"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

sábado, 18 de julho de 2009

Endereço skydrive do Prof. Balbi

Atenção Acadêmicos: Todas as apostilas do Prof. Balbi estão no endereço http://cid-87fd84e5b95e998b.skydrive.live.com/home.aspx

sexta-feira, 17 de julho de 2009

O Significado da Revolução

Enquanto os elementos de novidade, começo e violência, todos intimamente associados ao nosso conceito de revolução, estão claramente ausentes do significado original da palavra, bem como do seu primeiro emprego metafórico na linguagem política, existe uma outra conotação do termo astronômico que já mencionei brevemente, e que ainda permanece muito forte em nosso próprio uso da palavra. Refiro-me à noção de irresistibilidade, o fato de que o movimento giratório das estrelas segue uma trajetória predeterminada, e é independente de qualquer influência do poder humano. Sabemos, ou acreditamos saber, a data exata em que a palavra revolução foi usada pela primeira vez com uma ênfase exclusiva na irresistibilidade, e sem qualquer conotação de um movimento giratório recorrente; e tão importante se apresenta essa ênfase ao nosso entendimento de revolução, que se tornou uma prática comum datar o novo significado político do antigo termo astronômico a partir do momento desse novo uso. A data foi a noite do 14 de julho de 1789, em Paris, quando Luís XVI recebeu do duque de La Rochefoucauld-Liancourt a noticia da queda da Bastilha, da libertação de uns poucos prisioneiros e da defecção das tropas reais frente a um ataque popular. O famoso diálogo que se travou entre o rei e seu mensageiro é muito lacônico e revelador. O rei, segundo consta, exclamou: C'est une révolte; e Liancourt corrigiu-o: Non, Sire, c'est une révolution. Aqui ouvimos ainda a palavra - e politicamente pela última vez - no sentido da antiga metáfora que transfere, do céu para a terra, o seu significado; mas aqui, talvez pela primeira vez, a ênfase deslocou-se inteiramente do determinismo de um movimento giratório cíclico para a sua irresistibilidade. O movimento ainda é visto através da imagem dos movimentos das estrelas, mas o que é enfatizado agora é que está além do poder humano detê-lo, e, como tal, é uma lei em si mesma. O rei, ao declarar que a investida contra a Bastilha era uma revolta, reafirmou o seu poder e os vários meios à sua disposição para fazer face à conspiração e ao desafio à autoridade; Liancourt replicou que o que tinha acontecido era irrevogável e além do poder de um rei. O que Liancourt viu - e o que devemos ver e entender, ouvindo esse estranho diálogo - que julgou ser, e sabemos que com razão, irresistível e irrevogável? A resposta, para começar, parece simples. Por trás dessas palavras, podemos ainda ver e ouvir a multidão em marcha, o seu avanço avassalador pelas ruas de Paris, que ainda era, nessa época, não apenas a capital da França, mas de todo o mundo civilizado - a sublevação da população das grandes cidades, inextricavelmente mesclada ao levante do povo pela liberdade, ambos irresistíveis pela pura força do seu número. E essa multidão, aparecendo pela primeis vez em plena luz do dia, era na verdade a multidão dos pobres e dos oprimidos, que em todos os séculos passados tinham estado ocultos na obscuridade e na degradação. O que a partir de então tornou-se irrevogável, e que os protagonistas e espectadores da revolução imediatamente reconheceram como tal, foi que o domínio público - reservado, até onde a memória podia alcançar, àqueles que eram livres, ou seja, livres de todas as preocupações relacionadas com as necessidades da vida, com as necessidades físicas - fora forçado a abrir seu espaço e sua luz a essa imensa maioria dos que não eram livres, por estarem presos às necessidades do dia-a-dia.

O que não fazer nas apresentações em público

Para você, acadêmico, que brevemente vai defender em público, pela primeira vez um trabalho técnico-científico, vão aqui alguns conselhos retirados da internet, de cursos de oratória e de nossa experiência pessoal. Espero que possa ser útil. Pense rapidamente: nesses dois últimos anos quais foram os erros cometidos por consultores/comunicadores em aulas, palestras, reuniões e programas de TV, que mais aborreceram você? Que pecados foram esses que se tornaram uma barreira às informações veiculadas? Como você se sentiu sendo testemunha de deslizes que, muitas vezes, significaram o comprometimento da qualidade do trabalho ali exposto? A seguir, temos uma lista de muitas muletas verbais e não verbais, que costumam destruir as apresentações em público, enfraquecendo o poder da mensagem e impedindo uma sintonia eficaz com a platéia. A idéia é que você leia o texto, assinalando aqueles erros que mais se encaixam em sua atuação no papel de comunicador. Comunicação Verbal Evitar: - Falar muito baixo ou muito alto; - Pronunciar mal as palavras; - Falar muito depressa ou muito devagar - Não pronunciar corretamente os termos estrangeiros; - Utilizar vícios de linguagem: tá?, Né?, OK?, Certo?, Entendeu? Percebe? É isso aí!, - Tipo assim..., a gente ...., acho que....,... - Falar de forma robotizada; - Cometer erros gramaticais; - Comer os "esses" e "erres"; - Falar de forma estridente; - Pronunciar as palavras atropeladamente; - Falar em tom monocórdico; - Ser prolixo ou monossilábico; - Coordenar as idéias de forma inadequada; - Exprimir-se sem objetividade e clareza; - Fazer uso de termos técnicos para público leigo; - Não considerar o momento, local e meio mais oportuno para transmitir a mensagem; - Respirar mal; - Utilizar argumentos inconsistentes; - Perder-se no exagero de detalhes; - Diminuir o volume da voz nos finais das frases; - Não utilizar bem a pontuação; - Não enfatizar as idéias principais; - Abusar do excesso de citações; - Usar vocabulário inadequado; - Organizar mal a apresentação; - Falar com voz áspera de gutural; - Estruturar mal as idéias. Achou a lista muito extensa? Vamos entrar para a Segunda parte... Comunicação Não-Verbal Evitar: - Usar gestos que transmitam nervosismo e inibição; - Mexer na gravata; - Brincar com chaveiros e canetas; - Ficar ajeitando os cabelos e os óculos; - Coçar as orelhas, cabeça, nariz, etc.; - Pigarrear; - Bocejar; - Descansar o corpo, deixando-o pender para o lado direito ou o esquerdo. - Olhar todo o tempo para o sapato; - Olhar através das pessoas; - Postar-se como estátua; - Movimentar as mãos em excesso; - Postar-se como se tivesse peito de pombo; - Mastigar qualquer tipo de alimento - Mascar chicletes ou chupar bala; - Roer unha; - Deixar os braços cruzados; - Colocar as mãos para trás; - Ficar com as pernas abertas como se fosse uma forquilha; - Ficar de costas para a platéia; - Torcer as mãos demonstrando ansiedade; - Curvar o corpo para a frente ou para trás desnecessariamente; - Andar sem motivo; - Balançar o corpo de um lado para outro; - Olhar só para uma pessoa da platéia; - Deixar o corpo torto; - Colocar as mãos nos bolsos e não tirá-las mais; - Olhar para o vazio; - Adotar a posição de xícara, as duas mãos agarradas à cintura; - Deixar os braços cruzados; - Ficar piscando; - Apoiar-se nos móveis do cenário; - Assoar o nariz - Utilizar gestos teatrais fora de hora; - Olhar para o chão ou para o teto; - Olhar várias vezes para o relógio demonstrando pressa; - Utilizar inadequadamente os recursos audiovisuais; - Fazer do ponteiro ou da caneta lazer armas contra a público; - Carregar nas mão canetas ou lápis; - Esconder-se atrás dos recursos audiovisuais; - Ficar com olhar assustado ou expressão de tédio; - Falar palavrões e gírias; - Perder a interação visual com o público. Comunicação Interpessoal Evitar: - Demonstrar egocentrismo exagerado; - Utilizar a comunicação como forma de poder; - Mostrar-se arrogante e prepotente; - Demonstrar subserviência; - Manipular a platéia; - Não prestar atenção às perguntas da platéia; - Não utilizar empatia; - Ser irônico e sarcástico; - Não saber ouvir - Revelar preconceitos; - Apresentar-se sem estar preparado; - Ignorar a etiqueta empresarial. - Chegar atrasado; - Demonstrar preferências pessoais; - Ser incoerente quanto aos gestos, atos e palavras; - Ser inflexível; - Não saber administrar os conflitos interpessoais; - Humilhar a platéia; - Receber as perguntas da platéia como se fossem uma ofensa pessoal; - Dizer que irá roubar o tempo dos espectadores - Não saber administrar o tempo da exposição; - Querer enganar a platéia, falando sobre o que não conhece; - Ignorar a linguagem corporal dos espectadores. - Subestimar a importância do processo de sinergia; E agora, pensemos novamente: em que medida nós também estamos cometendo diariamente esses mesmos erros e desacertos, que tanto criticamos nos outros? Quais serão os nossos pequenos vícios e manias, que roubam o interesse do espectador, anulando a possibilidade de uma comunicação receptiva? Seria primordial que nos propuséssemos a uma análise criteriosa de nossas apresentações. Isso poderia representar um instrumento importante para a construção de uma comunicação fluente, segura e objetiva, sem tantas interferências, que prejudicam substancialmente a interação com a platéia. É preciso deixar emergir em cada um de nós a humildade, para que essa avaliação possa nos dar um feedback dos pontos fortes e vulneráveis de nossa atuação, permitindo-nos a correção de rotas. O público, com certeza, irá nos agradecer por isso!

O Professor na Modernidade

Para ensinar há uma formalidadezinha a cumprir - saber. Eça de Queirós
Tendo-se completado um século da morte do grande escritor Eça de Queirós, sua sabedoria continua a nos inspirar, pelo conhecimento que tinha da alma e dos costumes humanos e pela capacidade de expressá-lo em sua obra, como é próprio aos bons romancistas. Esse é o seu saber. Quando se trata do trabalho do professor, que tipo de saber poderia caracterizá-lo no exercício de sua função? Tentaremos responder à questão através de algumas reflexões. Atualmente, na sociedade capitalista e globalizada na qual estamos inseridos e da qual fazemos parte, há mudanças constantes, rápidas e permanentes, no âmbito cultural, político, econômico, prontas a preencherem um presente obcecado pelo mito do progresso. Isso, muitas vezes, provoca um desconcerto no sujeito que está inserido nessa realidade "fragmentada". Em diversas situações, esse sujeito não sabe como agir, como articular as múltiplas informações que chegam a todo o instante até ele. Ou seja, não sabe apropriar-se de sua realidade e adquirir uma consciência crítica sobre ela. Talvez, neste momento, comecemos a entender verdadeiramente o papel do professor, grande agente do processo educacional e da transformação da sociedade da qual faz parte. Por mais sofisticadas que possam ser as tecnologias ao nosso dispor, por mais diversificadas que sejam as ofertas educativas na sociedade do conhecimento, nada poderá substituir a presença desse adulto que dá testemunho de uma experiência e de um saber, que explica e que interpela, abrindo caminho a verdades desejadas. Professor é o que aprende sempre. E é capaz de ler o mundo sob perspectivas múltiplas e, por vezes, inusitadas, compartilhando o conhecimento vivo que constrói e reconstrói, quando necessário, com seus alunos. É alguém que está constantemente criando, dividindo anseios, idéias, alegrias, frustrações, conquistas... E tem a humildade e a capacidade de reconhecer quando se faz necessária uma mudança. Affonso Romano de Santanna, escritor e crítico literário, afirma, referindo-se à questão do "saber" e do "poder" que se enriquece o saber combatendo-se o poder que ele aparenta. E ratifica sua idéia dizendo que uma forma de incrementar o poder é o "perder". Assim, o melhor professor seria aquele que não detém o poder nem o saber, mas que está disposto a perder o poder, para fazer emergir o saber múltiplo. Neste caso, perder é uma forma de ganhar e o saber é recomeçar. Desaprender a lição, recomeçar a aprender estão muito de acordo com o momento atual, em que vemos a sociedade brasileira se repensando, reaprendendo o Brasil, em busca de uma nova ordem institucional. Daí, então, a pesquisa da realidade como elemento essencial no currículo da verdadeira aprendizagem. E a importância, o papel singular do professor como mediador no processo de construção do conhecimento e da consciência crítica do educando. Alguém que deixa de ser "o que sabe" para ser "o que aprende sempre".

