"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

domingo, 18 de setembro de 2011

SATÃ VIVE

(Sugerido por Vilma Balbi e inspirado na leitura da obra O DIABO NO IMAGINÁRIO CRISTÃO, do Prof. Carlos Roberto F. Nogueira - Obrigado a ambos) Ninguém jamais recebeu tantos nomes. Nenhum ser excitou tão intensamente a imaginação humana ao longo dos séculos. Num mundo dominado pelo computador e pelas comunicações, com tecnologia, educação e informação em larga escala, imaginou-se até que não haveria mais lugar para ele. Engano. No alvorecer do terceiro milênio ei-lo aí, vivo e atuante, ainda que transformado e sem os superpoderes de antigamente. Ele – Asmodeu, Belzebu, Azazel, Belial... entre os muitos nomes com os quais os antigos hebreus o rotularam. Ou Iblis, como dizem os muçulmanos. Ou Arimã, como o chamavam os seguidores de Zoroastro, na Pérsia. Ou simplesmente, como bem o sabem os brasileiros temerosos de mencionar-lhe o nome, o Rabudo, o Tinhoso, o Sujo, o Beiçudo, o Pai da Mentira, o Coxo, o Cão. Senhores, eis Satanás, o Demo, o Diabo, a mais intrigante das figuras que povoam o imaginário ocidental. O Diabo chega ao século XXI deitado sobre a fama. Não mais aparece em murais com a aparência grotesca de um bode alado, coroado de enormes chifres, com rabo de dragão e olhos nas asas, na barriga e no traseiro. Há muito seu nome foi retirado do Pai Nosso, a principal oração cristã. Ele já não é acusado em toda parte de estar por trás das doenças, das hecatombes, das tragédias do cotidiano. Não, o Diabo teve que ceder aos progressos da ciência, à liberdade de pensamento e ao avanço da razão sobre a superstição um considerável naco de suas habilidades. Mas é inegável que, quase reduzido à quintessência de uma idéia, ele continua influente em nossos dias, qualquer que seja a classe social e o nível cultural das pessoas, respeitadas aí as diferenças de interpretação. Não é exagero dizer que, de certa forma, Satã tem sido revalorizado nos últimos tempos. Nos Estados Unidos, símbolo de sociedade regida pelos ideais iluministas e maior centro científico e tecnológico do planeta, o número de exorcistas autorizados pela Igreja Católica cresceu mais de dez vezes nos últimos dois anos. Antes, o país tinha apenas um. Na França, no mesmo período, os exorcistas saltaram de 15 para 120. Em todo o mundo desenvolvido, o Demônio e os seus sequazes continuam a rodar a roda da fortuna na literatura e na indústria do cinema (até o velho "O Exorcista", de 1973, voltou às telas apimentado com cenas cortadas na versão original). Em países ricos ou pobres Satã não pára de estimular debates, teses e, principalmente, facilitar as manipulações do jogo político – afinal, satanizar o adversário sempre foi uma arma afiada em qualquer disputa. Entre fundamentalistas islâmicos, Iblis ganhou as cores da bandeira dos Estados Unidos, país rotulado pelos radicais como o "Grande Satã". Foi contra o Diabo, em última instância, que os terroristas liderados por Osama Bin Laden lançaram os aviões que derrubaram as torres gêmeas de Nova York, em setembro de 2001. E foi a mão malvada do Demo que, para muitos americanos, guiou os comparsas de Bin Laden naquela manhã. Era para impedir-lhe a ação subversiva, por meio da liberação dos costumes, que no Afeganistão os talibãs impunham às mulheres o sufoco das burkas. Da Europa pós-moderna aos grotões da África, Belzebu prosseguiu inspirando extravagâncias e violências. Enfim, como não poderia ser diferente numa sociedade marcada pelo sincretismo, Belial encontrou no Brasil um campo vastíssimo para suas trapalhadas. "O Diabo é a origem das doenças, da miséria, dos desastres e de todos os problemas que afligem o homem desde que ele iniciou sua vida na Terra", afirma o fundador e bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, em seu livro