"Pensar que o homem nasceu sem uma história dentro de si próprio é uma doença. É absolutamente anormal, porque o homem não nasceu da noite para o dia.Nasceu num contexto histórico específico, com qualidades históricas específicas e, portanto, só é completo quando tem relações com essas coisas.Se um indivíduo cresce sem ligação com o passado, é como se tivesse nascido sem olhos nem ouvidos e tentasse perceber o mundo exterior com exatidão. É o mesmo
que mutilá-lo."Carl Jung

domingo, 7 de agosto de 2011

A (DES)ARRUMADORA

É admirável Dilma ter obrigado as autoridades acusadas de malfeitos a comparecer ao Congresso Nacional para prestar contas. Merece aplausos. Mas é também evidente que ela vai surfando nas ondas -as importantes e as desimportantes- com o objetivo de livrar-se do pedaço, ou dos pedaços, que a incomodam na herança Algo parece bastante desarrumado na condução política do governo Dilma Rousseff. E aqui não vai qualquer observação sobre ministros, ou ministras, porque conduzir politicamente o governo é tarefa indelegável do presidente da República. Ou da. Consta que o futuro ex-ministro da Defesa andou falando mal da colega da articulação política, desdenhou da capacidade de ela cumprir a tarefa. Desmentir é de praxe, mas na política a verdade e a verossimilhança dançam de rosto colado. Na glória e na desgraça. Ministros falarem mal uns dos outros para jornalistas (com o compromisso de não publicar, claro) é mais previsível e corriqueiro em Brasília do que a seca. Talvez algum dia as mudanças climáticas façam chover torrencialmente lá nesta época do ano. Mas nesse dia continuará a haver, com 100% de certeza, algum primeiro escalão atrás de coleguinhas da imprensa para falar mal de outro. O que importa a opinião de Nelson Jobim sobre Ideli Salvatti? O mesmo tanto que a opinião dela sobre ele. Nada. E qual a importância de a chefe da Casa Civil "não conhecer Brasília"? Ela não é a secretária de Turismo do Governo do Distrito Federal. É a ministra-chefe da Casa Civil. Com a caneta na mão, certamente encontrará quem lhe explique rapidamente tudo o que deve saber. E o que não. Como um dia alguém explicou ao próprio Jobim. Perceba o leitor a desimportância do tema. Eu nem deveria estar escrevendo sobre isso. Para não desperdiçar o seu precioso tempo com desimportâncias. Aliás, a respeito das ditas cujas quem deu o tom correto foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, animal político até o último átomo, quando discorreu sobre o (ir)relevantíssimo tema de quem votou em quem na eleição. A presidente da República degusta nas semanas recentes um cardápio variado de encrencas. Todas elas compatíveis com sintomas de envelhecimento governamental. Porque o governo Dilma é novo, mas também velho, visto que sua excelência aceitou a hegemonia absoluta do vetor de continuidade. Agora colhe os resultados. Ou então ela própria os provoca, ao abrir caminho para a amplificação das crises. Justiça se faça, é admirável ela ter obrigado as autoridades acusadas de malfeitos a comparecer ao Congresso Nacional para prestar contas. Merece aplausos. É uma bela contribuição aos hábitos políticos nacionais. Mas é também evidente que Dilma vai surfando nas ondas -as importantes e as desimportantes- com o objetivo de livrar-se do pedaço, ou dos pedaços, que a incomodam na herança. E, assim, o método que parece uma bagunça pode ser lido como portador de alguma racionalidade. Inclusive no uso inteligente da opinião publicada. E o desimportante adquire estatura ao lado do importante. Comecei este post notando que algo parece bastante desarrumado na condução política do governo Dilma. E que a responsabilidade nesses casos é sempre do chefe. Quem está desarrumando o governo é a própria. Num extremo, o subestimador dirá que ela vem engolfada pelas ondas sucessivas. No outro, o superestimador defenderá a suposta genialidade estratégica da chefe do governo. A verdade, como sempre, deve estar em algum ponto intermediário. A presidente, antes de tudo, parece ciosa do poder dela. Numa combinação de instinto, intuição, cérebro e fígado vai ajudando a desfazer o que recebeu, vai empurrando para fora do barco quem cujo peso representa risco para a embarcação. E, unindo o útil ao agradável, lança ao mar também quem se acha mais capaz que ela de ocupar o posto de comando. O risco é sabido. Reunir no campo adversário uma massa crítica com capacidade de desestabilizar o governo. Com o grau de confiança que exibe, sua excelência certamente avalia baixo esse risco. Inclusive porque as cisões na oposição oferecem múltiplos possíveis pontos de apoio do lado de lá.

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