O Papel do Psicólogo na Busca de uma Relação Dinâmica entre Professor-Aluno

Introdução Só crescemos e nos desenvolvemos na medida em que estivermos abertos a novos conhecimentos, na medida em que estivermos dispostos a modificar nossas opiniões, nossas crenças e nossas convicções. Numa sala de aula, o professor exerce influência sobre os alunos e estes sobre o professor e os colegas. Nossos comportamentos são respostas constantes e contínuas ao ambiente físico e social. As pessoas despertam uma nas outras, comportamentos diferentes: uma pessoa nos provoca vontade de abraçar, outra pessoa pode ficar conversando conosco sem parar e etc.; sempre nos sentimos bem quando estamos junto das pessoas que nos agradam, por uma ou outra razão. Um aluno vai se aproximar do professor na medida em que essa aproximação for agradável para ele. Nós temos a tendência a rotular as pessoas: quando um professor acha que um aluno é incapaz, que não sabe nada, ele pode tender a tratar o aluno de acordo com essa percepção. Em conseqüência, se o aluno não é nada disso, o julgamento do professor pode levá-lo a apresentar sentimentos de incapacidade, de acordo com o que é esperado. A origem desse preconceito pode estar nas informações recebidas do professor que lecionava anteriormente ou nas conversas de colegas, etc. Os preconceituosos não permitem que conheçamos as pessoas como realmente são. Na verdade, toda pessoa tem um potencial muito grande de aprendizagem, cabe ao professor reconhecer o potencial de seus alunos e contribuir para sua realização. Se existem diversos e complexos fatores físicos, psicológicos, econômicos e sociais, responsáveis pelo desempenho de cada criança na escola, a causa básica do insucesso está no próprio processo escolar. O aluno não entra na escola fracassado; quando “fracassa”, são os métodos empregados pelos professores e administradores, individual e coletivamente, que estão falhando. Desenvolvimento Segundo MALUF, citado por ACHACAR (1994, p.157), a tarefa de educar não tem idade. Todas as civilizações educaram e continuam a educar aqueles que nascem e que serão adultos no seio do grupo que os acolheu, dando-lhes condições sociais de sobrevivência. São essas condições sociais que se complexificaram ao longo da história humana e se encontraram na origem dos sistemas educacionais. Ainda para essa autora, o objetivo da psicologia educacional é estudar o homem de natureza e o homem de cultura ao mesmo tempo. O psicólogo que busca atender às necessidades educacionais dos indivíduos e grupos precisa ir além do comportamento manifesto e das contingências imediatas de aprendizagem: cabe-lhe preocupar-se com a compreensão dos microsistemas em que o aluno se insere e suas mútuas relações e reconhecer o outro como sujeito, ou seja, como uma pessoa a ser escutada. Um dos objetivos dos serviços psicológicos é o de abrir um espaço para a circulação de discursos, nas instituições em que a ausência dessa circulação estiver comprometendo a realização dos objetivos institucionais. Ainda, de entender a dinâmica das relações e levantar questões. Não existe um modelo único para atuar, mas sim momentos que precisam se inovar, criar perante as situações que irão surgir. Promover a saúde e o bem-estar dos integrantes da instituição, com ênfase na prevenção do fracasso escolar através da promoção da aprendizagem e do desenvolvimento do aluno e de intervenções sobre a dimensão organizacional ou institucional da escola; bem como melhor adaptação do aluno aos programas e ao ambiente escolar, como também a criação de novos cenários e práticas educativas e de novas realidades sociais. Portanto, compreendendo as reais necessidades dos alunos, a equipe pedagógica se dispõe de melhores condições para proporcionar-lhes um melhor processo de aprendizagem. Os pressupostos básicos do psicólogo educacional têm implicações em sua visão de mundo, no papel que desempenha, em sua prática. Não é possível falar em psicologia escolar sem falar em educação, sem compreender a função da escola em seu contexto social. A partir dessa compreensão entende-se que mesmo aquilo que se considera como interno à escola, é na verdade uma expressão de determinações que estão fora da escola (fatores sócio-econômicos, culturais, psicológicos, etc, dos alunos). Ao se defrontar com a Psicologia Escolar e os problemas de aprendizagem que dele ocorre, constata-se que são vários os fatores e causas que levam a essa dificuldade que está presente no nosso dia - dia. O ensino público brasileiro vem sofrendo uma defasagem na atual conjuntura de subsídios do contexto escola - família devido ao fator sócio - cultural. Não se chega a um consenso entre família e escola (sociedade) devido ao fato de enxergarem só o erro do outro não prestando atenção no fato de poderem estar realizando um trabalho juntos para um melhor enriquecimento de ambas as partes. E quem se responsabiliza por essa defasagem é sempre a o aluno, sendo que existe toda uma equipe multidisciplinar que poderia assumir tais responsabilidades e estar junto ao aluno nessa responsabilidade. É preciso que os educadores tenham em mente que deve haver uma melhora dentro do campo escolar e que só será possível através de uma via de mão dupla entre escola e família e de certa forma, todos que estão envolvidos no contexto do processo - aprendizagem do aluno. A expressão referente "mão dupla" citada no parágrafo anterior, compete à família e à escola unirem-se de forma que os mesmos enxerguem e parem para refletir sobre o que acontece atualmente em relação à educação, e o que pode ser feito para mudar a visão da educação pública. Ex: preconceito social, racial, financeiro e cultural. O Psicólogo Escolar deve estar atento às integridades básicas dos alunos que são de suma importância no processo ensino - aprendizagem e perceber se o problema é em relação a alguma dificuldade que o aluno tenha, se é falta de estímulo dos professores ou pais. Também deve estar atento à dinâmica da instituição, vínculos e relações, ter uma visão social e política, trabalhar com espontaneidade, criatividade, visando um melhor desempenho dos professores no processo ensino - aprendizagem, lhes mostrando meios de se chegar a esses alunos lhes motivando a aprender e também apegarem-se às capacidades de estarem aprendendo mais informações relacionadas ao seu dia - dia, que são várias. Necessita-se criar relações sadias no contexto escolar, para que o processo de aprendizagem venha a ser dinâmico e organizado que veja o todo das/nas relações, favorecendo a inserção e permanência do aluno na escola de modo que este aprenda. BLEGER em Psicologia Institucional (1986), mostra várias mudanças de grande importância para a psicologia e uma delas é o fato de que se contrapõe à certa neutralidade na instituição. Para ele existem relações concretas que estão em constante movimentação. Por isso, o psicólogo deve ter um olhar amplo e perceber toda a totalidade da instituição. Segundo BLEGER, citado por GUIRADO (1986, p.17), as relações que se estabelecem é formada por pessoas que funcionam ao nível de ego sincrético e ao nível de ego organizado. Elas funcionam em um desses tipos de ego, embora possa ora estar em um, ora em outro. O ego sincrético é mais fragmentado, tem movimentos imaturos. Já o ego organizado tem um certo equilíbrio e consegue separar sujeito de objeto. Os vínculos na instituição são formados por pessoas que funcionam mais no ego sincrético e as relações são formadas por pessoas que funcionam mais no ego organizado. Este é mais sadio. Por isso, o psicólogo deve estar atento aos vínculos e relações na instituição e perceber quais são as pessoas independentes, as dependentes e as ditas normais ou neuróticas. BLEGER trouxe para a psicologia uma nova visão do psicólogo institucional causando várias mudanças. Ele viu a necessidade do atendimento psicológico sair das clínicas, consultórios e atuar ao nível de saúde mental. Assim, utiliza-se da psicanálise, psicologia, ciência, tendo uma visão social e política. Juntando todos esses conceitos, ele mostra a instituição que necessita ser trabalhada em sua totalidade através da psico-higiene que é uma prevenção, profilaxia da doença, visando a saúde que age em nível primário. A higiene mental visa à saúde, mas trabalha com a doença, e age a nível secundário e terciário. Para agir nessas instituições, o psicólogo deve ter uma visão social e política não se alienando, e trabalhar com espontaneidade, criatividade, visando o todo da instituição. Essas mudanças têm proporcionado ao psicólogo ter uma visão de investigação e intervenção nessas instituições, trabalhando a totalidade institucional. Uma instituição não funciona bem quando não há relações de troca entre os grupos. A instituição confusa, que caminha a passos lentos, deve, através da ajuda do psicólogo, encontrar passos firmes para o amadurecimento de todos da instituição, fazendo com que os funcionários, grupos, trabalhem o manifesto e o latente da dinâmica institucional, buscando funcionários que trabalhem ao nível de ego organizado, com relações sadias, a fim de criar uma instituição dinâmica e organizada que vê o todo das/nas relações. O perfil mais adequado para o psicólogo escolar é aquele em que poderá usar os papéis de consultor, orientador, pesquisador e educador. Sendo o seu objetivo: “promover a qualidade e eficiência dos processos educacionais através da aplicação dos conhecimentos psicológicos”. Estar na escola para ajudar a planejar programas educacionais para os alunos, fazendo uma transição entre o papel educador e acadêmico. Este é um trabalho interdisciplinar, onde juntos, o psicólogo e o educador atuam na realização de planos educacionais, visando o desenvolvimento e crescimento da escola. Atualmente tem sido comum considerar o psicólogo como auxiliar importante e norteador dos trabalhos pedagógicos nas escolas. O psicólogo deve orientar o educador sobre a importância da criatividade usando-o como um instrumento de ação transformadora na escola, buscando com isso realmente transformá-la em um lugar de mais alegrias. Quando estamos dizendo da práxis da psicologia escolar, estamos dizendo não só da psicologia que compreende o aluno, mas também das várias psicologias que abordam, não só ele, como também o professor, o corpo administrativo, a instituição escolar, enfim, tudo e todos envolvidos no processo educacional. Segundo ACHACAR (1994, p. 159), os psicólogos educacionais, trabalhando como agentes de mudanças, como catalisadores de processos de rompimentos do que já se encontra cristalizados nas escolas, podem fazer com que esse espaço considere não mais uma cisão entre as atividades de estudar e ter prazer, mas, sim, uma conjugação entre elas. Emoções, necessidades e interesses dos alunos devem ser paulatinamente assumidos por eles, além de levados em conta pelos educadores que com ela convivem, porque só a luz da compreensão dessas características poderão ser respeitadas suas diferenças individuais. É fundamental considerar que o ser humano é elástico e um mau início não o condena para o resto de seus dias: suas experiências subseqüentes são importantes. Esta afirmação sintetiza a crença no papel da educação e, conseqüentemente, na atuação do educador diante o processo de socialização desde a infância, além da convicção em relação ao papel ativo desenvolvido pelo aluno. Conclusão A prática psicológica e educacional dentro da escola necessita ter como base duas dimensões fundamentais. Uma é a dimensão ética que se compõem pela solidariedade ao outro e com o outro, onde reconhecemos o outro como uma pessoa com quem entramos em diálogo e que, na convivência, é essencial à nossa realização humana, e não como simples indivíduo que está ao nosso lado, com quem entramos em contato pelo simples motivo da sobrevivência em competição potencial conosco, ou seja, compreendendo o ser humano como um ser dialógico em sua singularidade e alteridade, cuja subjetividade é composta por milhões de relações que estabelece durante toda a sua existência. A outra é a dimensão política do compromisso com a transformação social. Com a criação de espaços para reflexões na escola, o psicólogo poderá colocar em prática, técnicas e métodos aprendidos no espaço acadêmico, tornando sua atuação de extrema importância para sua formação e um auxílio à escola e os demais envolvidos nesse contexto. Percebe-se que a atuação do psicólogo se diferencia de acordo com a demanda da instituição de ensino, cabendo ao educador se perceber como agente de transformação na vida dos educandos e para desencadear essa percepção deve haver um ambiente que possibilite a reflexão e discussão de sua prática, sendo assim, não deixando de omitir a importância dos fatores biopsicossociais e culturais onde a escola se insere. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACHACAR, Rosimary. Psicólogo brasileiro: práticas emergentes para a formação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. GUIRADO, M.: Psicologia institucional. São Paulo: Atlas, 1986. v. 15 SERRÃO, Margarida; BALEEIRO, Maria Clarice. Aprendendo a ser e a conviver. 2. ed. São Paulo: FTD, 1999.