Orixás, Caboclos e Guias – Deuses ou Demônios?, uma das 26 obras nas quais o religioso tenta convencer a humanidade de que Satã existe e exerce poder quase absoluto sobre as pessoas. Sua Igreja, uma das que mais crescem no segmento neopentecostal, começou apoiada nos pobres – os que mais se sensibilizam com os exorcismos espetaculares realizados em seus templos -, mas logo penetrou a classe média, desiludida com os meios convencionais de solução de seus problemas. Após 25 anos de atuação, já é possível ver nos cultos da Universal alguns novos ricos preocupados em manter a prosperidade. O que busca a multidão que não se importa de engordar o caixa da Igreja do bispo Edir com doações generosas? A garantia de que Azazel, aprisionado pelas orações dos pastores, não mais atrapalhará seus negócios, sua saúde, seus desejos. A Igreja Católica, que até meados do século passado, oferecia ao mundo o retrato mais detalhado - e terrível – do Tinhoso, decidiu retocá-lo numa adaptação aos novos tempos. Mas que ninguém se engane: o Demônio católico, despido de sua aparência ridícula, não virou um mero símbolo, a não ser para alguns poucos religiosos revisionistas. O Vaticano exorta os fiéis a considerá-lo "a causa do mal", cuja presença evidencia-se desde a crença de que a felicidade se encontra no dinheiro, no poder e na concupiscência carnal ao relativismo que induz o homem a não atender "à vontade de Deus". Satã tornou-se assim sutil e requintado, mas ainda individual e poderoso ao ponto de apossar-se de seres humanos, como esclarece o documento oficial De Exorcismis et Supplicationibus (De todos os Gêneros de Exorcismos e Súplicas), de 1999. Ao argumentar nesse sentido, o papa João Paulo II retoma o tema do poeta francês Charles Baudelaire, no século XIX, segundo o qual "o mais belo estratagema do Diabo seria o de nos persuadir de que ele não existe". O papa não tem dúvida: o Demo trabalha de modo a que "o mal que ele inculca desde o começo se desenvolva no próprio homem, nos sistemas e nas relações inter-humanas entre as classes sociais e as nações". Mas, afinal, quem é o Diabo? Desde quando ele está entre nós? Que o papel ele desempenha no mundo atual? Historicamente, Satã, do jeito como o visualizamos no ocidente – um ser que concentra em si a maldade absoluta – é resultado de uma longa gestação psicológica na qual os arquétipos (imagens psíquicas do inconsciente coletivo que, segundo Carl Jung, estruturam modos de compreensão e comportamento) do mal foram ganhando formas concretas em processos de transferência e sincretismos. O Demônio fascina a humanidade, talvez porque nele identifiquemos a expressão maior dos impulsos primários que nos submetem e o combustível dos dilemas que nos angustiam. É a sombra que se faz inseparável do homem e teima em mostrar-se em seus esforços mais sublimes. No Novo Testamento, base da doutrina cristã, há mais citações sobre o mal do que acerca do bem, mais referências a Satã do que a Deus. "No cristianismo a presença do mal é essencial como em nenhuma outra religião", diz o filósofo Roberto Romano, da Universidade de Campinas (Unicamp). O primeiro rascunho do Rabudo teria surgido no século VI antes de Cristo, na Pérsia. Ali, o profeta Zoroastro (Zaratustra) descreveu a figura de Arimã, o "príncipe das trevas" em seu permanente conflito com Mazda, o "príncipe da luz". Eram essas duas divindades, que expressam a polaridade existente no universo, que regiam o mundo de Zaratustra. Durante o cativeiro na Babilônia, os hebreus tiveram contato com o masdeísmo persa, fato que, conforme alguns historiadores, foi fundamental para a concepção do que viria a ser o Satã do judaísmo e do cristianismo. Na antiga língua hebraica, Satanás quer dizer apenas acusador, caluniador, aquele que põe obstáculos. E foi assim, sem a face aterrorizante que