveis da história do Universo. Penso que elas prosseguirão na sua evolução. Com ou sem nós.


A CONSIDERAR:


- Os astrofísicos são comparáveis a exploradores diante do oceano: não sabem se há algo além do horizonte.


- A grande descoberta do nosso século é a de que o Universo tem uma historia: não é imóvel nem eterno, mais evolui.


- Se o Cosmo fosse eterno, a luz das estrelas existiria desde sempre e o céu estaria cheio de claridade


- Esfriando depressa, o Universo criou os átomos que formariam a extrema complexidade do cérebro humano.