LEIS NATURAIS DE QUEM?

Do mesmo modo que os economistas da época da Revolução Industrial desenvolveram uma série de leis que, diziam, eram tão válidas para o mundo social e econômico como as leis dos cientistas para o mundo físico. Formularam uma série de doutrinas que- eram as “leis naturais” da Economia. Estavam convencidos de suas verificações. Não discutiam se as leis eram boas ou más. Não havia por que discutir. Suas leis eram fixas, eternas. Se os homens fossem inteligentes e agissem de acordo com os princípios que expunham, muito bem; mas se não, e agissem sem respeito às suas leis naturais, sofreriam as conseqüências. Ora, pode ser ou não verdade que esses economistas, em sua busca da verdade, fossem sublimemente indiferentes aos resultados práticos de suas pesquisas. Mas eram homens de carne e osso, que viviam num certo lugar e numa certa época. Isso significa que os problemas por eles tratados eram os mesmos que surgiam naquele lugar e naquela época. E suas doutrinas atingiram poderosos grupos na sociedade, que consequentemente as aceitavam ou rejeitavam, de acordo com seus interesses, e viam a "verdade” àquela luz. Tal como a ascensão da classe dos negociantes, após a Revolução Comercial, trouxera consigo a teoria do mercantilismo, assim como as doutrinas dos fisiocratas, acentuando a importância da terra como fonte de riqueza, se desenvolveram na França agrícola, assim a ascensão dos industriais durante a Revolução Industrial na Inglaterra trouxe consigo teorias econômicas baseadas nas condições da época. Chamamos às teorias da Revolução Industrial de “Economia clássica". O leitor já está familiarizado com algumas das doutrinas de Adam Smith, considerado o fundador da escola clássica. Outros economistas destacados dessa corrente são Ricardo, Malthus, James Mill, McCulloch, Senior e John Stuart Mill. Nem todos concordam com Smith ou entre si. Mas estão de acordo sobre certos princípios gerais fundamentais. E sinceramente de acordo com tais princípios estavam os homens de negócios da época. Por uma excelente razão: a teoria clássica se adequava admiravelmente às suas necessidades particulares. Dela podiam escolher, com grande facilidade, as leis naturais que justificassem completamente seus atos. – Os homens de negócios estavam atentos às grandes oportunidades. Estavam desejosos de lucros. Vieram então os economistas clássicos, dizendo que era isso exatamente que devia acontecer. E havia mais. Havia um conforto ainda maior para o homem de negócios empreendedor. Diziam-lhe que, ao procurar seu lucro, estava ajudando também ao Estado. Adam Smith disse isso. Eis aqui, por exemplo, um remédio perfeito para o ambicioso negociante que pudesse passar as noites em claro, às voltas com sua consciência perturbada: “Toda pessoa esta continuamente empenhada em encontrar o emprego mais vantajoso para o capital de que dispõe. É sua vantagem pessoal, na realidade, e não a da sociedade, o que tem em vista. Mas o estudo de sua vantagem pessoal, naturalmente, ou melhor, necessariamente o leva a preferir o emprego mais vantajoso para a sociedade.” Perceberam? O bem-estar da sociedade está ligado ao do indivíduo. Dê a todos a maior liberdade, diga-lhes para ganharem o mais que puderem, apele para seu interesse pessoal, e veja, toda a sociedade melhorou! Trabalhe para si amo, e estará servindo ao bem geral. Que achado para os homens de negócios, ansiosos em se lançarem na corrida dos lucros cada vez maiores! Abram os sinais para o trem especial do laissez-faire! Deveria o governo regulamentar os horários e os salários dos trabalhadores? Isso seria uma interferência na lei natural, e, portanto, inútil – diziam os economistas clássicos. Qual, então, a função do governo? Preservar a paz, proteger a propriedade, não interferir. A concorrência devia ser a ordem do dia. Mantinha baixos os preços e assegurava o êxito dos fortes e eficientes, livrando-se ao mesmo tempo dos fracos e ineficientes. Segue-se que o monopólio – dos capitalistas para elevar os preços, ou dos sindicatos para elevar os salários – era uma violação da lei natural. Esses amplos conceitos, como o leitor se lembrará, foram delineados por Adam Smith em resposta à regulamentação, restrição e contenção mercantilista. Escreveu seu grande livro em 1776, exatamente no início da Revolução Industrial. Os economistas clássicos, que se assenhorearam dessas doutrinas, ampliando-as e popularizando-as, escreveram que a Revolução Industrial, do ponto de vista do aumento da produção de mercadorias e ascensão ao poder da classe capitalista, estava fazendo um grande progresso. Acrescentaram outras “leis naturais” de sua autoria, que se adaptavam às condições da época. An Essay on the Principle of Population, de Thomas R. Malthus, foi um dos livros mais famosos do período, publicado primeiramente em 1798, em parte como resposta a um livro de William Godwin, sogro de Shelley. Godwin, em seu Enquiry Concerning Political Justice, escrito em 1793, afirmava que todos os governos eram um mal, mas que o progresso era possível t a humanidade poderia chegar à felicidade pelo uso da razão. Malthus desejava combater as perigosas crenças de Godwin; queria provar que um grande progresso no destino da humanidade era impossível – o que seria uma boa razão para que todos vivessem contentes, com o que havia, e não tentassem uma revolução como a da França. Malthus ataca Godwin da seguinte forma: “O grande erro em que elabora o Sr. Godwin em todo o seu livro está na atribuição de quase todos os vícios e misérias existentes na sociedade civil às instituições humanas. As regulamentações políticas e a administração da propriedade existente são para ele as fontes de todo o mal, o berço de todos os crimes que degradam a humanidade. Se assim realmente fosse, não seria tarefa impossível afastar totalmente o mal do mundo; a razão parece ser o instrumento próprio e adequado para realizar tão grande objetivo. A verdade, porém, é que embora as instituições humanas pareçam ser as causas evidentes e óbvias de muitos males da humanidade, na realidade são ligeiras e superficiais, são como simples penas que flutuam na superfície, em comparação com as causas profundas de impureza que corrompem as fontes e tornam turvas as águas de toda a vida humana.” Quais são essas “causas profundas” que fazem a miséria da humanidade? A resposta de Malthus é que a população aumenta mais depressa do que o alimento para mantê-la viva. O resultado – haverá uma época em que o número de bocas será muito superior ao alimento existente para alimentá-las. “A população, quando não-controlada, aumenta numa razão geométrica. A subsistência aumenta apenas em proporção aritmética... ... Isso significa um controle forte e constante sobre a população, provocado pela dificuldade de subsistência. Essa dificuldade deve recair nalguma parte e deve necessariamente ser fortemente sentida por grande parte da humanidade... ... “A população da Ilha [Inglaterra] é de cerca de sete milhões. Suponhamos ser a produção atual suficiente para sustentar esse número. Nos primeiros 25 anos, a população será de 14 milhões, e o alimento dobrando também, os meios de subsistência serão iguais a esse aumento. Nos 25 anos seguintes a população será de 28 milhões; e os meios de subsistência suficientes apenas para o sustento de 21 milhões. No período seguinte, a população será de 56 milhões, e os meios de subsistência suficientes para metade desse número. E na conclusão do primeiro século, a população seria de 120 milhões, e os meios de subsistência suficientes apenas para o sustento de 35 milhões. Isso deixaria uma população de 77 milhões totalmente sem abastecimento.” Isso, diz Malthus, não acontece na realidade. Porque a morte (na forma de “epidemias, pestes e pragas...... e fome”) age e recolhe sua taxa de crescimento demográfico, de forma que este se harmoniza com o suprimento de alimentos. “O crescimento superior da população é contido, e a população real se mantém em nível com os meios de subsistência pela miséria e pelos vícios.” ‘" Assim, a razão pela qual as classes trabalhadoras eram pobres, disse Malthus, não estava nos lucros excessivos (razão humana) mas no fato de que a população aumenta mais depressa do que a subsistência (lei natural). Nada se poderia, porém. fazer para melhorar a situação dos pobres? “Nada”, disse Malthus na primeira edição de seu livro: “É sem dúvida um pensamento muito acabrunhador, o de que o grande obstáculo a qualquer melhoria extraordinária da sociedade seja uma natureza impossível de superar.” "* Mas na segunda edição, publicada em 1803, ele achou uma solução. Além da miséria e do vício, um terceiro controle da população era possível – o “controle moral”. Greves, revoluções, caridade, regulamentações governamentais, nada disso poderia ajudar os pobres em sua miséria – eles é que deviam ser responsabilizados, porque se reproduziam tão rapidamente. Impeça-se que casem tão cedo. Pratiquem o “controle moral” – não tenham famílias tão grandes – e assim poderão ter esperanças de se ajudarem a si mesmos. Quem servia melhor à sociedade – a mulher que se casava e tinha muitos filhos, ou a solteirona? Malthus achava que era a segunda: “A matrona que criou uma família de 10 ou 12 filhos, que talvez estejam lutando pela pátria, pode achar que a sociedade lhe deve muito... ...Mas se a questão for imparcialmente examinada, e a matrona respeitada tiver seu peso aferido na escala da justiça, em relação à desprezada solteirona, é possível que a matrona leve a pior.” Boa notícia para os ricos, a de que os pobres eram os únicos culpados de sua pobreza. Depois de Adam Smith, o mais importante dos economistas clássicos foi David Ricardo. Era um judeu londrino que fizera grande fortuna nas ações da Bolsa. Seu livro The Principles of Political Economy and Taxation, publicado em 1817, é considerado por muitos como o primeiro a tratar a Economia como uma ciência. A Weadth of Nations de Adam Smith é leitura fácil, em comparação com o trabalho de Ricardo. Uma das razões: Smith é muito melhor como escritor. Outra, e talvez mais importante, é a objetividade de Smith, sua citação de exemplos familiares para ilustrar suas idéias. Ricardo, por outro lado, é abstrato e usa exemplos imaginários que podem, ou não, ter alguma aparência de realidade. Os livros científicos são, de modo geral, difíceis e monótonos. Ricardo não constitui exceção. Não obstante, o que tinha a dizer era tremendamente importante, e ele se classifica como um dos maiores economistas do mundo. Em nosso limitado espaço só podemos examinar algumas de suas doutrinas, e muito rapidamente. A primeira é conhecida como “a lei férrea dos salários”. O que os trabalhadores ganhavam pela sua atividade já recebera a atenção de autores antes de Ricardo. Em 1766, Turgot, num pequeno livro intitulado Re-flections on the Formation and Distribution of Wealth, dizia: “O trabalhador simples, que depende apenas de suas mãos e sua indústria, não tem senão a parte de seu trabalho de' que pode dispor para os outros. Vende-a a um preço maior ou menor ; mas esse preço alto ou baixo não depende apenas dele; resulta de um acordo que fez com a pessoa que o emprega. Esta lhe paga o menos possível, e, como pode escolher entre muitos trabalhadores, prefere o que trabalha por menos. Os trabalhadores são por isso obrigados a reduzir seu preço em concorrência uns com outros. Em toda espécie de trabalho deve acontecer, e na realidade acontece, que os salários do trabalhador se limitam apenas ao que é necessário à mera subsistência.” ‘" Turgot não foi além. Ricardo desenvolveu a idéia, e por isso a lei de férias dos salários está ligada a