ganharia mais tarde, que o Diabo estreou no Velho Testamento. Agia, então, como uma espécie de colaborador de que se servia Jeová (Deus) para testar a lealdade ou castigar os seus escolhidos. Jeová, por exemplo, determinou a Satã que precipitasse o desobediente rei Saul no poço da depressão. Sob a mesma autorização divina, o Satã infligiu pesadas perdas e sofrimentos ao rico e fiel Jó, no desenrolar de um aposta na qual Jeová jogou todas as fichas na lealdade de seu servo. Na mesma linha dos deuses pagãos, que eram ambivalentes, Jeová também expressava paixões contraditórias, semelhantes às do homem, e distribuía com exclusividade tanto o bem quanto o mal. Os primitivos hebreus não tinham necessidade de corporificar uma entidade maligna. Para eles Jahveh (Jeová) era um deus tribal e, como tal, superior aos deuses das populações vizinhas, que se colocavam assim como seus adversários e como expressões naturais da maldade. Não surpreende, portanto, que ao ganhar contornos de entidade, o Diabo tenha recebido nomes como Belzebu, um deus filisteu, e Asmodeu, deus da tempestade na mitologia persa. A influência persa, forneceu o pano de fundo dualista no judaísmo, por meio da assimilação da crença em espíritos benéficos e maléficos, os gênios da religião de Zoroastro. Os anjos, antes vistos como símbolos da manifestação divina, foram transformados em entidades autônomas, enquadradas numa hierarquia que justificaria a lenda da revolta de Lúcifer, o serafim mais belo e mais próximo de Deus (lúcifer quer dizer "portador de luz"), expulso do céu e metamorfoseado no Demônio após se deixar dominar pela soberba. A mudança de perspectiva teológica se tornará mais evidente a partir do século II antes de Cristo, com o desenvolvimento, à margem da tradição judaica erudita, de uma rica literatura sobre o demoníaco, de tom apocalíptico. No Livro dos Jubileus (135-105 a.C.) são mencionados os espíritos malignos acorrentados no "lugar da condenação" . No Testamento dos Doze Patriarcas (109-106 a.C.) pela primeira vez Satã aparece personalizado na figura de Belial. As crenças populares acerca do Diabo chegaram a ser assimiladas pela elite judaica, razão pela qual muitos "doutores da lei" acusaram Jesus de promover os seus milagres "sob o poder de Belzebu". Com o tempo, porém, os rabinos perderam interesse nessas versões e Satã voltou a ser uma figura menor no judaísmo. Ao contrário, os cristãos não apenas introduziram em sua doutrina os elementos da literatura escatológica, como também ampliaram-lhe os limites concedendo poderes colossais ao Demônio. Os Evangelhos, os Atos dos Apóstolos, as epístolas de Paulo e o Apocalipse do apóstolo João são pródigos em referências à luta de Satã contra Deus, retomando a lenda inicial de Lúcifer e seus aliados – nada menos que um terço dos anjos - na batalha celestial ocorrida nos primórdios da criação. De qualquer modo, a corporificação do Diabo cristão consumiu pelo menos 400 anos de debates e só veio a consolidar-se no século VII com a ajuda da arte cristã. É quando a figura monstruosa de Satanás se multiplica nos vitrais, colunas e tetos dos templos, é mostrada em murais nas ruas, assume a imaginação de clérigos e do povo e abre caminho para as práticas mais obscuras da Idade Média, cujo ápice é a instituição dos tribunais da Inquisição. Tal lentidão é compreensível. Nos três primeiros séculos, os cristãos, membros de uma seita perseguida, certamente não precisavam imaginar uma face para Satã, já que a conheciam sob a forma de gladiadores e leões que os trucidavam nas arenas romanas. No século IV, quando o império romano curvou-se ao cristianismo, uma onda de euforia alastrou-se entre os fiéis, que viam nos sucessos da ação proselitista sinais do enfraquecimento do adversário de Cristo e sua iminente derrota final. Mas logo a persistência