ele. Assim, afirma que o trabalhador ganha apenas o salário necessário para manter vivos a ele e à família. “O preço natural do trabalho... depende do preço do alimento, necessidade e conveniências necessárias à manutenção do trabalhador e sua família. Com um aumento no preço dos alimentos e das necessidades, o preço natural do trabalho se eleva. Com a queda o preço natural do trabalho cai.” Mas eu e o leitor sabemos que há épocas em que os trabalhadores recebem mais do que o necessário para viver, e outras em que recebem menos. Ricardo leva isso em conta. Distingue entre o “preço do mercado” do trabalho e seu preço natural: “O preço do mercado do trabalho é o preço realmente pago por ele, resultado da operação natural da proporção entre a oferta e a procura : o trabalho é caro quando escasso, e barato quando abundante. Por mais que o preço do mercado do trabalho se possa desviar de seu preço natural, ele tem, como as mercadorias, a tendência de se conformar a ele.” Para mostrar a exatidão dessa ultima frase, de que o preço do mercado tende a se conformar ao preço natural, Ricardo toma emprestada uma folha do livro de Malthus. Diz que quando o preço do mercado é alto, quando os trabalhadores recebem mais do que o bastante para a manutenção de suas famílias, então a tendência é aumentar o tamanho dessas famílias. E o aumento do número de trabalhadores reduzirá os salários. Quando o preço do mercado é baixo, quando os trabalhadores recebem menos do necessário para manter as famílias, então seu número se reduz. E um número menor de trabalhadores eleva os salários. Essa, pois, a lei de salários de Ricardo – com o tempo, os trabalhadores não poderão receber mais que o “necessário para lhes permitir.. ....viver e perpetuar a raça, sem aumentar nem diminuir.” Para melhor compreensão da lei da renda, a mais famosa das doutrinas de Ricardo, devemos examinar a controvérsia sobre as Leis do Trigo, que varria a Inglaterra na época em que apareceram os Principles de Ricardo. Os antagonistas da disputa eram os donos de terras e os industriais. As Leis do Trigo eram uma espécie de tarifa protetora do trigo. O trigo não poderia ser importado enquanto o preço do produto não atingisse, internamente, determinado nível, que variava de tempos em tempos. A finalidade disso era estimular seu cultivo, para que a Inglaterra tivesse bastante sortimento dele, em caso de emergência. O cultivo foi estimulado assegurando-se ao agricultor inglês um bom preço. Não precisava temer a concorrência externa, porque nenhum trigo entraria no país até que o produto interno tivesse atingido certo preço. Isso significava bons lucros, a menos que a colheita interna fosse excessiva para o consumo – o que não ocorria na Inglaterra desde 1790. Devido às guerras napoleônicas, o trigo teve seu preço elevado e uma área de terras cada vez maior foi dedicada ao seu plantio. Os agricultores queriam o preço alto, porque isso representava maior renda, e mais dinheiro no bolso. Os industriais não queriam o preço alto, porque isso representava um aumento no custo da subsistência dos trabalhadores, e, portanto, descontentamento, greves, e finalmente salários mais altos, ou seja, menos dinheiro em seu bolso. Travou-se uma polêmica, os donos de terra pedindo proteção e os industriais defendendo o comércio livre. Ricardo estava no meio dessa luta. Suas simpatias eram dos industriais, pois pertencia a classe da nascente burguesia. Não é de surpreender, portanto, que entre outras coisas, as leis naturais por ele descobertas expliquem a natureza da renda, mostrem que “todas as classes, portanto, com exceção dos donos de terras, serão prejudicadas pelo aumento do preço do trigo”. Como chegou a essa conclusão? Provando que quanto mais alto o preço do trigo, tanto mais altas as rendas. Aumentam estas, argumenta Ricardo, porque o solo é limitado e sua fertilidade difere. “Se toda a terra tivesse as mesmas propriedades, se fosse ilimitada em quantidade e uniforme em qualidade, não seria possível cobrar pelo seu uso...... portanto, somente porque a terra não e de quantidade ilimitada nem de qualidade uniforme e porque, devido ao aumento da população, terra de qualidade inferior... ... é posta em cultivo, que se paga renda pela sua utilização. Quando, na evolução da sociedade, terras de segundo grau de fertilidade são postas em cultivo, a renda imediatamente começa a ser cobrada pela terra de primeira qualidade, e o total dessa renda dependerá da diferença de qualidade nessas duas partes da terra. “Quando a terra de terceira qualidade é posta em cultivo, a renda imediatamente começa na segunda, e é determinada, como antes, pela diferença em sua capacidade produtiva...... Com os aumentos da população, que obrigarão o país a recorrer a terras de pior qualidade para que consiga o volume de alimentos de que necessita, a renda sobre a terra mais fértil começara a ser cobrada.” Segundo Ricardo, as Leis do Trigo, elevando o preço do produto, fizeram os agricultores procurar terras mais pobres para seu plantio. Quando isso ocorreu, pagaram-se arrendamentos pelas terras mais férteis. Com o passar do tempo, o solo mais pobre foi sendo cada vez mais cultivado e os arrendamentos subiram. Tal renda ia para os donos da terra não porque trabalhassem. Nada faziam – e mesmo assim a renda subia. “O interesse do dono de terra está sempre em oposição ao do consumidor e do fabricante. O trigo só pode desfrutar permanentemente um preço alto porque um trabalho adicional é necessário para produzi-lo, porque seu custo de produção aumenta. O mesmo custo invariavelmente aumenta a renda; é portanto do interesse do dono da terra que o custo da produção do trigo aumente. Isso, porém, não interessa ao consumidor; para ele é desejável que o trigo seja barato em relação ao dinheiro e às mercadorias, pois é sempre com mercadorias ou dinheiro que o trigo é comprado. Nem é do interesse do fabricante que o trigo tenha preço alto, pois o alto preço provocará aumento de salários, mas não aumentará o preço de suas mercadorias.” Esse último ponto é que era o problema, naturalmente. Enquanto os trabalhadores fossem obrigados a um salário de subsistência, segundo a lei mesma de salários de Ricardo, não lhes importava que o preço do trigo fosse alto ou baixo – seus salários subiam quando o trigo subia, caíam quando o trigo caía. Mas importava aos industriais que não podiam vender suas mercadorias por mais apenas por ser mais caro o trigo, e com isso se elevarem os salários. Ricardo continua, comparando os serviços prestados pelos industriais e pelos donos de terra, constatando a inutilidade destes: “Os negócios entre o dono de terra e o público não são iguais às relações do comércio, pelas quais tanto vendedor como comprador têm de ganhar, pois no caso deles a perda recai totalmente sobre uma das partes, e o lucro totalmente sobre a outra.” Os industriais acrescentaram as leis naturais de Ricardo a suas armas contra a proteção. Queriam a abolição das Leis do Trigo e o comércio livre. O Parlamento, porém, era controlado pelos donos de terra, e por isso aquelas leis duraram muito, até 1846. Enquanto isso, alguns donos de terra, que não viam qualquer vantagem para o país em ter trigo barato, começaram a se preocupar com as condições de trabalho e os horários das fábricas. Humanitários, que gritavam pela correção dos males do industrialismo, viram-se ajudados pelos poderosos latifundiários, que desejavam vingar-se dos industriais pela sua hostilidade às Leis do Trigo. Nomearam-se Comissões Parlamentares para examinar as condições fabris e apresentar relatórios. Houve tentativas de aprovar leis, reduzindo as horas de trabalho. A oposição por parte dos industriais foi, naturalmente, tremenda, pois previam a ruína se seus trabalhadores não continuassem presos às máquinas, tal como antes. Mas os esforços conjuntos dos trabalhadores, humanitaristas e donos de terra tiveram êxito, e Leis Fabris, limitando as horas e regulando as condições, foram aprovadas. E a agitação em prol de mais restrições e regulamentos continuou. Um dos economistas clássicos, Nassau Senior, elaborou uma doutrina provando que as horas não podiam ser mais reduzidas, porque o lucro obtido pelo empregador vinha da última hora de trabalho – tirada esta, estaria eliminado o lucro, e destruída toda a indústria. “Sob a lei atual, nenhuma fábrica que emprega pessoas com menos de 18 anos pode trabalhar mais do que 12 horas por 5 dias na semana, e 9 aos sábados. Ora, a análise seguinte mostrará que numa fábrica sob tal regime o lucro líquido é obtido da última hora.” A análise de Senior baseava-se num exemplo puramente imaginário, no qual a aritmética estava certa, mas as conclusões erradas. Isso se provou sempre que uma fábrica reduzia suas horas de trabalho – t continuava em funcionamento. Muito mais prejudicial aos trabalhadores do que a última hora de Senior foi a doutrina do fundo de salário. Foi mais prejudicial porque foi adotada e ensinada pela maioria dos economistas. O princípio da última hora foi empregado para combater a agitação em favor do menor dia de trabalho; a doutrina do fundo de salário foi usada para combater a agitação em favor de salários mais altos. Os trabalhadores formavam sindicatos t faziam greve porque desejavam um aumento de salários. “Pura tolice”, diziam os economistas. Por quê? Porque havia um certo fundo posto de lado para pagamento de salários. E havia um certo número de assalariados. O total que os trabalhadores ganhavam em salários era determinado por esses dois fatores. Era isso. E os sindicatos nada podiam fazer. John Stuart Mill assim explicou a coisa: “Os salários não dependem apenas do total relativo de capital e população, mas não podem, no regime de concorrência, ser afetados por mais nada. Os salários...... não podem elevar-se, a não ser pelo aumento dos fundos conjuntos empregados na admissão de trabalhadores, ou na diminuição do número de concorrentes à admissão, nem podem cair, exceto pela diminuição do fundo de pagamento do trabalho, ou pelo aumento do número de trabalhadores a serem pagos.” Muito simples. Nenhuma esperança para os trabalhadores, a menos que o fundo de salário aumentasse ou o número de trabalhadores diminuísse. Se qualquer dos trabalhadores fosse teimoso e insistisse em que salários mais altos eram necessários para que se pudessem manter vivos, podiam dar-lhe uma lição de Matemática elementar : “É inútil argumentar contra qualquer uma das quatro regras fundamentais da Aritmética. A questão dos salários é uma questão de divisão. Reclama-se que o quociente é muito pequeno. Bem, então, quais são as formas de torná-la maior? Duas. Aumente-se o dividendo, permanecendo o divisor o mesmo, e o quociente será maior; reduza-se o divisor, permanecendo o dividendo o mesmo, e o quociente será maior.” Tudo muito simples. Duas formas de conseguir maiores salários. A segunda forma “reduza o divisor” – isto é, decresça o número de trabalhadores – era um velho conselho. Malthus lhe dera o nome de “restrição moral”. A primeira forma, “aumente o dividendo”, isto é, aumente o volume do fundo de salários, poderia ser realizada, segundo Senior, “permitindo que todos se empenhassem da forma que, pela experiência, lhes parecesse mais benéfica: libertando a indústria da massa de restrições, proibições e tarifas protetoras, com as quais a Legislatura por vezes, numa ignorância bem intencionada, por vezes com pena, e por vezes graças a um ciúme nacional, tem procurado esmagar ou dirigir mal seus esforços”. Deixem os negócios em paz e o resultado será mais dinheiro no fundo reservado aos salários. Os homens de negócios concordavam. A teoria do fundo de salários era a resposta pronta dos industriais e economistas às reclamações dos trabalhadores e sindicatos. Os trabalhadores não se importavam com ela, porque sabiam-na falsa. Sabiam que a ação dos sindicatos lhes conquistava melhores salários. Simplesmente não acreditavam haver um fundo fixo reservado antecipadamente ao pagamento de salários. O que haviam aprendido na prática foi confirmado na teoria por Francis Walker, economista norte-americano que escreveu em 1876. Walker destruiu a teoria do fundo de salários com este argumento: “Uma teoria popular de salários...... baseia-se na suposição de que os salários são pagos com o capital, com os resultados obtidos pela indústria no passado. Portanto, argumenta-se, o capital deve constituir a medida dos salários. Pelo contrário, sustento que os salários são pagos com a produto da atual indústria, e portanto que a produção constitui a verdadeira medida dos salários...... Um empregador paga salários para comprar trabalho, não para gastar um fundo que possa ter... ... O empregador compra o trabalho com o objetivo de ter o produto desse trabalho; e o tipo e o total do produto determinam quais os salários que pode pagar...... É, portanto, para a produção futura que os trabalhadores são empregados, e não porque o empregador esteja de posse de um fundo que deve gastar. E é o valor do produto que determina o total de salários que pode ser pago, e não o total de riqueza que o empregador tenha ou possa comandar. E, portanto, a produção, e não o capital, que fornece o motivo do emprego e a medida dos salários.” Prova excelente a favor da exatidão do argumento de Walker, de que os salários não são um adiantamento pago ao trabalhador pelo capital, é proporcionada pela prática comum hoje na indústria têxtil do Japão e Índia, onde os salários são “retidos”. No Japão, “os salários ganhos pelas moças que trabalham na indústria da seda ou na pequena indústria do algodão são habitualmente pagos diretamente a seu país...... Esses salários podem ser pagos semestralmente, ou, no caso da indústria da seda, no fim de um ano de trabalho, [e na Índia] os salários são pagos com um mês ou seis semanas de atraso...... As fábricas chegam a cobrar 90% de juros no caso de fazerem pequenos adiantamentos sobre o próximo pagamento, e isso de salários já ganhos”. Mas não foi necessário aguardar a prova, dada no século XX, da falsidade da teoria do fundo salarial. A classe trabalhadora a denunciou desde o começo como contrária à sua experiência. Walker deu em 1876 numerosos exemplos da vida norte-americana para provar que não havia nenhuma exatidão na teoria E sete anos antes que lançasse a última pá de terra no caixão do fundo salarial, até mesmo os economistas admitiam que essa lei natural não era absolutamente uma lei. John Stuart Mill fora o homem cujo Principles of Political Economy, publicado em 1848, muito contribuíra para popularizar a doutrina. Ao comentar um livro para a Fortnightly Review, em maio de 1869, publicou sua retratação: “A doutrina ate agora ensinada por todos, ou pela maioria dos economistas (inclusive eu próprio), negando a possibilidade de que as combinações comerciais pudessem elevar os salários, ou que limitassem suas operações a esse respeito a obtenção, um tanto anterior, de um aumento que a concorrência do mercado teria produzido sem elas – essa doutrina é destituída de base científica, e deve ser posta de lado.” Foi um ato de coragem de J. S. Mill. Cometera um erro e o confessava honestamente. Mas para os trabalhadores, era tarde demais – essa denúncia de uma doutrina que os perseguira por mais de meio século. De pouco lhes servia uma ciência que proporcionava ao inimigo todo um arsenal, sempre que os trabalhadores procuravam conseguir algum progresso; de pouco lhes servia uma ciência que praticamente não lhes oferecia esperança de melhorar de vida; de pouco lhes servia uma ciência que a todo momento servia aos interesses da classe patronal. Um dos mais destacados adeptos da escola clássica, o Professor J. E. Cairnes, admitia que os trabalhadores têm razão de desconfiar da Ciência da Economia. Em seu Essay in Political Economy, publicado em 1873, Cairnes assinalava que a Economia se tinha tornado uma arma da classe burguesa: “A Economia Política surge muito freqüentemente, em especial quando aborda as classes trabalhadoras, com a aparência de um código dogmático de regras rígidas, como um sistema de promulgar decretos ‘sancionando’ uma disposição social, ‘condenando’ outra, exigindo dos homens não exame, mas obediência. Quando examinamos a espécie de decretos que são ordinariamente dados ao mundo em nome da Economia Política – decretos que julgo poder dizer constituem apenas uma ratificação da forma de sociedade existente como se fosse mais ou menos perfeita – poderemos então compreender a repugnância, e mesmo a oposição violenta, manifestada em relação a ele pelas pessoas que têm razões próprias para não participar daquela admiração ilimitada pela atual organização industrial, experimentada por alguns expoentes populares das chamadas leis econômicas. Quando se diz a um trabalhador que a Economia Política ‘condena’ as greves, olha com desconfiança as propostas de limitação do dia de trabalho, mas ‘prova’ a acumulação de capital, e ‘sanciona’ a taxa de salários do mercado, não parece uma resposta imprevista que ‘como a Economia Política é contra o trabalhador, compete a este ser contra a Economia Política’. Não parece absurdo que esse novo código venha a ser considerado com desconfiança, como sistema possivelmente concebido no interesse dos empregadores, e que é dever dos trabalhadores esclarecidos simplesmente repudiar e negar.” Era verdade ser a Economia Política contra o trabalhador. Era também verdade ser ela a favor do homem de negócios – particularmente o da Inglaterra. Os ensinamentos dos economistas clássicos difundiram-se pela França e Alemanha, e no primeiro quartel do século XIX os livros famosos de Economia publicados nesses países foram, em sua grande parte, traduções ou exposições dos trabalhos dos economistas clássicos ingleses. MI tornou-se aos poucos evidente aos pensadores de ambos os países que a doutrina clássica não era apenas a doutrina' do homem de negócios, mas sob certos aspectos era peculiarmente uma doutrina do homem de negócios da Inglaterra. Não que os economistas clássicos estivessem conscientemente dispostos a ajudar o homem de negócios inglês. Isso não seria necessário. Pelo fato de viverem na Inglaterra numa época determinada, suas doutrinas tinham de refletir o meio. Isso ocorreu, e os economistas e homens de negócios de outros países logo o descobriram. Tomemos, por exemplo, o comércio livre. Adam Smith o defendera, e Ricardo e outros que o seguiram, também. Eram partidários de um comércio mundial livre; não só as barreiras internas deviam ser eliminadas, mas também as barreiras entre países. Ricardo defende muito simplesmente o intercâmbio internacional livre: “Num sistema de comércio perfeitamente livre, cada país naturalmente dedica seu capital e trabalho aos empreendimentos que lhe são mais benéficos. Essa busca de vantagem individual está admiravelmente ligada ao bem universal do todo. Estimulando a indústria, recompensando a engenhosi-dade, e usando da forma mais eficaz os poderes atribuídos pela natureza, ela distribui o trabalho com mais eficiência e mais economicamente : ao mesmo tempo, aumentando a massa geral de produção, difunde o bem geral e une, pelo laço do interesse comum e do intercâmbio, a sociedade universal das nações por todo o mundo civilizado. & esse princípio que determina ser o vinho feito na França e Portugal, que o trigo seja cultivado na América e Polônia, e que as mercadorias de ferro e outras sejam manufaturadas na Inglaterra.” Ricardo pode, nesse trecho, estar certo ou não quanto ao valor de troca livre e internacional de mercadorias. Mas não há dúvida de que estava absolutamente certo para a Inglaterra, na época em que escreveu. A Revolução Industrial ocorreu ali primeiro; os industriais ingleses começaram antes dos industriais do resto do mundo, estando à frente deles em métodos, em máquinas, em facilidades de transporte. Os ingleses podiam e estavam prontos a cobrir a terra com os produtos de suas fábricas. Portanto, o comércio internacional livre lhes servia. Por essa razão mesma não servia aos homens de negócios de outros países. Alexander Hamilton, na América, instituiu um sistema de tarifas protetoras na administração de Washington. Outros países também tinham barreiras tarifárias, mas sob a influência da Economia inglesa clássica, estavam começando a namorar as idéias do comércio livre. Em 1841, no momento em que os louvores ingleses às virtudes superlativas do comércio internacional livre se estavam tornando populares em outros países, Friedrich List publicou seu Sistema Nacional de Economia Política, atacando-o. List era alemão, e na Alemanha da época a indústria era ainda jovem e subdesenvolvida. Passara alguns anos nos Estados Unidos, onde verificara ocorrer o mesmo na indústria americana. Viu que, se o comércio internacional livre fosse estabelecido, seria necessário às indústrias dos dois países, atrasadas em relação à Inglaterra, um longo tempo para alcançá-la – se conseguissem. Disse ser a favor do comércio livre, mas somente depois que as nações menos avançadas igualassem as mais adiantadas. “Qualquer nação que, devido a infelicidades, esteja atrás das outras na indústria, comércio e navegação, embora possua os meios mentais e materiais para desenvolver-se, deve acima de tudo fortalecer sua capacidade individual, a fim de poder entrar na concorrência livre com nações mais adiantadas.” Disse que os preços baratos não eram tudo, e que coisas baratas podiam custar caro. O que tornava grande um país não era seu estoque de valores em determinado momento, mas sua capacidade de produzir valores. “As causas da riqueza são totalmente diferentes da riqueza em si. Uma pessoa pode ter riqueza... ... se, porém, não tem o poder de produzir objetos de valor superior aos que consome, torna-se mais pobre... ... O poder de produzir riqueza é, portanto, infinitamente mais importante do que a riqueza em si... ... Isso é mais válido para as nações do que para as pessoas particulares.” List sugere que a Inglaterra, tendo atingido a grandeza antes que o comércio livre se tornasse seu lema, tentava agora tornar impossível às outras nações progredir: “É um recurso muito comum e muito esperto que ao se atingir o cume da grandeza se lance fora a escada pela qual subimos, a fim de impedir aos outros os meios de subir atrás.” List, portanto, defende a proteção, as muralhas tarifárias, atrás das quais a indústria incipiente, tendo assegurado o mercado doméstico, pode crescer até ficar de pé sozinha. Somente depois que reunisse forças suficientes, ela poderia aventurar-se no comércio mundial livre, para lutar. List foi um expressivo expoente do sistema nacional, em oposição ao sistema internacional, em economia. Suas idéias tiveram grande influência, particularmente na Alemanha e Estados Unidos. Ele foi, com sua forte defesa da Proteção contra o Comércio Livre de Adam Smith e seus seguidores, um dos numerosos descrentes da infalibilidade da escola clássica. A Economia clássica, tão popular e poderosa na primeira metade do século XIX, começou a perder um pouco de sua força na segunda metade. Naquela época, começaram a surgir os trabalhos de um homem que, embora aceitando alguns dos princípios expostos pelos clássicos, levou-os através de caminhos diversos até uma conclusão muito diversa. Também ele era alemão. Seu nome: Karl Marx.