de conflitos, desigualdades e paixões depois desse grande marco arrefeceu o otimismo e acabou por sedimentar a crença de que a força de Satanás era bem maior do que se imaginara. Precaver-se contra suas manhas e combater permanentemente o seu trabalho maléfico tornaram-se, então, uma obsessão. Na Idade Média, como ainda hoje, entre as seitas fundamentalistas, via-se o Diabo e seus auxiliares por toda parte. Imaginava-se pactos entre homens e Satã, em troca de fortuna, conhecimento e poder - tema cujo paradigma é a história de Johannes Faustus, de Heidelberg (1480-1540), retratado mais tarde em Doutor Fausto, o famoso drama de Goethe. Acreditava-se que, enquanto dormiam, mulheres podiam ser possuídas sexualmente por demônios chamados de íncubos, enquanto homens eram atacados por demônios súcubos, travestidos de belas mulheres. Eremitas do deserto se diziam tentados diretamente por seres infernais com apelos luxuriantes. O sexo tornou-se a armadilha predileta de Satã para conduzir os homens à perdição, o que justifica uma das mais conhecidas representações iconográficas do Demo – aquela em que ele aparece com patas de bode, olhos oblíquos e chifres, tomados por empréstimo à imagem de Pã, divindade greco-romana que se divertia em orgias. O Diabo era apontado como a causa de quase todas as doenças. Os médicos medievais, para livrar a própria pele, afirmavam que a simples impossibilidade de diagnosticar a enfermidade era em si um sinal de que se estava diante de um caso de possessão demoníaca. Satã podia entrar no corpo, segundo a crença popular, através dos orifícios, razão pela qual nos países anglo-saxônicos até hoje saúda-se o espirro, então visto como a expulsão de um demônio, com a frase "Deus o abençoe". O Tinhoso também costumava ocultar-se sob mil disfarces, em lances dignos de um conto de fadas. Que o diga o papa Gregório Magno, em cujos Diálogos está registrado o caso de uma pobre freira, endemoniada porque colhera alface na horta do convento sem a devida oração – Belzebu, espreitara-lhe, escondido nas folhas da singela planta. A histeria coletiva e o jogo político nos bastidores da vida religiosa nesse período levaram milhares de pessoas a arder nas fogueiras da Inquisição, o jeito piedoso estabelecido pela Igreja para "salvar" a alma de quem se deixasse ludibriar pelo Demo. Com o tempo, as imagens e a nomenclatura demoníaca, sempre relacionadas aos deuses que guerrearam contra Jeová e às divindades e tradições pagãs abominadas cristãos (é bom lembrar que a palavra demônio deriva do grego daimon, que significa tão somente espírito ou gênio), foram sendo enriquecidas conforme os novos adversários definidos pelo catolicismo. No período das Cruzadas, a figura de Satã ganhou pele morena e barbicha que o identificavam com os árabes. Com a chegada dos primeiros missionários ao Oriente, logo Sita e Rama, deidades do hinduísmo, se tornaram codinomes do Diabo. O que isso quer dizer é mais ou menos óbvio. "Significa que Satanás é o inimigo, é aquele que não concorda conosco", diz Elaine Pagels, professora de história da religião na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Tem sido assim até hoje. Para a especialista, autora do livro As Origens de Satanás, esse adversário sequer precisa ser alguém distante e estranho. Na maioria das vezes é um inimigo íntimo, o companheiro, o colega, o irmão divergente – o herético que afronta a crença imposta pela organização religiosa com idéias próprias. O começo da era moderna na Europa seria marcada por um enorme medo do Demônio, um momento psicológico retratado na trama da Divina Comédia, de Dante, e na assustadora iconografia do inferno presente na arte renascentista: demônios desenrolando os intestinos dos invejosos e enterrando ferros em brasa nas vaginas de mulheres levianas, pântanos fumegantes