Desafios à Pesquisa no Serviço Social: da formação acadêmica à prática profissional

RESUMO As reflexões contidas neste ensaio objetivam chamar a atenção dos profissionais, professores e alunos de Serviço Social para a importância da pesquisa nos diferentes contextos de atuação nesta área, apesar dos desafios e dificuldades apresentados a sua realização. Apresentam-se possibilidades de operacionalização da pesquisa para uma intervenção profissional crítica, condizente com a realidade concreta - contexto da prática profissional; a sua importância para um fazer-se histórico do Serviço Social centrado em posturas teórico-metodológicas que dêem conta da riqueza, complexidade e essência da realidade, rompendo com a pseudoconcreticidade, com a práxis utilitária, manipuladora e construída na dimensão da 'consciência comum'. Apesar da importância atribuída à pesquisa, procura-se evitar que esta seja vista deslocada da realidade humano-social, já que é neste contexto que ela adquire significado, atinge a sua acepção e dá conta das necessidades do Serviço Social como profissão histórica. Palavras-chave: formação acadêmica, pesquisa, prática profissional, práxis social, transformação social. ABSTRACT The reflections contained in this essay seek to the call attention of professionals, professors and students of Social Work to the importance of research in the various contexts of activity in this field, despite the challenges and difficulties presented in its realization. It offers possibilities for conducting research from a critical professional intervention, in keeping with the concrete reality - the context of professional practice. It also highlights the importance for the preparation of a history of Social Work based on theoretical-methodological postures that consider the wealth, complexity and essence of reality, breaking with the 'pseudoconcreticity', with the utilitarian, manipulative praxis that is constructed in the dimension of a 'common consciousness'. Despite the importance attributed to research, it sought to avoid separating it from human-social reality, given that it is in this context that research acquires meaning, becomes accepted and considers the needs of Social Work as a historic profession. Key words: academic education, research, professional practice, social praxis, social transformation. DESENVOLVIMENTO A investigação que visa diretamente à essência, ao deixar para trás tudo aquilo que é inessencial, como lastro supérfluo, lança dúvida quanto a sua própria legitimidade. Karel Kosik Para se penetrar no mundo das coisas, para se entender, analisar e interpretar a realidade na sua riqueza complexa e na sua totalidade concreta tem que se desenvolver um esforço intelectivo capaz de apreender a essência delas na sua mediaticidade. Diferente do fenômeno que se pode observar na imediaticidade, a essência de uma realidade só se revela após o ato investigativo que procura no mesmo processo identificar a estrutura da realidade concreta, não na sua manifestação fenomênica, mas pela identificação das múltiplas determinações que lhes são peculiares e que lhes dão sentido e força para existir em determinado tempo e sociedade. Todavia, apesar de se reconhecer essa conduta como imprescindível por parte do sujeito cognoscente, considera-se redutora da realidade a atitude investigativa que, como diz Kosik (1976, p.57) no trecho utilizado como epígrafe deste trabalho, deixa "[...] para trás tudo aquilo que é inessencial, como lastro supérfluo [...]". Explica-se, numa ordem inversa a esse pensamento, mas sem uma configuração linear - como a realidade não apresenta a sua concreticidade de forma direta, ou seja, não se revela tal como ela é -, o homem no seu estado natural só é capaz de se aproximar da realidade superficialmente; apenas a percebe naquilo que ela manifesta e que é possível captar pelos sentidos. Essa captação, por sua vez, é resultante das forças circundantes da sua existência, e não revela, como se pode imaginar a priori, uma conduta passiva desse sujeito, mas sim a concepção que esse homem historicamente construiu sobre a realidade. Para que o homem ultrapasse o estágio do sensível e caminhe em direção à 'coisa em si', a essência da realidade, ele tem que sair da conduta contemplativa/reflexiva[1] para se por em ação pela práxis transformadora. Transformadora por não considerar o fenômeno como algo independente e absoluto, já que esse se transforma em relação com a essência e só é compreendido quando se atinge a estrutura da 'coisa em si'. Apesar de o Serviço Social, a partir, principalmente, das duas últimas décadas do século 20, ter se aproximado da vertente marxista e, em decorrência dessa 'filiação', empreendido esforços no sentido de desenvolver pesquisas utilizando o método dialético-histórico, percebe-se certa dificuldade por parte de alguns profissionais de vivenciarem a práxis como resultante da atividade do homem no seu fazer-se histórico. Em decorrência disso, existem no Serviço Social estudos que, aparentemente orientados pela vertente teórica marxista, tangenciam a prática profissional de alguns assistentes sociais que, na contra mão da história, insistem em desenvolver atos[2] desarticulados e justapostos, em espaços institucionais alheios até mesmo às orientações do positivismo. A coexistência de correntes teóricas de interesses e métodos tão diferentes tem dificultado o rompimento com a conduta norteada pela pseudoconcreticidade[3] e o desvencilhamento da compreensão que se tem da práxis como sinônimo de trabalho[4]. Aparentemente, as dificuldades são de fácil solução, mesmo se reconhecendo a força de fatores externos que mumificam conceitos, impedem que o assistente social - esteja ele no desempenho da prática acadêmica, investigativa ou de intervenção direta na realidade - desvende, por intermédio da análise dos conceitos, os significados e significâncias neles presentes, a riqueza e complexidade da coisa por ele representada; penetre enquanto agente social e profissional no pensamento do homem em ação/atividade e não no ato. Acredita-se ser essa uma das condições indispensáveis ao Serviço Social, o qual se propõe crítico e não permite a sacralização da 'prática profissional', que intervém de forma imediatista dando respostas aos problemas de identificação apenas sensível. São problemas que, muitas vezes, justificam a criação de políticas sociais reafirmadoras das facetas pelas quais a questão social se explicita, em determinado contexto e tempo, funcionando como elementos basilares do discurso instituído. Discurso propagado como verdade absoluta por alguns assistentes sociais, que são impedidos por motivos adversos à sua vontade de transformar a prática profissional em práxis social, o que, segundo Vázquez (1968, p. 200), constitui uma atividade política. Como a práxis social é uma atividade política que, conforme o mesmo autor, pode mudar as relações econômicas, sociais e políticas, ela exige o desenvolvimento de ações integradas dos diferentes setores da sociedade e não ações pontuais já que a solução dos problemas sociais não se constitui responsabilidade de uma área de saber, de determinada categoria profissional. Percebe-se que esta postura tem dificultado a prática da pesquisa, principalmente dentro da dimensão da dialética histórica, pelo Serviço Social. Entretanto, apesar das dificuldades apresentadas contribuírem para um pensar-agir dicotômico, acredita-se que a produção do conhecimento pela via da pesquisa é o caminho que possibilita o rompimento do Serviço Social com a pseudoconcreticidade, por provocar no profissional o desejo de se movimentar - enquanto pesquisador e/ou profissional responsável por ações institucionais que, aparentemente, não têm responsabilidade direta de produzir conhecimento - no sentido de fazer com que o pensar e o agir possam interagir dialeticamente. Com esse processo esperase provocar a eliminação da concepção fetichizada que se satisfaz com a aparência da coisa, desenvolvendo uma práxis utilitária, manipuladora, construída na dimensão da "consciência comum", "consciência ingênua" ou "falsa consciência" como diz Kosik[5]. Além disso, é fundamental considerar a práxis[6] como esfera do ser humano que evidencia a criação, a existência e a experiência como humano-sociais. A criação, nesse contexto, é uma realidade ontológica[7] decorrente do processo 'ontocriativo' unificador das compreensões de mundo e da realidade humana sem primado entre essas concepções. Conseqüentemente, não atribui importância maior à teoria ou à prática, ao visível (fenômeno) e à essência, evitando-se com isso a construção de percepções unilateralizantes, ou duais que preconizam o poder do saber desconsiderando o verdadeiro significado da teoria. Teoria que só atinge a sua significância quando expressa a realidade humano-social, o momento existencial dos autores e atores, razão do seu existir[8]. Quando as reflexões são transportadas para o interior do Serviço Social não se deve apenas explicitar dificuldade em assimilar e colocar em prática as exigências da dialética histórica, em vivenciar, como um todo, no seu cotidiano profissional a concretização da práxis social, mas iniciar a reflexão pela dimensão política presente no contexto das relações sociais e pela forma de inserção dessa profissão no mercado de trabalho. Por isso, a influência da forma de inserção pela via da divisão social do trabalho não pode ser ignorada quando se estuda e se analisa a construção das peculiaridades que levaram o Serviço Social, ao longo dos tempos, a trabalhar com uma identidade atribuída, em que o saber está a serviço do capitalismo. Para as pessoas mais apressadas na leitura da 'realidade', essas reflexões nada têm a ver com a temática deste trabalho, não passando de mera elucubração teórica. Respeita-se a leitura, embora se discorde do entendimento, uma vez que só pela identificação, compreensão e pelo conhecimento das condições históricas do Serviço Social pode-se identificar os desafios em relação à pesquisa e à consolidação da área como produtora e disseminadora de conhecimento, apesar de ser detentora de profissionais capacitados para a prática investigativa. O número crescente de publicações é revelador da preocupação, do interesse e/ou da necessidade do Serviço Social em desenvolver pesquisa, daí ser possível, hoje, no Brasil encontrar vasta produção de conhecimentos na área. Entretanto, quando se procura identificar os autores, logo se percebe que o esforço investigativo resulta, na sua grande maioria, de elaborações de assistentes sociais ligados à docência stricto sensu (mestrado e principalmente doutorado), ou de professores que procuram, por exigência das Instituições de Ensino Superior (IES), a titulação de mestres e doutores em Serviço Social, Ciências Sociais, Educação, Ciências Políticas, entre outros Programas de Pós-Graduação. Com raras exceções se identificam trabalhos não vinculados ao mundo acadêmico ou por exigência desse universo em seus diferentes níveis para obtenção de títulos. Essa constatação conduz a algumas indagações, que envolvem não apenas os profissionais que realizam atividades desvinculadas do ensino, mas também os assistentes sociais responsáveis pela formação acadêmica dos que procuram o Serviço Social como profissão. Daí se perguntar: como se explica a produção do conhecimento, embora tendo como objeto de pesquisa aspectos das expressões das questões sociais que justificam a existência do Serviço Social, não ser constante no fazer-se histórico da profissão? O que justifica a prática profissional descomprometida com o conhecimento da essência dos problemas sociais, da estrutura da questão social? Quais são as forças presentes no Serviço Social, para que a sazonalidade da pesquisa detectada por Setubal (1995) ainda seja tão presente no Serviço Social, apesar da crescente produção científica hoje existente e da identificação por esta autora dos "elementos influenciadores e limites que se colocam na prática da pesquisa"? São muitas as questões possíveis de serem levantadas pelas mentes inquietas existentes no Serviço Social. Por isso é que se vê como necessário o desenvolvimento da prática investigativa, não apenas para cumprir exigências institucionais de ordem acadêmica, mas também para cumprir exigências do Serviço Social como profissão historicamente situada. A pesquisa no Serviço Social deve ir além das necessidades citadas neste trabalho, pois se defende a compreensão que, conscientemente, atribui importância e que, conseqüentemente, gera necessidades fomentadas pelo compromisso político-profissional do assistente social de realizar essa atividade; das necessidades sentidas pelos autores e atores profissionais envolvidos de vivenciarem a práxis social em detrimento da práxis repetitiva, em que os gestos e os atos são efetivados em círculos determinados, e da "práxis mimétrica" que, de acordo com Lefebvre (1979, p. 39), está em um nível que apenas segue modelos que, sem saber o porquê e o para quê da ação, não atingem a criação. Somente a práxis transformadora viabiliza a criação que "[...] compreende a decisão teórica como a decisão de ação. Supõe tática e estratégia. Não existe atividade sem projeto; ato sem programa, práxis política sem exploração do possível e do futuro" (LEFEBVRE, 1979, p. 41). Apesar dos avanços do Serviço Social, principalmente iniciado com o movimento de reconceituação, que acicataram os assistentes sociais a buscar novas alternativas de prática, dessa feita articulada com as práticas concretas das classes sociais, constata-se ainda, na primeira década do século 21, vivências profissionais anacrônicas que nada lembram as conquistas históricas da profissão, sobretudo no plano teórico-metodológico. São atos que jamais serão atividades. A submersão em condutas letárgicas impede de desvelar a riqueza complexa da realidade concreta, por isso são prejudiciais ao movimento de transformação. Diante desse quadro contraditório, vivenciado pelo Serviço Social, recorremos a Martinelli (1990, p. 17) quando diz "pensar o Serviço Social: eis a tarefa". Tarefa que parece inviável sem a adoção da consciência crítica pautada na história e estruturada em consonância com a situação do homem, no processo de construção da sua vida e da vida dos outros homens e até da natureza. Marx e Engels (1977, p. 42) afirmam que a produção da vida tem "[...] dupla relação: de um lado, como relação natural, de outro como relação social - social no sentido de que se entende por isso a cooperação de vários indivíduos, quaisquer que sejam as condições, o modo e a finalidade". Vê-se com isso que a consciência do homem, longe de ser pura, é social, uma vez que é construída no "[...] interior do desenvolvimento histórico real". Assim sendo, não é a consciência que forma o homem, mas é o homem que forma a consciência de acordo com a sua situação, nas relações sociais e de trabalho (MARX; ENGELS, 1977, p. 44). Neste momento, ressurgem novas reflexões suscitadas pela proposição anteriormente apresentada - "pensar o Serviço Social: eis a tarefa". Tarefa que requer a capacidade de reconhecer as diferenças e ao mesmo tempo as relações intrínsecas entre a essência e o fenômeno tanto do ser, quanto do vir a ser do Serviço Social. Elementos que têm como exigência o respeito à sua processualidade, por ocasião dos estudos e trabalhos que, dialeticamente, têm que ser vivenciados pelo assistente social no desenvolvimento de sua prática e construção da identidade profissional. "Pensar o Serviço Social [...]" sem se deter na reflexão pela reflexão, mas pensar/agir (atividade), transformar a realidade a partir da movimentação íntima entre esses processos que, apesar de diversos, compõem a unidade, apresentam saídas para questões ambíguas, decorrentes de teorias que não dão conta da leitura crítica da realidade e nem subsidiam as respostas demandadas à profissão, face à pluralidade de problemas decorrentes das formas de manifestação da questão social. Manifestações e/ou expressões que constituem os verdadeiros objetos de trabalho do Serviço Social[9]. "Pensar o Serviço Social [...]", do ponto de vista da pesquisa, requer que exista na profissão a clareza da amplitude do projeto ético-político construído, desde a legalização da profissão no Brasil, e reconstruído a partir das bases apontadas. O conhecimento constituído possibilitará criar e/ou descobrir as conexões necessárias entre esse projeto e o mercado de trabalho. Entrar no campo desse conhecimento requer que as IES, por intermédio dos cursos de Serviço Social, tenham claramente definidos os seus projetos pedagógicos, tomando por base suas Diretrizes Curriculares. Conteúdos que viabilizem não só a inserção dos egressos do curso ao mercado de trabalho, mas também uma fundamentação teórico-metodológica, que assegure um agir-refletir crítico e uma intervenção que possa contribuir para a transformação social, cuja responsabilidade é de toda a sociedade e não somente do Serviço Social. Consideram-se inconteste as necessidades do Serviço Social (na busca de aproximação do seu objeto histórico) de procurar entender, explicar, conhecer e apreender a realidade naquilo que lhe é essencial, com o apoio de procedimentos metodológicos cuidadosamente planejados e de uma sólida fundamentação teórica; realizar análise de situações concretas iniciando com a pesquisa da prática profissional na sua contextualidade e temporalidade histórica, ou seja, apreender a prática profissional no interior das múltiplas determinações do capitalismo contemporâneo. Ao se atribuir importância à ação investigativa, longe de se negar a importância da dimensão interventiva, pretende-se mostrar a íntima relação existente entre teoria e prática e a condição de centralidade que esses processos devem ocupar na formação e na vida profissional. Devido a essa relação, o Serviço Social inscreveu a pesquisa como matéria já no primeiro currículo mínimo determinado pela Lei n. 1.889, de 13 de junho de 1953 que "dispõe sobre os objetivos do ensino do Serviço Social, sua estruturação e ainda as prerrogativas dos portadores de diplomas de Assistentes Sociais e Agentes Sociais" (BRASIL, 1996). E reafirmou a sua importância no segundo currículo mínimo por intermédio do Parecer n. 286, que foi aprovado em 19 de outubro de 1962 (BRASIL, 1962). Apenas no terceiro currículo recomendado no Parecer n. 242, aprovado em 13 de março de 1970 (BRASIL, 1970), a pesquisa não consta no elenco das matérias obrigatórias, por estar implícita no espírito integrador ensino-pesquisa da Reforma Universitária. Com início em 1977, as unidades de ensino e a maestria da Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social (ABESS, hoje ABEPSS) iniciam discussões sobre a reformulação do terceiro currículo mínimo, voltando a identificar a pesquisa como instrumento fundamental para uma sólida formação científica dos docentes e dos assistentes sociais na sua prática profissional. Dessas reflexões sobre a formação profissional resultou o quarto currículo, que foi aprovado por meio do Parecer n. 412/82, do Conselho Federal de Educação (BRASIL, 1982). Já em 1996, as Diretrizes Curriculares, que viriam a ser estabelecidas pela Resolução n. 15, de março de 2002 (BRASIL, 2002) reiteravam a matéria pesquisa como parte dos princípios básicos da formação profissional. Ao trazer para o centro a preocupação com a pesquisa, o Serviço Social reconhece a sua complexidade como profissão histórica, inserida e construída no movimento real da formação social capitalista. Procura não se contentar com a aparência da coisa, descobre caminhos que conduzem à apreensão da essência da realidade e, com isso, justifica a razão do existir da teoria e da ciência. Como diz Marx (1980, p. 939), "[...] toda ciência seria supérflua se houvesse coincidência imediata entre a aparência e a essência das coisas". Essência que só pode ser conhecida dentro da movimentação histórica. A importância da história, no contexto desta reflexão, longe de ser uma preocupação somente com o passado do objeto de intervenção e do próprio Serviço Social, tem no seu cerne as questões unificadoras do ser e do vir a ser do Serviço Social, apreensão possível, apenas, dentro da dimensão da práxis transformadora, resultante das objetivações humanas, explicitadas paulatinamente ao longo da história. Segundo Markus (1974), as objetivações são compreendidas tanto pelas forças produtivas materiais presentes na sociedade, quanto pela arte e pela filosofia. Aparentemente, esses três aspectos são insuficientes para dar conta da complexidade presente no cotidiano do indivíduo, enquanto ser particular. Contudo, constituem o tripé que sustenta as condições da vida humana; dão o design das experiências vivenciadas pelo homem, ser vivente e constituinte da sociedade, onde as leis do capital regem, de acordo com a sua lógica interna, o destino dos seus membros. Pelo exposto neste trabalho, observa-se que, do ponto de vista da perspectiva teórica aqui adotada, o homem é concebido como sujeito histórico. Pertencendo a esta categoria, o assistente social é responsável, na condição de sujeito, pelo desempenho dos papéis de ator e autor da história; tem responsabilidades pelo ser e pelo vir a ser do Serviço Social. Esses, como a consciência, não são princípios formadores do assistente social, uma vez que, como profissional dentro das relações sociais e de trabalho, é ele que direciona, influencia, contribuí e dá concretude aos elementos na profissão. Dessa forma, não se pode considerar as relações entre capital e trabalho como fator único, determinante, das condições objetivas para a construção do conhecimento nesta área. Não resta dúvida que elas são importantes, mas outros fatores permeiam as definições que põem o profissional em movimento e dão qualidade ao exercício profissional. Por esta razão, torna-se inaceitável, nos dias atuais, principalmente partindo de profissionais, há pouco tempo graduados e até pós-graduados (lato sensu), a defesa do discurso que prega ser o Serviço Social uma profissão eminentemente prática. Esse caráter constituiu a sua gênese no Brasil, por volta de 1936; foi fortemente cravado para compor o perfil do tipo de profissional que o sistema político brasileiro necessitava para dar 'resposta' à questão social, ou, melhor dizendo, às suas múltiplas expressões decorrentes: das desigualdades sociais, das injustiças sociais e da expropriação do homem, dos seus bens de produção. É verdade que essa compreensão ainda se faz útil para as regras do sistema capitalista, que precisa de respostas imediatas e de profissionais para implementar, de forma acrítica, os programas sociais de caráter paliativos, focalistas, descomprometidos com a solução dos problemas e com o bem-estar social de abrangência universal. Com o passar dos anos, mudanças ocorreram, conjunturas e estruturas político-sociais assumiram novas configurações e adotaram novos mecanismos de exploração do homem. Instrumentos mais eficazes de extração da mais-valia foram criados e novas regras de mercado adotadas, para atender exigências internacionais de implementação de uma economia globalizada. O Serviço Social como profissão historicamente construída se encontra entrelaçado por todas essas tramas, que marcam os sinais do tempo na realidade - em que o Serviço Social se efetiva -, que favorecem contradições internas no próprio sistema que as fecundam, que, paradoxalmente, favorecem o surgimento de fatos e de comportamentos suscitadores de ações que vão de encontro aos próprios interesses da estrutura que os produz. O germe da contradição há muito posto já tem a sua visibilidade no seio da categoria. A definição de redimensionar a formação e, conseqüentemente, a prática do Serviço Social já está clara, após os debates fecundos ocorridos no interior da profissão. A idéia do Serviço Social concebido como profissão eminentemente[10] prática vem sendo aos poucos eliminada pelo reconhecimento da obrigatoriedade dos profissionais de campo saberem apreender a realidade para nela introduzir mudanças. O Serviço Social na contemporaneidade tem um cenário onde os seus profissionais, no empenho de fortalecer o estatuto de produtores de conhecimento para a profissão, lançam mão de diferentes formas de análise da realidade[11]. Formas que não apenas orientam a interpretação do objeto problematizado, mas, sobretudo, expressam as tendências ideológicas presentes nas lutas políticas existentes no interior da categoria, como reflexo de uma luta mais ampla de toda a sociedade. As produções teóricas do Serviço Social são reveladoras dessas influências. Demonstram o quadro social, político e econômico em que o Serviço Social está configurado no momento da sua elaboração. Revelam a inexistência de um perfil universal para a profissão, preconizam a aproximação do assistente social da prática da pesquisa, independentemente da posição em que ele se encontra na divisão social e técnica do trabalho, seja apropriando-se da experiência enriquecedora, sistematização crítica da sua prática, do restabelecimento da relação teoria-prática, a partir do agir sintetizador e unificador, mas jamais simplificador. Já se indagou neste trabalho sobre a sazonalidade e apontou-se alguns desafios enfrentados pelo Serviço Social em relação à pesquisa. Entretanto, não se pode ignorar o aumento desse tipo de produção na área, após a saída dos primeiros mestres e doutores dos Programas de Pós-Graduação em Serviço Social. Hoje, tem-se acesso aos trabalhos resultantes de pesquisas, tanto em forma de livros, quanto de artigos científicos publicados em periódicos de reconhecimento nacional, regional e até internacional, como a Revista Serviço Social e Sociedade e a Revista Katálysis, entre outras. Isso sem se falar nas produções científicas que apenas são socializadas em eventos. Em relação a eventos e ao aumento da produção na área, vale lembrar o número de inscrições para o X Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social (ENPESS), ocorrido entre 4 e 8 de dezembro de 2006, na Universidade Federal de Pernambuco[12]: 850 pessoas entre discentes da graduação e pós-graduação, docentes, pesquisadores e profissionais de campo. Foram inscritos 1.328 trabalhos, sendo selecionados 754[13], que foram distribuídos nas seguintes modalidades: 32 mesas coordenadas; 116 pôsteres e 465 comunicações orais. Além dessas modalidades de apresentação foram ainda selecionados 21 grupos de rede de pesquisa; 62 oficinas de teses e dissertações e 64 oficinas de iniciação científica[14]. Esses números são significativos para uma profissão que ainda se apresenta jovem no mundo, que está cada vez mais a exigir a produção científica do saber. Além disso, são reveladores dos esforços, principalmente, de docentes e de discentes da pós-graduação em firmarem a pesquisa no contexto do Serviço Social. Revelam a coragem e o despertar para a importância da pesquisa logo no período inicial da formação profissional - a graduação -, apesar de as conjunturas universitárias, muitas vezes, se apresentarem adversas à produção do conhecimento, pelo privilégio do