onde animais asquerosos atacam as almas pecadoras. O surgimento da imprensa e as reformas religiosas conferiram a Satã difusão e superpoderes ainda mais amplos. A didática do medo na catequese cristã parecia embutir um prazer estético com o mal. Belial mostrava-se à vontade mesmo após a vitória da revolução francesa e a conseqüente separação entre a Igreja e o Estado, no final do século XVIII. Mas, fora do círculo religioso, sua imagem começara a sofrer uma mutação radical. O romantismo, em rebelião contra o autoritarismo católico, transformou Satã num símbolo do espírito livre, da ciência, do progresso e da revolta contra a moral tradicional – um aliado do homem condenado ao sofrimento. Em Fausto, de Goethe, a visão do demoníaco reflete não apenas a questão do mal, mas também o problema do conhecimento e o desejo do homem de dominar as forças da natureza. O Diabo entrou no século XX como um personagem mais comportado, apesar de sua popularidade, da proliferação de seitas que lhe reverenciam os atributos mitológicos e da sua enorme utilidade como marketeiro, dentro e fora da religião. Pagou um preço alto por essa inesperada secularização, sob a forma de perda do respeito que sua figura sempre inspirou. Para alguns estudiosos do comportamento social, isso não é um bom sinal. "Trata-se de uma situação perigosa, pois significa que o mundo moderno está perdendo o senso do mal", diz Jeffrey Burton Russel, professor da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, nos Estados Unidos. "E sem o senso do mal a civilização pode desagregar-se, ir direto para o inferno". Mas, então, podemos deduzir que Satanás, enfraquecido, anda sem utilidade nos dias atuais? Não é bem assim. No início deste texto dissemos que o Diabo está vivo, desafiando os que achavam que não haveria mais lugar para ele num mundo regido pela ciência e pela razão. E, a julgar pelo cotidiano do homem moderno, também prossegue ocupado, muito ocupado. Na política (como na religião) a satanização do adversário continua em alta, do confronto entre os americanos e fundamentalistas islâmicos às disputas paroquiais entre os partidos brasileiros. Nos negócios da indústria cultural ou nos das igrejas apocalípticas, como em todos os empreendimentos nos quais sua imagem é utilizada para chocar, assustar ou simplesmente divertir, Satã é garantia de produto competitivo e de lucro certo. No plano psicológico, enfim, o Beiçudo continua imbatível na função de livrar o homem do fardo da culpa. Nesse sentido, o Diabo é um grande achado, dizem psicólogos e psicanalistas. Graças à crença na existência de um Príncipe das Trevas, as vítimas dos infortúnios não se sentem responsáveis por eles. Há mesmo quem se beneficie dos préstimos do Demo para fazer o mal por interposta pessoa – como nos casos de magia negra –, apoiado na sensação de impunidade decorrente de tal expediente. "As pessoas atribuem ao outro algo que está em suas atitudes, em seu inconsciente", afirma o psicanalista Renato Mezan. Satã, por tudo que já foi dito e escrito, é esse "outro" talhado para cumprir o papel de bode expiatório. A verdade é que, embora a plasticidade de suas manifestações e representações ao longo dos séculos, o Diabo tornou-se algo indispensável ao pensamento cristão e à filosofia ocidental. Com ele, é possível explicar de modo simples a existência do mal, justificar a concepção de Deus como um ser perfeito em sua bondade e dar sentido aos permanentes dilemas da vida. Com ele, fica mais fácil esclarecer, nos limites do mesmo pensamento cristão, a capacidade divina para ordenar a criação em relação a seus fins. Sendo agente tentador, o Diabo força o homem a optar, cria condições que o obrigam a decidir, o que em última análise tem um sentido potencialmente positivo.

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