ensino na sua forma mais elementar, sala de aula, em detrimento da pesquisa e da extensão. Ao desenvolverem políticas administrativas que dificultam e até inviabilizam o desenvolvimento da pesquisa, as IES descumprem o compromisso social e político de, por se firmarem numa realidade concreta, formar profissionais com capacidade para um intervir conseqüente dentro de um projeto mais amplo de transformação da sociedade. Certamente, qualquer IES que se constrói com esse perfil claudica, por apenas sobreviver no marasmo da mediocridade intelectual. É sabido que a universidade deve se sustentar no tripé: ensino, pesquisa e extensão. Entretanto, não são raras as instituições em que esse propósito se constitui em mera falácia, já que as três atividades são escassamente vivenciadas de forma integrada. Quando existem, ocorrem isoladamente, sem a preocupação da articulação necessária entre ensino, pesquisa e extensão, sem se falar no privilégio de um sobre o outro. Acredita-se que os esforços coletivos, desenvolvidos por professores e alunos no sentido de implementar a pesquisa na universidade são fundamentais para o ensino,para a extensão e para a vida profissional. Só assim a formação acadêmica sairá do plano do ideal, do abstrato para dar corporeidade à prática profissional, seja ela desenvolvida na universidade, seja em outras instituições onde o assistente social funcionalmente se insira. É na relação pesquisa e ação, profissional e pesquisa que se adquire maturidade intelectual, que se desmistifica o aparente como realidade concreta, que se reconhece na realidade a sua complexidade e riqueza ao se constituir como totalidade. A pesquisa é um dos procedimentos teórico-metodológicos que, ao ser incorporado à prática profissional, poderá levar o assistente social a reinventar, reconstruir e até construir um vir a ser para o Serviço Social, a partir da eliminação da consciência acomodada e até adormecida. Permite uma auto-análise e revisão permanente dos que a praticam, uma compreensão do outro, com mais tolerância; o repensar o dito, o obrigado a ouvir e a aceitar, por ser procedente da autoridade produtora do conhecimento já reconhecido no meio da intelectualidade, ou da autoridade decorrente da função institucional. Ainda com a sustentação no estudo e na pesquisa, percebe-se que cada discurso é apenas uma forma de compreensão da realidade e não uma verdade absoluta sobre ela. Inumeráveis são as vantagens da pesquisa, para os que a praticam. Mas essa importância tem que ser exaltada desde os momentos iniciais da graduação por todos os que têm a missão de contribuir com uma postura interdisciplinar, com uma formação profissional aliada às demandas do mercado, com a fundamentação teórico-metodológica e com o projeto ético-político da profissão. Sem a pretensão de aprisionar a formação profissional ao espaço institucional universitário, já que se percebe a graduação como o momento inicial, finito desse processo, e a formação profissional numa perspectiva de totalidade como processo que se dá no infinito, não se pode negar que a universidade constitui o útero que acolhe e desenvolve, nos primeiros momentos de existência os futuros pesquisadores. Daí o destaque das IES em relação à produção do conhecimento; daí a responsabilidade dessas instituições em ter nos seus quadros professores com qualificação para pesquisa, independentemente de serem professores das disciplinas de pesquisa; em ter a obrigação de garantir nos cursos de Serviço Social as orientações das Diretrizes Curriculares, cuidadosamente trabalhadas pelas unidades de ensino sob a maestria da ABEPSS. Ao se asseverar que todos os professores tenham capacidade para desenvolver pesquisa, e que assumam esse processo como parte do seu fazer profissional como docente, não se tem a pretensão, pelo contrário se considera abominável, de defender a postura de que todos os docentes, por terem a titulação de mestre e de doutor, estejam aptos a assumirem as disciplinas de pesquisa. Estas têm especificidades que vão além da mera transmissão dos conhecimentos da metodologia da pesquisa, pois exigem uma identificação profunda com a produção do conhecimento, um apaixonamento com a prática, a vivência, a maturidade intelectual, o conhecimento do curso e das discussões presentes no Serviço Social e na sociedade. Pelos motivos citados (e há outros que não cabem no espaço deste ensaio) é que se defende a depuração, assim como é feito para as demais disciplinas constituintes da grade curricular dos cursos de Serviço Social, de profissionais para terem na prática docente a nobre missão de contribuírem de forma mais efetiva e direta com a formação do assistente social pesquisador. Não adianta aos cursos de Serviço Social terem um currículo com muitas disciplinas de pesquisa se não lhes for atribuído o valor que realmente a produção do conhecimento deve ter na formação e na vida profissional; se nelas forem desenvolvidos conteúdos programáticos desarticulados do conteúdo das demais disciplinas curriculares, em que não é oportunizado ao aluno problematizar as facetas pelas quais se manifesta a questão social. Não adianta, ainda, haver várias disciplinas de pesquisa se a preocupação com o questionamento da realidade, com o conhecimento ontológico e a construção epistemológica verifica-se apenas nelas mesmas, não representando preocupação dos demais docentes no seu objetivar-se em sala de aula. É indubitável que o Serviço Social vive um novo tempo. Tempos novos, novos tempos que gravaram na memória dos seus protagonistas as marcas da incerteza, do medo em relação ao confronto com as estruturas opressoras; do medo do novo, do desconhecido, do não vivido. Tempo de recolhimento intelectual Tempo de inventar/descobrir habilidades Tempo de despertar interesses até então latentes Tempo passado, tempo presente; tempo futuro Tempo finito, tempo infinito ..., o tempo Tempo da busca, da procura do conhecer Tempo de perscrutar a realidade Tempo de construir, desconstruíndo o todo de forma organizada Tempo de não escamotear as contradições e enfatizar as convergências Tempo que é o tempo do Serviço Social no seu historicizar-se Tempo em que constrói o seu ser e vir a ser Tempo do enfrentamento aos desafios da pesquisa Tempo de repensar a formação e prática profissional. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 1.889, de 13 de junho de 1953. Dispõe sobre os objetivos do ensino do Serviço Social, sua estruturação e ainda as prerrogativas dos portadores de diplomas de Assistentes Sociais e Agentes Sociais. Lex: coletânea de Legislação e Jurisprudência. São Paulo: v. 8, 1996. (Legislação Federal e Marginalia). ______. Conselho Federal de Educação. Do parecer no tocante aos aspectos fundamentais a formação profissional do assistente social. Parecer n. 286, aprovado em 10 de outubro de 1962. Relator: José Barreto Filho. Brasília:Documenta, p. 105-107, 1962. ______. Conselho Federal de Educação. Do texto apresentando nova redação ao parecer aprovando as modificações apresentadas pela ABESS, no que se refere ao desdobramento da disciplina 'Metodologia do Serviço Social'. Parecer n. 242 aprovado em 13 de março de 1970. Relator: Relator Newton Sucupira. Brasília: Documenta, p. 221-223, 1970. ______. Resolução CNE/CES 6, de 23 de setembro de 1982. Fixa os mínimos de conteúdo e de duração do Curso de Serviço Social, com base no Parecer n. 412/82, homologado pela Ministra da Educação. Brasília, 1982. ______. Resolução CNE/CES 15, de 13 de Março de 2002. Estabelece as Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social. Diário Oficial da União. Brasília, 9 abr. 2002, Seção 1, p. 33. KOSIK, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976. LEFEBVRE, H. Sociologia de Marx. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1979. LUKÁCS, G. Ontologia do ser social: os princípios ontológicos fundamentais de Marx. São Paulo: Ciências Humanas, 1979. MARKUS, G. Teoria do conhecimento no jovem Marx. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. MARTINELLI, M. L. Serviço Social: identidade e alienação. São Paulo: Cortez, 1990. MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Grijalbo, 1977. MARX, K. O Capital: crítica da economia política. Tradução de Reginaldo Sant'Anna. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. liv. III, v.6, cap. 48. SETUBAL, A. A. Pesquisa em Serviço Social: utopia e realidade. São Paulo: Cortez, 1995 VÁZQUEZ, A. S. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. [1] Aqui, lembra-se de Marx e Engels (1977, p 14) quando criticaram o materialismo intuitivo de Fuerbach dizendo em sua XI tese que os filósofos se limitaram a 'interpretar' o mundo de diferentes maneiras; o que importa é 'transformá-lo'. Será que se pode dizer o mesmo em relação ao assistente social? [2] Vázquez (1968, p. 185-186), ao definir práxis, fala da importância de se distinguir atos de atividade, de se estudar a categoria atividade, uma vez que eles não se constituem em sinônimos. Segundo o autor, para que o ato se transforme em atividade faz-se necessário que, desde a sua estruturação, ele esteja articulado como elemento de um todo, "[...] ou de um processo total que culmina na modificação de uma matéria prima". [3] Termo utilizado por Kosik (1973, p. 19) para designar os produtos do homem como elementos autônomos e reduzir o homem " [...] ao nível da práxis utilitária". [4] Apesar de a práxis na filosofia materialista estar presente e se articular em todas as manifestações do homem, e que nessa articulação ela determina a sua totalidade, não se pode confundi-la com trabalho. Isso porque na dialética histórica embora toda práxis seja trabalho, nem todo trabalho se constitui práxis [5] Segundo Kosik, em obra já citada neste trabalho, é a consciência que toma como seus os resultados dos estudos filosóficos e elabora uma concepção de mundo e realidade de forma acrítica. [6] A práxis aqui referida, desejada e que se defende para o Serviço Social é a práxis social por ter caráter político que se identifica aos interesses da sociedade. Esse tipo de práxis, segundo Vázquez (1968, p. 201), utiliza-se de estratégias e táticas. Em relação à primeira, a atividade desenvolvida a partir da práxis social desenvolve-se de forma processual e em consonância com as necessidades de determinado momento da história geral. Enquanto isso, a segunda procura dentro do momento histórico "[...] cumprir a linha política [...]" necessária, no momento histórico geral para que seja instalada uma nova sociedade. [7] Adjetivo referente à ontologia. Ontologia é uma palavra de origem grega usada para representar a parte da filosofia que segundo Aristóteles especula o "ser enquanto ser". O ser é a essência onde se encontra a verdade. É o lugar que dá origem ao pensamento da identidade enquanto singularidade. Neste trabalho o termo é usado para atribuir adjetivação não ao ser em si mesmo, mas ao ser enquanto elemento histórico e que, por isso, se constrói e se reconstrói nas relações histórico-sociais. Para aprofundamento dessa compreensão, ver também Lukács (1979 [8] Nessa perspectiva, a teoria é resultante dos momentos laborativo (atividade objetiva) e existencial (formação da subjetividade) do homem. Esses momentos guardam estreita intimidade entre si, não sendo possível, por isso, concebê-los desligados. Quando ocorre o desligamento, a teoria se transforma em auxiliar da práxis, subsidia técnicas manipuladoras da realidade e do ser humano, ao mesmo tempo em que fortalece o discurso 'saber é poder'. [9] Sendo a questão social resultado da contradição capital/trabalho, a sua essência está presa à essência do capitalismo. Por isso, assim como no capitalismo, a sua essência tem permanecido inalterada ao longo dos tempos modificando-se apenas as suas expressões. [10] Sabe-se que o Serviço Social na sua essência não mudou. Continua sendo uma profissão de caráter prático. O que aqui se coloca é que ele perdeu a condição de 'eminentemente prático' pela vasta produção de conhecimento pela via da pesquisa. Hoje se tem um Serviço Social, não resta dúvida, mais amadurecido teoricamente e com capacidade para entender a realidade e nela atuar com mais competência e eficiência. [11] Graças a esse esforço é que o Serviço Social hoje é reconhecido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) como área de conhecimento. [12] A procura de espaços para a socialização do conhecimento vem crescendo no Serviço Social. Basta observar o número de inscritos do I ao X ENPESS, sem se falar nos congressos, fóruns de debates e simpósios promovidos por entidades representativas da categoria. [13] Comunicado do X ENPESS com base nos trabalhos selecionados até 24 de outubro de 2006. [14] Segundo a Coordenação Geral do X ENPESS, 270 alunos da graduação se inscreveram para participar desse Encontro. Essa demanda já reflete que a pesquisa aos poucos penetra na graduação sob forma de Iniciação Científica. Acredita-se que é uma decorrência das Diretrizes Curriculares que exigem a inclusão de disciplinas de pesquisa nos currículos das unidades de ensino em Serviço Social, e do incentivo dado ao aluno na forma de bolsa de Iniciação Científica. Segundo dados, obtidos por informação verbal, de pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Serviço Social (ABEPSS), "[...] na avaliação da implementação das diretrizes curriculares", em 2006, o número de disciplinas de pesquisa constatado nos cursos de Serviço Social do Brasil é em média de seis disciplinas. Em nenhum curso foi identificada a existência de apenas uma disciplina.